As
mais importantes universidades do mundo, com as quais a USP tem
convênios para ensino e pesquisa, fazem amplo uso de educação
a distância (EAD): Universidade da Califórnia, MIT,
Cornell, Harvard, Michigan, Indiana, Stanford, Oxford, Cambridge
e muitas outras. O MIT, por exemplo, há dois anos disponibilizou
gratuitamente na web, em forma digital, todo o material de seus
cursos, uma tentativa de apoiar alunos de outras instituições,
públicas e privadas, bem como pessoas não-matriculadas
mas com interesse em aprender. Um magnífico gesto similar
entre nós seria as três universidades estaduais paulistas
– USP, Unesp e Unicamp – se juntarem para disponibilizar
gratuitamente suas informações didáticas, para
todos os brasileiros, com patrocínio do projeto pela Fapesp,
por exemplo. É importante que universidades tradicionais,
sem fins lucrativos, para fazer frente às instituições
visando ao lucro que estão se estabelecendo no mercado, possam
expandir sua oferta de currículos regulares e de extensão
via EAD e disponibilizar material não-ligado a nenhum programa
específico, mas útil para aprendizagem “na hora
certa”.
O setor
educacional que mais cresce mundialmente é o de aprendizagem
a distância, uma abordagem bastante antiga, mas que está
recebendo uma nova vida com a chegada das novas tecnologias de comunicação,
com seu poder desestabilizador, e com as novas exigências
de capacitação humana numa sociedade de conhecimento.
Quando comparado a outros países, o Brasil está seriamente
atrasado no uso de estratégias pedagógicas que envolvem
uma forma ou outra de EAD. Embora existam exemplos de sucessos de
EAD, como o Telecurso 2000 (atendendo 500 mil alunos por ano através
da televisão em circuito aberto e material impresso) e os
cursos via web nas universidades corporativas (para aproximadamente
200 mil executivos e funcionários), nos ensinos médio
e superior o potencial não-realizado e a demanda reprimida
ainda são enormes. Grande parte do atraso está em
ignorar esse fato.
Há
um certo preconceito contra a educação a distância
por parte da população em geral (“Não
vi e não gostei!”). Esse preconceito é fruto
da desconfiança e da ignorância, que reduz o conceito
de EAD ao elementarismo dos cursos técnicos por correspondência.
Mas o EAD progride, a despeito das decisões e medidas burocratizadas
encetadas por muitos conselhos estaduais de educação
e ainda mais pelo Ministério da Educação durante
a administração passada, que conseguiu durante oito
anos desencorajar muitas instituições brasileiras
que queriam iniciar atividades de aprendizagem a distância.
Felizmente,
as perspectivas em 2003 são outras. O novo ministro da Educação
já se manifestou favorável ao amplo uso de EAD em
situações apropriadas, porque sabe dos bons resultados
em outros países e porque quer estender progressivamente
o acesso à educação a um número cada
vez maior de brasileiros. O Brasil atualmente tem apenas 8% dos
seus jovens de 18 a 24 anos matriculados em instituições
de ensino superior (enquanto Argentina e Chile têm 30% cada,
Reino Unido, 40% e Estados Unidos, 55%). Considere-se ainda que
a demanda social para lugares no ensino médio crescerá
nos próximos anos de 8 milhões para 16 milhões
de alunos. Numa
situação em que não há grandes recursos
financeiros disponíveis para construir novas salas de aula
ou para formar milhões de novos professores para atender
a essa demanda real da sociedade, a única forma que o Brasil
terá para dobrar a curto prazo o número de alunos
nos ensinos médio e superior será através do
EAD em combinação com o ensino convencional (presencial).
