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cena do filme
Eryk Rocha
Glauber em Cuba

“Sua obra é um enorme poema”, “abriu caminhos, era uma tormenta, um ciclone”, “pegava uma caixinha de fósforos e começava a cantar”, “tudo o que ele pensou e fez foi em termos de imagens poéticas, o tempo todo”, “um cineasta extremamente admirado aqui”. São falas de pessoas que foram entrevistadas, gente de cinema ou gente comum nas ruas de Havana, que se lembram de Glauber Rocha e estão no filme de Eryk Rocha. O longa Rocha que Voa traz trechos de duas entrevistas de Glauber, uma com o jornalista Jaime Sarusky e Alfredo Guevara, então presidente do Instituto Cubano Del Arte e Industria Cinematográficos, e outra com o cineasta cubano Daniel Diaz Torres. Nelas, Glauber defende uma coletivização da produção de imagens, analisa o papel do intelectual nos países latino-americanos, propõe que se faça do pensamento e da ação política algo integrado e afirma que o cinema seria o primeiro movimento artístico de unificação cultural e política dos países latino-americanos.


Mas Rocha que voa não é um filme sobre Glauber, e sim através de Glauber, como diz o diretor. Quis chegar, por meio dele, à efervescência político-cultural de uma época, permear todo o filme com sua voz, suas idéias provocantes, tomar Glauber como ponto de partida para entender toda uma geração e um momento histórico: o sonho de que o cinema era a arte capaz de unir a América Latina. “O filme pode ser considerado uma pequena parte desse sonho”, diz Eryk, que trata o longa como se fosse um labirinto poético, como uma memória em transe. O fato de ser filho de Glauber, tinha apenas três anos quando o pai morreu, provocou um enorme interesse de penetrar no seu pensamento e na sua obra e permitiu ao mesmo tempo um distanciamento crítico e uma apropriação.


O filme é uma colagem, um discurso fragmentado. “São camadas de memórias afetivas, coletivas e individuais”, informa o diretor. A maior parte das imagens foi filmada em preto-e-branco – reforçando a atmosfera de Havana como lugar parado no tempo – e quase não há registros de Glauber em movimento, aparecendo somente em fotos fixas. Foram oito meses de montagem, para tratar as imagens em computador, alterando cores e texturas das filmagens, às vezes feitas em 16 mm, às vezes em vídeo e até em super 8, e também dos fragmentos dos filmes Deus e o diabo na terra do sol, Câncer, O leão de sete cabeças, ou de Viramundo, de Tire die, entre vários outros, que foram usados como citações de cineastas como Birri, Sarno e o próprio Glauber.


Mas não é uma espécie de antologia do cinema da América Latina nos anos 60 e 70, e sim uma citação apropriada por Eryk Rocha. É uma releitura daquela época, em linguagem contemporânea, que, assim como todo desafio de um documentarista, tenta reunir importantes e variadas fontes dessa memória para revitalizá-la e criar uma ponte que gere reflexão sobre o tempo presente, para daí formar uma projeção do futuro. Assim, o filme surge cheio de indagações sobre os possíveis caminhos, as possíveis utopias de hoje.


Rocha que voa tem pré-estréia nesta quinta, às 19h, com entrada franca, no Cinusp (r. do Anfiteatro, 181, favo 4 das Colméias, Cidade Universitária, tel. 3091-3540). Logo depois da sessão haverá debate com o diretor Eryk Rocha e os críticos de cinema Ismail Xavier, professor da ECA/USP, e José Carlos Avellar. A estréia acontece na próxima sexta, dia 20 de setembro, em circuito comercial.

 




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