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Os mais sofisticados aparelhos que utilizam o laser na odontologia estão no novo laboratório da USP. “O laser tem que ser um parceiro nos procedimentos odontológicos”, afirma o professor Carlos de Paula

Imagine-se entrando num consultório dentário e, ao invés de encontrar os equipamentos tradicionais, ver dentistas e pacientes com óculos de proteção contra radiação luminosa. E mais: no lugar do barulho rotineiro das brocas, o zunido dos aparelhos e o brilho do laser. Será desse jeito que, provavelmente, se sentirão os usuários do novo Laboratório Especial de Laser em Odontologia (Lelo), da Faculdade de Odontologia (FO) da USP, que será inaugurado nesta sexta-feira, 27 de setembro. “O novo laboratório será um referencial não só no Brasil como em toda a América Latina. Na realidade, seremos uma referência mundial para todos aqueles que trabalham com laser em odontologia”, comenta o coordenador do Lelo e professor da FO, Carlos Eduardo de Paula. “Nossa idéia é sempre trabalhar com o binômio pesquisa-clínica, para proporcionar uma melhor utilização dos aparelhos e menos riscos para os pacientes. O objetivo não é a substituição dos métodos tradicionais pelo laser. O laser precisa ser visto e utilizado como parceiro nos procedimentos odontológicos.”

As pesquisas com laser em odontologia na USP tiveram como marco inicial o programa de intercâmbio com o professor Toshio Morioka, da Universidade de Kyushu, em Fukuoka, no Japão, em 1990, através do programa BID-USP. Em 1992, deu-se a parceria com o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), que caracteriza o grande diferencial em relação aos outros centros do mundo, pois imprime um caráter multidisciplinar às pesquisas. Desde essa época, Ipen e FO vêm desenvolvendo trabalhos, entre teses e artigos, de padrão internacional.

A inauguração do novo laboratório atesta a posição de vanguarda da USP e o comprometimento com o ensino, a pesquisa e a extensão, segundo o professor. Com a disponibilização da nova infra-estrutura, a Universidade confirma seu papel de instituição que investe na conscientização sobre o uso e o estudo das novas tecnologias, acrescenta.
As obras do Lelo começaram em abril de 2001 e tiveram um custo aproximado de R$ 350 mil. De acordo com Carlos de Paula, o novo laboratório contou com financiamentos da Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico da Odontologia (Fundecto), do grupo Banespa-Santander, e de uma verba oriunda do curso de mestrado profissionalizante.

O complexo conta com infra-estrutura preparada para utilização de laser no tratamento odontológico. São 400 metros quadrados, distribuídos entre quatro consultórios, dois laboratórios, banheiros com acesso para deficientes e uma área para esterilização de instrumentos. Os aparelhos para equipar os consultórios vieram de doações feitas por empresas privadas como a Kavo, a Lasering, a Gnatus e a Dabi-Atlante. O Lelo possui também salas para videoconferência, uma sala de aula e uma sala de computadores. Detalhe para a Biblioteca Laser, única do gênero no País, com material especializado, artigos, revistas e pesquisas nacionais e internacionais.

Em termos de equipamento, são nove lasers de alta intensidade e cinco de baixa intensidade, com custo total estimado em R$ 1 milhão. “Muitos desses equipamentos foram sendo adquiridos ao longo do tempo. Temos alguns que vieram de pesquisas financiadas pela Fapesp e outros que vieram de doações dos próprios fabricantes”, explica o professor.

Além da possibilidade de atendimento à comunidade uspiana e à sociedade, a ampliação do laboratório permite um melhor acesso, não só da USP, como de outras instituições, aos resultados das pesquisas e aos equipamentos. O intercâmbio com as outras universidades será aumentado, permitindo o desenvolvimento de mais trabalhos em conjunto, como as pesquisas que vêm sendo realizadas com a Unicamp e a Unesp.

A utilização de lasers no tratamento odontológico envolve testes em laboratório, conhecimento dos procedimentos técnicos com os equipamentos e, principalmente, o entendimento dos princípios da física ligados à aplicação do laser. Por isso, um dos grandes diferenciais da pesquisa produzida na FO é a parceria de dez anos com o Ipen.

O “casamento” Ipen-FO começou devido a uma série de competências e coincidências. “O pessoal do Lelo estava interessado em trabalhar com desenvolvimento de lasers para aplicação em tecido vivo e eu já tinha experiência nessa área. Por outro lado, o doutor Carlos de Paula estava começando a fazer suas pesquisas com laser na FO”, explica a professora Denise Maria Zezell, física-médica do Centro de Lasers e Aplicações (CLA) do Ipen. O objetivo das pesquisas se concentrou no desenvolvimento dos processos de aplicação do laser, que são chamados de protocolos ou planejamentos e envolvem especificações técnicas como potência, tempo de exposição, tipo de equipamento e regulagem do feixe de luz.

