Tudo
começou em 1990, com um projeto acadêmico desenvolvido
pelo NEA (Núcleo de Educação de Jovens e Adultos
e Formação Permanente de Professores) da Faculdade de
Educação da USP. O que era um programa de estágio
e extensão de alunos daquela faculdade ganhou corpo, recebeu
certificação da Secretaria e do Conselho Estadual de
Educação e se transformou em curso regular de ensino
fundamental para jovens e adultos. Centenas de funcionários
foram alfabetizados ou concluíram os estudos básicos
por meio daquele projeto. Mas o conhecimento é um caminho sem
volta, e os alunos queriam mais. Começou, então, a se
formatar um Curso a Distância de Ensino Médio que acabou
sendo homologado e credenciado em 1999, com apoio recebido pelo Departamento
de Recursos Humanos (DRH) da Reitoria.
Os 207 formandos da primeira turma que receberam seus diplomas
no dia 30 passado, em cerimônia realizada na Facudade de Arquitetura
e Urbanismo (FAU) são apenas os primeiros frutos da
persistência de professores e alunos; outros 592 funcionários
da comunidade uspiana estão a caminho do certificado de conclusão
do ensino médio. Além disso, o curso de ensino fundamental
do NEA continua a todo vapor e está alfabetizando atualmente
outros 242 funcionários.
Os resultados concretos do projeto de educação de adultos
da Faculdade de Educação podem ser percebidos não
só no desenvolvimento pessoal e profissional dos seus alunos.
A oportunidade de continuar os estudos do ensino médio vem
proporcionando também a possibilidade de sonhar com a tão
almejada vaga no ensino superior.
Para Aloísio Bernardo da Silva, desenhista projetista do Fundusp
(Fundo de Construção da USP), o sonho já virou
realidade desde que ingressou no curso de geografia da Unifiel. Aloísio
garante que não teria retomado os estudos, não fosse
a chance oferecida pelo programa do NEA. Isso porque a disponibilidade
de tempo para freqüentar aulas regulares seria um grande empecilho,
além da difícil mobilidade de um lugar a outro. O
curso teve um valor muito grande para mim. Senti uma melhora de 100%
no meu nível cultural, sem contar que meu convívio em
geral com as pessoas também melhorou, diz.
A facilidade de sair do trabalho e freqüentar aulas no próprio
campus também foram fatores determinantes para Marco Antônio
da Silva se inscrever no curso de ensino médio da Universidade.
Ex-aluno de uma instituição regular de ensino, ele conta
que conciliar um dia de trabalho e uma jornada de estudos à
noite era bastante pesado, pois chegava em casa sempre depois
da meia-noite. Marco Antônio, que também recebeu
o canudo na semana passada, atualmente estuda Engenharia na Fesp (Faculdade
de Engenharia de São Paulo).
Segundo a diretora do Curso de Ensino Médio, Maria Cristina
de Oliveira Costa, os pedidos dos próprios alunos foram o principal
motivo para se pensar na criação do programa de educação
média. A partir da demanda, o DRH vislumbrou a possibilidade
de formar funcionários que não tinham acesso ao ensino.
Maria Cristina conta que 37 professores estagiários da Faculdade
de Educação participam do programa de formação
de adultos, sendo 19 deles integrantes do Curso de Ensino Médio.
Na entrega do diploma, na FAU, o Coral da USP abriu a cerimônia
com a apresentação do Hino Nacional brasileiro. Entre
os presentes estavam o reitor da USP, professor Adolpho José
Melfi, além de diretores das unidades envolvidas. A ausência
sentida foi a da coordenadora pedagógica do NEA, professora
Stela Piconez, que não compareceu por motivo de saúde.
Mas a homenagem que lhe foi prestada e os demorados aplausos dos formandos
fizeram lembrar a todos os presentes o importante papel da professora
na criação e implantação do programa educacional
de adultos que hoje serve de referência até para outras
universidades.
Educação
consciente
Assentado
no projeto educacional desenvolvido pelo educador Paulo Freire,
o programa elaborado pelo NEA vincula as experiências pessoais
dos alunos ao processo de aprendizagem e leitura do
mundo. O ´eu`, a vivência de cada um é
o nosso ponto de partida. O indivíduo se reconhece no processo
e passa a ter o que chamamos de aprendizagem significativa, ou seja,
começa a existir uma articulação entre a vida
da pessoa e o espaço ao redor, afirma a diretora da
Faculdade de Educação, professora Selma Garrido Pimenta.
Dessa forma, o indivíduo perceberá que precisa
do domínio do conhecimento elaborado para se situar diante
do mundo e diante de si. Nessa metodologia educacional, a forma
de ensinar comunicação é fundamental, pois
a linguagem assume uma dimensão muito importante, na qual
se trabalha o significado das coisas. Não é suficiente
ensinar a grafia e leitura das palavras: é preciso uma leitura
compreensiva do mundo e seu contexto.
Antes de chegar ao atual formato, os cursos de alfabetização
do NEA pretendiam simplesmente desenvolver uma metodologia voltada
para a formação de professores do ensino público,
dentro do programa de licenciatura da Faculdade de Educação.
A idéia era constituir um grupo de professores estagiários
e capacitá-los ao ensino através do trabalho de extensão
que hoje se transformou nos Cursos de Ensino Fundamental e de Ensino
Médio do NEA, coordenados pela professora Stela.
Para a professora Selma, o ensino voltado para a educação
de adultos tem enorme potencial de crescimento no Brasil. Apesar
de a educação ser um direito garantido na Constituição,
até 30 anos atrás a quantidade de escolas públicas
ofertadas era inferior à demanda. Somem-se a isso os problemas
sociais de um país no qual a criança tem de sair da
escola para trabalhar, avalia Selma. A conseqüência
desse quadro precário é que a quantidade de pessoas
que chegam à idade adulta sem alfabetização
é muito grande e já faz parte da própria história
do País. Por isso, as escolas que priorizam educação
para adultos é um segmento que ainda deve crescer muito no
Brasil.
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