texto: Por Circe Bonatelli
Fotos: Cecília Bastos e Francisco Emolo

reprodução, primeiro plano: 14bis; segundo plano: acidente do número um


 

 

 

 

 

 

 

 

Reprodução
“O erro permite a aprendizagem, o crescimento e a resistência.” Eugênio Mussak

 

 

 

créditos Francisco Emolo
“O jeito é agir rápido para consertar um erro antes de passar para a frente.” Cícero de Oliveira

 

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“Admitir o erro é o mais importante, pois você demonstra que teve um aprendizado e ainda ganha o reconhecimento moral por admiti-lo.” Osvaldo Frota.

 

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“Não buscamos fórmulas predefinidas de comportamento, mas sim estimulamos a atenção....” Edisson Ussami


O 14-bis de Santos Dumont só tem esse nome, porque, antes dele, o pai da aviação já havia construído outros 13 modelos, entre balões, dirigíveis e quase-aviões. Cem anos depois, apenas a 14ª máquina voadora e os Demoiselles (nome dado os bem-sucedidos modelos 19 e 20) são celebrados pela população. É claro! Quem iria erguer-lhe um monumento por ter apenas se chocado contra árvores durante as experiências com o número 1, ou por ter quase morrido em uma explosão com o número 5? Ele errou muito mais do que acertou, porém seu trunfo valeu por todas as tentativas frustradas.

Desde as primeiras experiências para conferir dirigibilidade aos balões da época, até o vôo com o 14-bis, em 1906, Santos Dumont evoluiu graças à observação e catalogação dos erros. Tanto os grandes gênios da humanidade quanto os cidadãos comuns esbarram em erros cotidianos. A grande sacada é estabelecer uma conexão entre erro e aprendizado, ou seja, aprender com os resultados negativos. Sem isso, corre-se o risco de repetir os enganos sem progredir.

É preciso esclarecer, no entanto, que os erros não são todos iguais, segundo explica Eugênio Mussak, especialista em gestão de recursos humanos e professor da FIA, fundação ligada à FEA (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade) da USP. Existem os incidentes que resultam de desatenção, incompetência e desinteresse, e aqueles que surgem por uma conseqüência natural de algo inovador, ainda em experimentação.

“Os erros por desatenção devem ser eliminados, são nocivos a qualquer empresa. Já a criatividade e inovação têm que ser valorizadas no ambiente coorporativo,” afirma Mussak.

A explicação para essa dica de incentivo é que o empreendedorismo requer curiosidade e transgressão. Curioso é o cara chato do trabalho, porque faz muitas perguntas. Porém, costuma ser um dos mais informados. E o transgressor é aquele que pensa em transformações e formas inéditas de realizar as mesmas tarefas. Nesse caminho, ambos costumam cometer erros, mas, entre os tropeços, acabam contribuindo com uma boa proposta.

No caso do funcionalismo público, não é sempre que as instituições escapam da frieza burocrática e valorizam um sujeito criativo o bastante para fazer o trabalho velho de um jeito novo. Nesse contexto, o funcionário criativo e o desinteressado acabam tendo a mesma projeção. Segundo o professor Mussak, as exceções ficam por conta de estatais como Banco do Brasil e Petrobras, que cresceram graças a uma postura coorporativa diferenciada e ocupam hoje um posto entre as marcas mais valiosas do País.

No Departamento de Esporte da EEFE (Escola de Educação Física e Esporte), o funcionário Cícero de Oliveira comenta que o incentivo para se aperfeiçoar vem do próprio indivíduo e de seus colegas de equipe. “Errar é muito frustrante. Às vezes, a coisa é tão mecânica que não percebemos onde está o erro. Assinamos, e o papel vai embora! O aperfeiçoamento vem com o trabalho em equipe e a liberdade para poder comentar com o colega onde ele errou.”

Emoções em jogo

O envolvimento emocional age como uma barreira. O erro pode vir acompanhado de críticas e possíveis conseqüências que mexem bastante com a própria vaidade, acanhando o sujeito. Na sala de aula, por exemplo, esse assunto é delicado: “O professor vê sua imagem fragilizada quando ele comete um engano”, conta Osvaldo Frota, professor do Departamento de Filosofia da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas). “O aluno enxerga o docente da USP como uma fonte de domínio completo do assunto, mas é difícil encontrar alguém que saiba exatamente tudo. Aí o professor omite um erro porque teme ver sua imagem arranhada.”

Mais delicada ainda é a situação de profissionais que não têm o direito de errar. “É algo que nos preocupa diariamente”, afirma Edisson Ussami, médico e membro da Comissão de Ética Médica do Hospital Universitário da USP. Casos de omissão, negligência e imperícia são motivos para a abertura de um processo na Justiça. “Para combater os erros nós não buscamos fórmulas predefinidas de comportamento, mas sim estimulamos a atenção e os cuidados do médico com o paciente e suas famílias. Muitas situações desconfortáveis resultam de mal-entendidos, porque o médico não avisou adequadamente sobre riscos ou seqüelas”, explica Ussami.

O cubo ensina

O matemático Piet Hein será lembrado por um invento: o cubo-mágico, aquele brinquedo em que o desafio é deixar cada parede de uma só cor. Existem mais de 240 formas de resolver o cubo, mas para todas, o jogador terá que memorizar as rotações erradas para não fazê-las novamente.

“Quem já tentou, sabe que dá vontade de desmontar o cubo e remontá-lo certo”, brinca o professor Eugênio Mussak. “Embora a fraude seja possível no jogo, não tem como desmontar o mundo e remontá-lo como pareça certo. A única alternativa é aprender a viver, o que pressupõe tentar, errar e tentar novamente. Quem quiser um atalho pode tentar aprender com o erro dos outros. De preferência, daqueles que acertaram no final.”

 

 
 
 
 
 
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