A parceria, conforme Carlos de Paula destaca, “facilita muito, porque proporciona aos alunos conhecimento da parte técnica”.Denise acrescenta que os dentistas, geralmente, estão acostumados com o contato físico da broca no dente, portanto o profissional sente nas mãos uma reação da força aplicada. Com o laser, o processo é bem diferente. O único contato com o dente é o feixe de luz. Dessa forma, um treinamento específico para utilização do equipamento faz-se mais que necessário.

“Mas o grande ganho foi com a troca de experiências. Enquanto nós aprendemos mais sobre a odontologia, o pessoal da FO pôde aprender métodos científicos para apresentar seus trabalhos, que devido à utilização do laser têm uma ligação muito forte com a física. Como resultado, os trabalhos ficaram mais precisos e profundos do ponto de vista das especificações técnicas do laser”, considera a professora.

Toda nova tecnologia traz vantagens para os profissionais, mas por outro lado também acarreta modificações em seus procedimentos e, portanto, a necessidade de formação para dominar a nova técnica. “A ‘conscientização antes da utilização’ é a atitude mais correta a ser tomada e, nesse ponto, a USP dá um passo muito importante com a abertura do novo laboratório”, declara Carlos de Paula.

Dessa forma, o Lelo funciona como um centro de conhecimento aberto para toda a comunidade odontológica. A idéia é trabalhar sob o binômio pesquisa e clínica, para proporcionar uma melhor utilização dos aparelhos e menos riscos para os pacientes. É importante que o desenvolvimento de novas tecnologias envolva também a responsabilidade social daqueles que as utilizam, por isso o professor acredita que a formação multidisciplinar é fundamental para quem opera com lasers.

A FO investe no papel de conscientização e formação de conhecimento oferecendo, para alunos e professores, desde 1999, a estrutura do Lelo. Na pós-graduação, o laboratório está disponível para todas as especialidades da faculdade. Outro ponto importante é a criação da disciplina Laser em Odontologia na graduação, processo aprovado na reunião da Congregação em agosto. “Precisamos saber o que esperamos do laser. Existe sempre o melhor equipamento a ser utilizado para cada caso. Hoje, o laser é parceiro da Odontologia, ou seja, procuramos vê-lo como um elemento coadjuvante nos procedimentos das mais diversas áreas e especialidades”, diz o professor.

O curso de mestrado profissionalizante Lasers em Odontologia Ipen-FO também vem dando muitos resultados, lembra o professor. Primeiro curso profissionalizante reconhecido pela Capes, em 1999, já formou 50 mestres e tem por objetivo promover conhecimentos teóricos e práticos sobre os lasers e suas aplicações em odontologia. Já foram defendidas mais de 100 teses sobre tratamento odontológico com laser e publicados aproximadamente 60 artigos.

Para Carlos de Paula, até o momento o maior mérito do tratamento odontológico com laser é a redução microbiana. Num tratamento de cárie, por exemplo, 80% dele é feito com o método tradicional. Os outros 20% são terminados com um laser de érbio ou neodímio. Através de um processo chamado ablação do tecido cariado, o laser provoca microexplosões na dentina atingida pelas bactérias, fazendo a remoção da cárie e conseguindo uma redução de até 99,6% na população de micróbios.

O mesmo vale para um tratamento de canal ou periodontal. Depois dos procedimentos tradicionais utilizados para remoção da área infectada, os dentistas fazem uma aplicação de laser intracanal para evitar novas infecções no canal que foi aberto. “Quando o canal é fechado, existe o risco de alguns micróbios terem sobrevivido ao tratamento preventivo. Uma irradiação com laser, antes do fechamento, melhorará em muito a redução microbiana da área afetada”, conta Carlos de Paula.

Outra aplicação do laser é no tratamento do herpes labial. A doença, que é causada por um vírus, apresenta como sintomas um ardor na região labial, seguido de coceira, que se transforma numa bolha. O laser age no alívio da dor e da irritação causada na pele. “Na mucosite, por exemplo, que é um efeito colateral da rádio e quimioterapia utilizadas no tratamento do câncer, há todo um processo inflamatório nas gengivas e mucosa do paciente, provocando sangramentos, dores e até mesmo dificuldades na alimentação. Muitas pessoas estão fazendo aplicações com laser para reduzir o processo inflamatório e principalmente para diminuir a dor”, explica o professor.

 




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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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