Dilemas Éticos na Doação e Órgãos


No Hospital das Clínicas de São Paulo, o enfermeiro Edvaldo Leal tem um mestrado sobre as principais razões para tantos “nãos”. Há dez anos, ele trabalha notificando as famílias sobre o estado de morte cerebral – condição do falecido para que possa ocorrer o transplante – e perguntando sobre a possibilidade da doação. Veja o que ele encontrou:


Principais Causas da Recusa Familiar
- dissertação de mestrado de Edvaldo Leal, resultado de casos analisados no Hospital das Clínicas de São Paulo

Religião: apesar de nenhuma doutrina posicionar-se contra a doação, muitas famílias citam convicções religiosas para a recusa.
Milagre
: a morte cerebral e o coração ainda em funcionamento alimentam esperanças de um milagre (Entenda o que é morte cerebral).
Diagnóstico
: a descrença e/ou desentendimento do diagnóstico de morte encefálica levam pessoas a preferirem o desfecho final, quando todos os órgãos falem.
Apego ao corpo
: família não aceita manipulação do corpo para retirada de órgãos.
Medo
: do que os parentes vão dizer após a doação.
Comunicação
: informações desencontradas no hospital deixam a família confusa e desconfiada.
Tráfico
: família crê na comercialização ilegal de órgãos.
Memória: em respeito ao falecido, a família acata sua decisão de ser um não-doador.

© Cecília Bastos
Enfermeiro do HC, Edvaldo Leal

 

 

 


“As famílias nunca apresentam só uma razão. Sempre mencionam pelo menos três desses itens”, explica Leal, que percebeu uma conjuntura formada por falta de informação, entraves culturais e éticos.

O enfermeiro é também vice-coordenador da OPO (Organização para Procura de Órgãos), do Hospital das Clínicas. A organização tem sede em vários hospitais de grande porte no Brasil e está vinculada ao Sistema Nacional de Transplantes. Sua função é encontrar os potenciais doadores.

O primeiro passo é localizar casos suspeitos de morte cerebral e avisar a família sobre o exame que irá checar esse diagnóstico. Se o indício for verdadeiro, já pode ser expedido o atestado de óbito. A família fica sabendo do falecimento e é questionada se tem a intenção de autorizar a doação. O Hospital das Clínicas tem a média de 25 a 30 procedimentos como este todos os meses. Em 36% dos casos os parentes não autorizam.

“Nossa função é informar que a doação é um processo transparente, dentro da lei, e que não há nenhuma chance de o paciente falecido por morte cerebral voltar. Isso tem que ficar claro”, explica o médico Leonardo Borges, coordenador da OPO/HC. “Nós respeitamos a decisão da família, ela doa se quiser. Não cogitamos tentar convencer ninguém. A doação é uma coisa altruísta.”

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