No
passado, a dimensão de um país e o conceito segundo
o qual “é direito de todos os cidadãos ter acesso
ao conhecimento” foram argumentos fortes em favor do EAD,
e continuam essenciais, embora argumentos novos tenham aparecido
recentemente. Ficar “fisicamente longe” do conhecimento
agora é “relativizado” porque o EAD consegue
diminuir as barreiras de tempo e espaço. Por exemplo, muitos
universitários norte-americanos, para acelerar a sua formatura,
fazem cursos via web “nas mesmas instituições
e nas mesmas cidades onde estudam presencialmente”, e muitas
universidades de primeira linha no exterior não fazem distinção
se o curso foi feito a distância ou não. O histórico
escolar do aluno é o mesmo.
Entretanto,
precisa ficar claro que EAD não é para todo mundo.
Ele não serve para alunos desmotivados ou que precisam de
muita atenção de um professor. É ideal para
quem está motivado a aprender, tem maturidade e autonomia
para levar a bom termo o seu curso, ou está impossibilitado
de freqüentar aulas presenciais em razão de outros impedimentos
(trabalho, família, problemas de locomoção).
Essas pessoas devem ter o direito de se aperfeiçoar através
de aprendizagem a distância. EAD não é um substituto
idêntico para a universidade presencial tradicional. É
uma abordagem diferente, apropriada para pessoas que não
tiveram oportunidade de cursar o ensino superior na idade certa,
mas que merecem uma “segunda chance”. Em EAD na web,
o aluno avança na sua aprendizagem à sua própria
velocidade e escolhe quando é mais conveniente participar
da “aula” assíncrona. Como uma nova mídia,
permite a apresentação de informação
de forma inovadora e estimulante. A interatividade envolve o aluno
em um processo que garante maior retenção e compreensão
mais profunda da matéria.
Pesquisas
desenvolvidas no Canadá demonstram que quando um curso universitário
via web é bem organizado, a aprendizagem é mais eficaz
do que seria se o mesmo curso fosse dado presencialmente. A interatividade
intensa via rede é fator predominante na diferenciação.
Em uma universidade pública da Austrália, 4 mil alunos
estão realizando com sucesso cursos completos de graduação
e pós-graduação totalmente automatizados via
web – isto é, sem a interferência ao vivo de
um professor a não ser que o aluno assim deseje.
A USP
está atrasada na área de EAD. Não temos um
consenso de opinião sobre que modelo de estrutura seria melhor
para a nossa realidade, centralizada ou descentralizada, nem sobre
outras questões básicas, como propriedade intelectual
(se os direitos do conteúdo de cursos pertenceriam à
instituição ou ao professor); que tecnologia ou tecnologias
usar; e para que público prioritário o EAD deve ser
dirigido (alunos atuais presenciais ou um novo público uspiano
a distância).
As
respostas a essas questões têm que ser o resultado
de pesquisa e consenso de opinião de vários setores
da Universidade. Se acreditarmos que, em termos gerais, a qualidade
da nossa instituição é muito boa e se acreditarmos
que quanto mais brasileiros tiverem contato com a boa aprendizagem
na USP melhor para a sociedade, então teremos que promover
o EAD, não necessariamente de forma massiva, mas certamente
com a qualidade de que somos capazes, para modernizar e flexibilizar
a aprendizagem dos nossos alunos atuais e também para dar
acesso ao conhecimento avançado para os excluídos
do ensino superior público, aumentando o número de
líderes futuros da nossa sociedade.
Fredric
M. Litto é professor da Escola de Comunicações
e Artes (ECA) da USP, coordenador científico da Escola do
Futuro da USP e presidente, desde 1995, da Associação
Brasileira de Educação a Distância (Abed)
Correção
Na
edição 636 do Jornal da USP (de 31 de março
a 6 de abril), a cerimônia de premiação
da Rádio USP (FM 93,7 MHz), promovida pela Associação
Paulista de Críticos de Arte (APCA) e realizada no
dia 24 de março no Centro Cultural Banco do Brasil,
teve a presença do prefeito do campus da USP em São
Carlos, professor Dagoberto Mori, e não do diretor
da Escola de Engenharia de São Carlos, professor Francisco
Antonio Rocco Lahr, como foi erroneamente divulgado. |
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