por Circe Bonatelli
Fotos por Cecília Bastos

arte sobre foto de Cecília Bastos


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No livro Gastos e Consumo das Famílias Brasileiras Contemporâneas (disponível para download gratuito em www.ipea.gov.br), pesquisadores analisam o retrato atual e as tendências econômicas no País. A oportunidade é ótima para administradores públicos e empresários definirem investimentos futuros

 

 

 


Pesquisadores miram os principais gastos da família brasileira

A cada década, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) realiza a POF, Pesquisa de Orçamento Familiar. Tem sido assim nos últimos trinta anos, com a intenção de tirar um raio-x dos dispêndios da família brasileira: quanto e em quê ela gasta? Como isso afeta a economia do País e das próprias famílias?

A fim de averiguar as tendências do consumo, pesquisadores da FEA/USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade) e do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) se reuniram na USP para lançar o livro de dois volumes que analisa profundamente os dados colhidos nas últimas POFs (2002-03, 1995-96, 1987-88).

Em paralelo aos números, a pesquisa estuda as variações mais importantes da sociedade e que possam refletir nas prioridades dos gastos. Ao todo, 60 mil famílias passaram por consultas, das quais 48,5 mil foram acompanhadas durante nove dias.

Verificou-se que, hoje, há menos moradores por casa, menores taxas de natalidade, maior expectativa de vida, as pessoas têm acumulado mais anos de estudo, mais mulheres têm assumido a posição de líder financeira da casa e uma proporção maior de crianças vêm sendo criadas por essas mulheres.

"Ao pesquisar milhares de famílias, você consegue um bom retrato. Claro, ele não é totalmente preciso, mas dá indicativos sólidos para se definir planejamentos do governo, fazer projeções de gastos e pensar em investimentos", considera o professor Heron do Carmo, economista da FEA.

Saúde quitada duas vezes

Este é o quarto lugar no ranking das maiores despesas domésticas, consumindo 9,1% do orçamento total, atrás somente dos gastos com habitação (28,6%), alimentação (23,7%) e transporte (13,8%).

Estima-se que, em 2006, os brasileiros tenham desembolsado mais de R$ 40 bilhões com a aquisição de planos de saúde, medicamentos, tratamentos dentários, óculos, próteses e semelhantes. Essa montanha de dinheiro quase alcança os R$ 44 bilhões pagos no mesmo ano pelos mesmos contribuintes para o Ministério da Saúde aplicar em bens e serviços públicos na área.

 

 

 

 

Foto crédito: Cecília Bastos
O estudioso das POFs, Heron do Carmo, observa que existe uma tendência de se aumentar os gastos com saúde pessoal (alimentação balanceada) e serviços para idosos (desde turismo até academias de ginástica)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


No ranking das principais despesas, depois de habitação, alimentação, transporte e saúde, aparecem vestuário (5º lugar), educação (6º), recreação (7º), higiene (8º), serviços pessoais como cabeleireiro ou tatuagens (9º) e fumo (10º)

 

Transporte coletivo no gargalo

Para a população que reside nas grandes cidades, se locomover rumo ao trabalho ou a outros centros é um desafio diário. E no caso das famílias mais pobres, a dificuldade se torna ainda maior pela escassez do transporte coletivo ou a impossibilidade de pagar o bilhete.

Para a população em geral, o martírio do trânsito não se restringe à clausura do asfalto poluído. A paciência e o bolso esvaziaram mais rápido com o aumento de 93% nos preços dos transportes coletivos entre os anos 2000 e 2005. Essa variação foi consideravelmente maior que a inflação geral medida pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) no período, de 62%.

Para não ficar na mão, cada vez mais as famílias de baixa renda têm investido em veículos próprios. Quase sempre são carros velhos, em que o dono não paga imposto, foge dos gastos com manutenção e ainda dá um jeito de abastecer com álcool. No final, pode sair até mais barato que penar em coletivos.

Atenção para o menu

A renda ainda é um forte condicionante do consumo alimentar para grande parte dos brasileiros. Porém se há trinta anos o debate no País estava centrado na questão da fome e da subnutrição, atualmente também discute-se muito a escolha alimentar.

O novo desafio da saúde pública é lidar com a super e a má nutrição, decorrentes do consumo de alimentos inadequados - excessivamente calóricos, bombados no açúcar, gordura e sal.

Em grande parte, a escolha do que comer está relacionada aos chamados "padrões modernos". Leia-se aqui falta de tempo para fazer uma refeição equilibrada e exploração do alimento pelas indústrias como se fosse uma mercadoria qualquer, com direito a publicidade indiscriminada.

O costume da alimentação desregulada fora de casa, por exemplo, é típico das famílias formadas recentemente e/ou das instaladas nas metrópoles. São lares com pessoas que vivem sozinhas, têm mulheres trabalhando fora e presença de adolescentes. Mas vale a pena ressaltar que o hábito de comer fora não é condenável se houver qualidade das refeições.

Os lugares mais caros

Habitação, eis aqui a campeã das despesas, responsável por abocanhar 28,6% do total arrecadado pelas famílias. E atenção! Aluguel caro é sinônimo de custo de vida alto. Portanto, veja lá onde vai fincar bandeira.

Essa conclusão veio da Pesquisa de Orçamento Familiar. O raciocínio é o seguinte: como outros bens, o preço do aluguel nasce das relações entre oferta e procura. Porém, o ramo da habitação tem uma baixa capacidade de aumentar a oferta - afinal de contas, não se conseguem casas, condomínios ou terrenos num piscar de olhos. Desse modo, se houver mais procura por moradia, eleva-se o preço dos aluguéis.

Aluguéis mais altos provocarão custos mais altos para as atividades terciárias (comércio e prestação de serviços) e industriais, que requerem e competem por espaço. Esse processo desemboca em um aumento nos preços dos produtos finais. Em última análise, uma cidade com aluguéis caros certamente terá mensalidades escolares, serviço mecânico e supermercado mais caros também.

Das capitais avaliadas na pesquisa, Brasília é o lugar mais caro para se morar, enquanto Rio de Janeiro e São Paulo ficam em terceiro e segundo na lista.

 
 
 
 
 
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