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Em sua edição da semana de 12 a 18 de maio passado, o Jornal da USP publicou matéria com o professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP Augusto Damineli (“O eclipse de uma estrela”, número 641, página 9). Nela, o professor previa que, “entre o final de junho e o início de julho deste ano”, a maior e mais luminosa estrela do Universo conhecido, a Eta Carinae, sofreria uma espécie de “apagão”. Segundo o professor, o astro é formado por duas estrelas – uma maior, com cerca de 70 massas solares (ou seja 70 vezes a massa do Sol que ilumina a Terra), e outra menor, com 35 massas solares. Elas giram em torno de um centro comum a uma distância astronomicamente ínfima entre si – o equivalente à distância entre a Terra e o Sol. Acontece que a estrela maior está envolta numa espessa camada de nuvem, formada por ventos solares. Quando os dois astros, em suas órbitas em torno do centro comum, chegam à máxima aproximação entre si, a estrela menor penetra na nuvem, que a encobre, fazendo com que os observadores da Terra não vejam o seu brilho – daí o “apagão”. “É um fenômeno ainda não descrito pela astronomia mundial”, explicou Damineli.

No final de junho, as previsões de Damineli foram confirmadas. “Tudo aconteceu com a precisão de um relógio”, comemora o professor, que estuda o astro desde 1989. Segundo ele, o “dia D” do fenômeno ocorreu em 25 de junho. Em todo o “apagão”, que acontecerá ao longo de um mês, a Eta Carinae perde luz equivalente a 20 mil vezes a que é emitida pelo Sol. “Denominamos ‘apagão’ a interrupção rítmica de alguns canais de emissão de energia luminosa da estrela. Após o fenômeno, todos os canais da Eta Carinae estarão ativos novamente”, explica.

Há cerca de seis anos, o professor vinha defendendo a teoria de que o astro seria composto por um sistema duplo, com duas estrelas interagindo e formando um sistema ligado pela força da gravidade. Damineli também havia previsto o intervalo de tempo entre os “apagões” de aproximadamente 2.020 dias. O último fenômeno aconteceu em dezembro de 1997. Uma outra corrente de pesquisadores, no entanto, tinha outra postura a respeito da estrela.

Antes de Damineli anunciar suas teorias, a comunidade científica internacional acreditava que a Eta Carinae era formada por apenas uma estrela. Embora alguns pesquisadores tenham aderido às idéias do professor da USP – publicadas pela primeira vez após o “apagão” de 1997 –, boa parte dos cientistas continuava duvidando da tese. O fenômeno ocorrido no dia 25 de junho deverá contribuir para eliminar as últimas resistências. “O descrédito inicial se deu porque a descoberta aconteceu em estudos a partir de um telescópio pequeno, de 1,60 metro de diâmetro, e em país subdesenvolvido”, declarou Damineli, na mesma edição do Jornal da USP em que previu o “apagão”. “Por isso eu preciso provar muito mais que alguém que tenha acesso a tecnologias de ponta.”

A Eta Carinae está morrendo, conforme explicou Damineli ao Jornal da USP em maio. Para os cientistas, uma estrela nessa fase ainda tem entre 10 mil e 100 mil anos de vida. Ao final desse período, ocorrerá uma grande explosão, que será visível da Terra. “Essa explosão poderá ser um perigo para o planeta”, disse o professor naquela ocasião. “A parte do planeta que estiver voltada para a estrela vai ser bombardeada de raios gama.” Teorias recentes indicam que estrelas com essa massa morrem em forma de hipernova, brilhando como todas as estrelas do Universo juntas (100 bilhões de vezes 100 bilhões de sóis).

Com cerca de 2,5 milhões de anos, a Eta Carinae é uma estrela recente, se comparada com a idade do Universo, estimada em 13,7 bilhões de anos. Segundo o professor, o estudo sobre ela é importante porque estrelas semelhantes produziram, há 13 bilhões de anos, todo o oxigênio e nitrogênio que a Terra possui. Durante a fase de formação da galáxia, essas estrelas explodiram e os planetas que nasceram depois se enriqueceram desses gases. O oxigênio introjetado na Terra deu origem à água, o que foi fundamental para o surgimento da vida.

Oportunidade única – A Eta Carinae fica à direita do Cruzeiro do Sul e só pode ser vista com binóculos ou telescópios. De acordo com o pesquisador, os próximos dois “apagões” acontecerão em 2009 e 2014. “Não podíamos perder essa oportunidade, já que o período foi ideal para as observações. Em 2009, o fenômeno deverá ocorrer em dezembro, época que não favorecerá o acompanhamento das interrupções rítmicas”, diz.

No Brasil, a estrela vem sendo monitorada por Damineli, Nelson Leister e Ronaldo Savarino, todos do IAG, no Observatório do Pico dos Dias, do Laboratório Nacional de Astrofísica, em Brazópolis, Minas Gerais. Zulema Abraham, também do IAG, monitora o “apagão” no radiotelescópio de Itapetinga, próximo a São Paulo. Do espaço, o satélite XTE mede todos os dias o fluxo de raios X. Outros telescópios espaciais, como o Hubble, Chandra, XMM e Integral, fazem parte da campanha.

A Eta Carinae é a estrela mais luminosa que se conhece. Estrelas como essa são raríssimas nesta fase do Universo. A confirmação de que é formada por dois astros permitirá que os astrônomos descubram a sua massa. Esse cálculo é feito através da medida da elipse da estrela. “Quando temos duas estrelas, é como se tivéssemos dois pratos de uma balança: comparando as duas elipses, chegamos à massa delas, o que é impossível quando há uma estrela só”, disse Damineli. As observações prosseguem até meados de agosto, quando a estrela passará a cruzar os céus durante o dia.
 

 




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