por Daniel Fassa
fotos por Cecília Bastos

Terceira idade a todo vapor

Foto crédito: Cecília Bastos

 



Muito mais que um objeto de contemplação, a arte pode servir como instrumento de conhecimento, educação e terapia

Sei que a arte é irmã da ciência / Ambas filhas de um Deus fugaz / Que faz num momento / E no mesmo momento desfaz / Esse vago Deus por trás do mundo / Por detrás do detrás / Cântico dos cânticos / Quântico dos quânticos.  

Esses são versos de Gilberto Gil, presentes na música Quanta. Para além de seu valor artístico inestimável, a obra traz reflexões sobre a importância dessa que é uma das principais manifestações humanas. Emoção, conhecimento, culturas inteiras se conhecem e se dão a conhecer através da arte. Tamanha riqueza não pode se restringir apenas aos círculos artísticos ou passar despercebida no agitado cotidiano. Essa é a opinião de profissionais que fazem da arte um recurso educacional e terapêutico.  

Segundo Leny Mrech, livre-docente da Faculdade de Educação, o contato com a arte é fundamental para a formação de crianças e adolescentes. “Hoje, os bons professores utilizam, além da linguagem escrita, as linguagens oral, visual, musical, a linguagem artística de uma forma geral. Um professor considerado de ponta é aquele que sabe manejar com a música, com a arte, que lida com o desenho, com a literatura, com a gravura. Eu acho que não dá mais para acreditarmos num mundo que é só da escrita”, explica.  


Foto crédito: Cecília Bastos
Para Leny Mrech, livre-docente da Faculdade de Educação, o contato com a arte é fundamental para a formação de crianças e adolescentes.


No entanto, diferentemente do que acontece no Japão ou nos Estados Unidos, o contato com a arte nas escolas brasileiras ainda é bastante reduzido, como constata a docente. Para ela esse quadro tem que mudar, de forma que, a partir da educação, as pessoas sejam sensibilizadas e se aproximem dos abundantes recursos artísticos disponíveis na atualidade. "Antes, tínhamos uma cultura reservada a poucos. Hoje temos acesso ao que quisermos pela internet, a um quadro que está no Louvre, a uma música do século 13. A arte está muito dentro da nossa vida, ela nos acompanha em cada momento", conclui.  

Em São Paulo, alguns passos nesse sentido já começaram a ser dados. Durante todo o ano de 2007, um quarteto de MPB chamado A Quatro Vozes promoveu formação musical em escolas públicas e nos Centros de Educação Unificados (CEUs), com o apoio das Secretarias Municipal e Estadual de Educação. Formado por Doralice, Jurema, Jussara e Tathiana Otaviano, o grupo realizou shows-oficinas em que fez muito mais que cantar para a criançada: explicou as origens de diversos estilos musicais, ensinou ritmos, disponibilizou instrumentos, contou histórias. Nos CEUs, as atividades eram mais voltadas aos professores.  


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Formado por profissionais da área de saúde, psicologia e educação, o quarteto de MPB A Quatro Vozes desenvolveu um trabalho de formação musical na escolas públicas de São Paulo em 2007.

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No Museu da Arte Contemporânea da USP, a educadora Andréa Amaral comanda o programa Interar-te, que, uma vez por mês, leva crianças e seus familiares a um contato mais íntimo com as mostras em cartaz.


Formada em arte-educação, a cantora Jurema Otaviano conta que, nesse trabalho, viveu algumas experiências emocionantes. Certa vez, ela e as companheiras cantaram “A flor da África” – música que conta a história da vinda do povo negro ao Brasil – para um grupo de pequenos estudantes. Antes de soltarem a voz, elas fizeram uma dinâmica e falaram sobre a exploração desumana à qual aquele enorme continente havia sido submetido. “Eu disse que era importante que nunca mais deixássemos acontecer o que aconteceu com a África. Por isso seria importante que eles estudassem, o conhecimento seria sua arma”, conta Jurema. “Quando terminamos, veio uma menina de 8 anos e disse ‘você tem razão, existe muita coisa errada no mundo. Se a gente fizer a nossa parte como estudante, podemos contribuir no futuro'.”  

O Museu de Arte Contemporânea da USP também tem sido um espaço privilegiado da arte-educação. Um exemplo disso é o programa Interar-te, que, uma vez por mês, leva crianças e seus familiares a um contato mais íntimo com as mostras em cartaz na ocasião. A partir da observação das obras em exposição, estabelecem-se diálogos com os visitantes e realizam-se jogos e dinâmicas. Quando possível, o próprio artista ministra oficinas. “As conversas sobre as obras têm sido frutíferas e gratificantes em relação à formação de público fruidor de arte contemporânea”, relata Andréa Amaral, educadora do MAC. 


 

 


Especializada em educação e arte pela ECA/USP, Andréa acredita que a arte seja mais que um recurso de apoio ao ensino em sala de aula. “É uma área de produção cultural humana que acompanha os seres humanos desde os primórdios da humanidade. Ela é essencial à qualidade de vida de todos os povos, em todos os tempos”, afirma.  

A arte também pode ser um útil recurso terapêutico. Nisso apostam os profissionais que a levam para seus consultórios. Saiba mais na matéria "Arte que encurta caminhos".

 
 
 
 
 
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