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Dotada de avançada tecnologia para extrair petróleo
em águas rasas, a Petrobras planeja agora explorar jazidas a profundidades superiores a 3 mil metros. Para isso criou o programa Procap 3000. O Tanque de Provas Numérico,
coordenado pelo professor Kazuo Nishimoto (acima, ao lado do poderoso conjunto de computadores do tanque), será um
instrumento essencial para a empresa alcançar esse objetivo.
Acima, num telão instalado no TPN pesquisadores vêem imagens em três dimensões do projeto de uma plataforma.



 


 


 

A inauguração do TPN: resultados já

 

Na Bacia de Campos estão as jazidas de petróleo localizadas a profundidades superiores a
2 mil e 3 mil metros, que a Petrobras vai explorar nos próximos anos



I
nstalar uma plataforma de petróleo no meio do mar não é tarefa das mais simples. Castigadas constantemente pelas ondas e pelas correntes marítimas — que no fundo do oceano se movimentam em diferentes direções —, as dezenas de linhas de ancoragem, que fixam o equipamento ao solo, e de dutos, responsáveis pelo transporte do petróleo e do gás até a superfície, operam em condições de extrema adversidade. Para vencer grandes lâminas de água — que chegam a mais de mil metros de profundidade — e extrair o precioso produto do interior da crosta terrestre, o projeto dessa plataforma precisa, antes, ser submetido a testes rigorosos e precisos.
Exatamente com esse objetivo — testar com o máximo rigor projetos de plataformas de petróleo flutuantes —, a Escola Politécnica da USP inaugurou na quarta-feira passada, dia 27 de fevereiro, o Tanque de Provas Numérico (TPN). Instalado no Departamento de Engenharia Naval da Poli, o TPN permite a análise de projetos de extração de óleo em águas ultraprofundas — acima de 2 mil metros —, um procedimento inédito em todo o mundo. É nessas profundezas que a Petrobras pretende explorar novas jazidas nos próximos anos, a fim de aumentar a produção brasileira de petróleo, segundo o plano de metas da empresa (leia texto ao lado).
O TPN é resultado de parcerias entre pesquisadores de cinco instituições científicas — a USP, o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) de São Paulo, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a PUC do Rio de Janeiro e o Centro de Pesquisas da Petrobras, também do Rio. O custo do projeto é de R$ 3 milhões — dos quais R$ 2,5 milhões vêm da Finep e outros R$ 500 mil são fornecidos pela Petrobras. “Uma das doze maiores empresas petrolíferas do mundo, a Petrobras só atingiu esse estágio de desenvolvimento por causa do seu contato com a sociedade e com as universidades”, disse o diretor de Serviços da Petrobras, Irani Carlos Varela, na cerimônia de inauguração do TPN (leia matéria à esquerda). “Esse contato precisa ser mantido sempre.”

Imagens tridimensionais

Tão ou mais complexas do que instalar uma plataforma no mar, as análises feitas pelo TPN só são possíveis graças a um poderoso conjunto de computadores — ou “cluster”, como é chamado pelos especialistas. No total, encontram-se instaladas 60 máquinas Pentium III, cada uma com 256 megabits de memória e 20 gigabits de disco rígido. Até o final deste ano, serão adquiridos outros 60 computadores de mesma potência. Juntos, esses equipamentos são capazes de processar bilhões de informações e fornecer os dados necessários para avaliar a qualidade de um projeto.
Mas não é só. Os resultados dessas análises não ficam restritos aos números exibidos na tela do computador, que traduzem a pressão exercida sobre um duto, por exemplo. Mais do que isso, eles são transformados em imagens coloridas, em três dimensões (3D-stereo), que podem ser vistas num telão instalado numa sala do TPN. Munidos de óculos próprios para visualizar imagens desse tipo, os pesquisadores têm diante de si, em pleno funcionamento, a plataforma de petróleo existente somente em projeto. “Dessa forma, podemos verificar seu comportamento e, se necessário, fazer ajustes ao que foi projetado”, explica o professor Kazuo Nishimoto, docente da Escola Politécnica da USP e coordenador-geral do TPN. “Com essa visualização, temos a plataforma na mão.”
Com o TPN, os pesquisadores ampliam de forma sem precedentes o seu poder de análise de sistemas de exploração de petróleo. Agora, aos dados fornecidos pelos computadores eles podem somar as informações obtidas através de testes feitos em tanques de provas físicos — outra forma usada para validar projetos de plataformas. Os tanques de provas físicos são formados por imensas piscinas com capacidade de gerar ondas, ventos e correntezas. Nelas são colocados modelos reduzidos de plataformas, a fim de verificar como se comportam em tais condições. “Há fenômenos que não podem ser devidamente representados no tanque numérico, enquanto outros escapam ao tanque físico”, diz Nishimoto. “Um tipo de tanque complementa o outro, e isso nos permite simular a condição mais fiel possível daquele sistema.” Ainda neste ano, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) deverá inaugurar o maior tanque de provas físico do mundo, com 15 metros de profundidade, 5 metros a mais do que a profundidade do tanque de provas físico em funcionamento no IPT.

