URBANISMO
Toledo lembra que o mais importante é a qualidade e a riqueza de detalhes das imagens. "Na época em que os postais surgiram, a sua qualidade gráfica era muito melhor do que a dos periódicos. E São Paulo teve a felicidade de poder contar com excelentes fotógrafos. Daí a sua grande utilidade para a história da arquitetura e do urbanismo, que é justamente o foco da exposição." Outra surpresa para o público é o ambiente da própria mostra. Está sendo realizada em um dos raros edifícios artnouveau que restaram na cidade. Foi projetado pelo sueco Carlos Ekman e, neste ano, estará completando um século. Junto com a história da arquitetura, este prédio, na rua Maranhão 88, Higienópolis, guarda também a história da própria FAU. Sedia o curso de graduação e vem passando por um processo cuidadoso de restauração. "Todos vão poder apreciar a beleza deste saguão", convida Toledo. "Nós vamos expor o mobiliário da casa. É importante notar também os dois quadros de Oscar Pereira da Silva que estão junto das escadas, lembrando a indústria nacional do século 15 ao 18."
Nesta busca, Toledo tem conseguido imagens preciosas como o mais antigo registro da avenida Paulista. O cartão editado por Gaensly e Lindemann traz a avenida em 1901, dez anos depois de sua inauguração. "Nós podemos ver a residência de Von Büllow, construída em 1895 pelo arquiteto alemão Augusto Fried, talvez uma das primeiras a serem edificadas na Paulista." Interessante também é a dedicatória ao lado ou atrás dos postais. "Através das anotações é possível acompanhar o olhar do turista sobre a nossa cidade. Lembro o registro de um inglês falando sobre a sua viagem de trem de Santos a São Paulo e a sua perplexidade diante da paisagem", conta o historiador. Toledo vai acompanhando a montagem da exposição. Ajeita os quadros com os postais sobre a mesa artnouveau (com mais de cinco metros de comprimento) como se os visse pela primeira vez. A mesma coleção ocupou uma das salas em destaque na 3ª Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo. Só que na FAU-Maranhão, ela ganha uma nova luz. Todo o clima do saguão ajuda a transportar o visitante para o passado. Introduz o seu olhar na história e desperta a sua emoção e orgulho diante da evolução da cidade. Um
documento com o prazer da lembrança
Ao contrário da foto jornalística, o cartão-postal procura eliminar o acidental, o episódico. "É um documento que pressupõe identificação pronta, mensagem visual completada por algumas linhas de mensagem escrita, freqüentemente carregadas de calor. Por algumas dessas características, estes cartões demoraram a ser entendidos como documentação autêntica. Atualmente, o cartão-postal tende a se aproximar da fotografia arqueológica." O professor lembra que a mais antiga emissão de cartões brasileiros já mostrava um conjunto de cenas paulistanas. "Segundo a pesquisa de Paulo Berger, eles foram lançados em 24 de novembro de 1898 e são da gráfica V. Steidel, de São Paulo." Nesta época, começaram a circular cartões com as fotos de Guilherme Gaensly. "Não se sabe ao certo a data de seu estabelecimento em São Paulo. Ele trabalhou inicialmente na Bahia com seu sócio Lindemann, onde, a partir de 1870, realizou variadas fotos de exteriores. Os mais antigos cartões-postais que fez constituem a coleção Lembrança de São Paulo, que circulou em 1898. Depois dessa série produziu outra com cem imagens que integram o mais completo acervo documental da cidade nessa época." Embora os cartões-postais sejam um registro do melhor ângulo da paisagem, eles conseguem captar o momento real da cidade. Momentos que se perdem com a urbanização. "Onde está a Praça da República e o Jardim da Luz que vemos nos postais?", pergunta o professor. "O imediatismo e a imprevidência que freqüentemente caracterizam a ação das autoridades municipais têm custado caro à qualidade ambiental, resultando em cidades cada vez maiores e menos habitáveis. Por essa razão, os estudos históricos tornam-se necessários não apenas como registro e denúncia, mas, sobretudo, como forma de apurar a sensibilidade dos futuros planejadores. Assim, as imagens dos postais têm o seu poder. Documentam jardins, prédios e monumentos que muitos não sabem que existiram." Entre outras cidades Outra exposição igualmente imperdível é "São Paulo e outras cidades", organizada pelo professor e historiador Nestor Goulart Reis. Baseada no livro com o mesmo título e autoria, reúne imagens e comentários sobre as mudanças ocorridas na segunda metade do século 19 e primeira metade do século 20 em São Paulo e algumas outras cidades do Estado. A mostra está sendo apresentada na FAU da Cidade Universitária, no prédio do curso de graduação projetado por Vilanova Artigas. Registra quatro fisionomias distintas: a da velha cidade de taipa, do tempo e do trabalho escravo (até 1888); da cidade européia (1889-1930); da cidade modernista (1930-1960) e a metrópole concentrada e congestionada (1960-1990). "Os jovens de hoje não conseguem saber o que se perdeu", observa Goulart." Mas quando vêem fotos de 1930, 40, 50 e 60, surpreendem-se pela dignidade de algumas obras públicas e privadas do passado e de outras mais recentes, que só conhecem em seu aspecto já transformado pelo uso intensivo e inadequado. Após esse período, assistimos ao início da degradação da cidade, do desprezo pela memória e desconhecimento dos valores urbanos. A exposição visa a destacar a importância da preservação da dignidade urbanística." |