O sistema ideal

Nishimoto e sua equipe acalentam planos ainda mais ousados. Eles pretendem refinar a capacidade de análise do TPN, dotando-o de instrumentos ainda mais sofisticados. O professor planeja, por exemplo, criar um sistema que permita ao pesquisador clicar o mouse num determinado ponto da plataforma exibida no telão e, imediatamente, receber todas as informações sobre esse ponto. Dessa forma, se ele quiser saber o nível de pressão exercida sobre uma linha de ancoragem exatamente a 884 metros de profundidade, bastará buscar com o cursor esse trecho e clicar ali. Em segundos, o pesquisador terá os dados solicitados.
Outro refinamento do TPN — que Nishimoto e equipe se esforçam para conseguir — se refere à busca pela plataforma ideal. No futuro, será possível, ao invés de apenas testar e validar um projeto, elaborar esse projeto a partir das condições do ambiente em que será instalada a plataforma. Tome-se como exemplo uma empresa que queira montar uma plataforma no Mar Vermelho. Lançados aos computadores do TPN todos os dados sobre o local da instalação — como velocidade do vento, direção das correntezas e força das ondas —, os pesquisadores saberão o tipo de dutos e de linhas de contenção mais adequado para aquele ambiente, a resistência necessária desses equipamentos e outras informações úteis. Com isso, terão dados suficientes para a elaboração do projeto de uma plataforma ideal, que, construída na medida certa, eliminará riscos e evitará desperdícios. “Hoje ainda não temos condições de fazer isso”, diz Nishimoto. “Mas estamos trabalhando e pesquisando com esse objetivo.”
Para o professor, o TPN será um instrumento essencial para o Brasil aumentar sua produção de petróleo, já que a Petrobras vem localizando jazidas a profundidades oceânicas cada vez maiores. Ainda que a extração de petróleo do fundo do mar seja um processo caríssimo — cada metro de um duto custa de US$3 mil a US$5 mil, por exemplo —, a autosuficiência nesse produto é vital para um país que queira se afirmar no mundo contemporâneo, lembra Nishimoto. “Instalar plataformas na Amazônia, digamos, é muito mais complicado, porque todo o material tem que ser levado para o local de helicóptero”, acrescenta, lembrando que a ciência e a tecnologia podem ajudar a diminuir custos e a vencer obstáculos naturais. “Esse é o nosso trabalho.”


Cientistas festejam "ótimo saldo acadêmico"

Um festejado centro de ciência e tecnologia, o Tanque de Provas Numérico (TPN) revela-se também uma avançada fonte de ensino e pesquisa. Antes mesmo de inaugurado, ele já permitiu ótimos índices acadêmicos. Até agora, trabalhos e pesquisas realizados no TPN geraram duas patentes, quatro teses de doutorado, seis dissertações de mestrado, três projetos de iniciação científica — feitos por alunos de graduação —, 15 artigos publicados em periódicos, outros 30 textos apresentados em congressos e, finalmente, sete artigos para publicação em 2002.
Esses dados foram citados pelo coordenador geral do TPN, professor Kazuo Nishimoto, durante a solenidade de inauguração do tanque, realizada no dia 27 de fevereiro, às 11 horas, no anfiteatro do Departamento de Engenharia Naval da Escola Politécnica da USP. “É um saldo acadêmico muito positivo”, disse Kazuo, diante de uma platéia de cerca de 200 pessoas. A cerimônia teve a presença do diretor de Serviços da Petrobras, Irani Carlos Varela, do gerente executivo do Centro de Pesquisas da Petrobras, Elias Menezes de Oliveira, e do vice-almirante Lauro Reis Salgado, diretor do Arsenal da Marinha do Brasil, no Rio de Janeiro.
Irani Varela destacou que a Petrobras precisa estar ao lado das universidades, a fim de manter o padrão de excelência que conquistou nas últimas décadas. A Petrobras é hoje uma das 12 maiores empresas de petróleo do mundo, lembrou, graças às parcerias que fez com a sociedade. Mesmo após a quebra do monopólio da exploração do petróleo — continuou Varela —, ela manteve a competitividade e a competência, embora “muitas pessoas” não acreditassem nisso.
“A inauguração do TPN é um marco fundamental da engenharia off-shore nacional”, festejou Elias Oliveira, usando o termo técnico para “mar aberto” ou “fora do litoral”. Ele citou o desafio que a Petrobras se impôs de extrair petróleo a 3 mil metros de profundidade — a fim de ampliar a produção nacional — e também destacou a necessidade de integração entre a Petrobras e os centros de pesquisa brasileiros. “A pesquisa interdisciplinar é um fator preponderante para alavancar o desenvolvimento científico e tecnológico do País.”
Já o vice-almirante Lauro Salgado enfatizou que a Marinha do Brasil deseja realizar programas de alta tecnologia que integrem indústrias e universidades, sempre tendo em vista resultados concretos. “O TPN é uma iniciativa que trará grandes resultados para o Brasil”, disse. “Entre eles a credibilidade que o país assegura no exterior.”
Também estavam presentes na cerimônia de inauguração do TPN o pró-reitor de Pesquisa da USP, Luiz Nunes de Oliveira — representando o reitor Adolpho José Melfi —, e o diretor da Escola Politécnica, Antonio Marcos de Aguirra Massola, além de representantes do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) de São Paulo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da PUC do Rio. O ministro da Ciência e da Tecnologia, Ronaldo Sardenberg, foi representado pelo presidente da Finep — a principal financiadora do TPN —, Mauro Marcondes Rodrigues.

Mais petróleo com a ajuda do TPN

Dos cerca de 1.500.000 barris de petróleo produzidos por dia pela Petrobras atualmente, 17% são extraídos da terra firme, 19% vêm de águas rasas e 64% saem de poços localizados em águas profundas (acima de mil metros) e ultraprofundas (acima de 2 mil metros). Até 2005, a Petrobras pretende atingir a produção de 1.850.000 barris de petróleo por dia. Desse total, 75% virão de poços localizados nas grandes profundezas do mar, onde se encontra também a maior parte das jazidas que a empresa tem a expectativa de localizar nos próximos anos. Para enfrentar esse desafio, a Petrobras lançou no ano 2000 o Programa de Capacitação em Águas Profundas (Procap 3000), com orçamento inicial de US$ 130 milhões. Parte desses recursos foi aplicada no Tanque de Provas Numérico (TPN), inaugurado na semana passada, na USP, que será um instrumento essencial para a exploração das jazidas em águas ultraprofundas. Além da Petrobras, outras empresas de petróleo, do Brasil e do exterior, também deverão utilizar os serviços do TPN, segundo estimativas do professor Kazuo Nishimoto, coordenador-geral do TPN e docente da Escola Politécnica.
Os novos poços encontrados pela Petrobras se localizam principalmente na Bacia de Campos, uma área de 115 mil quilômetros quadrados localizada no litoral do Rio de Janeiro. Principal província petrolífera do Brasil, a Bacia de Campos produz atualmente 1.247.000 barris de petróleo por dia — mais de 80% da produção nacional — e é responsável ainda por 47% de todo o gás produzido no País, segundo informa a página eletrônica da Petrobras (www.petrobras.com.br). Ali, onde a profundidade chega a 3.400 metros, a Petrobras mantém 27 plataformas flutuantes e 14 plataformas fixas. As redes de oleodutos e de gasodutos chegam a 4.400 quilômetros.

O campo de Marlim Sul

Um dos maiores campos de exploração da Bacia de Campos é conhecido como Marlim Sul, localizado a 175 quilômetros da costa de Macaé. Descoberto em 1987, tem reservatórios de petróleo situados a profundidades que variam de 850 a 2.400 metros. Atualmente, Marlim Sul produz 150 mil barris de petróleo por dia. A estimativa é que essa produção passe para 360 mil barris por dia em 2007. Em dezembro de 2000, a Petrobras calculou as reservas da região em 806 milhões de barris de óleo — o que representa 9% do total do Brasil — e 11,7 bilhões de metros cúbicos de gás.
A Bacia de Campos inclui ainda outros campos de produção em águas profundas e ultraprofundas. Entre eles estão os campos de Albacora, Marlim, Marlim Leste, Barracuda, Caratinga, Espadarte e Roncador. A bacia começou a ser explorada em 1968. A primeira descoberta comercial, o campo de Garoupa, se deu em 1974. Mas a atividade produtiva de fato teve início em agosto de 1977, com a exploração do campo de Enchova, em águas com profundidade de 120 metros. Desde 1999, a Petrobras tem feito importantes descobertas também nas bacias de Santos, no litoral paulista, e do Espírito Santo.

 




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