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O sistema brasileiro de televisão aberta é um dos maiores do mundo. De acordo com dados do IBGE, a TV está presente em 90% das casas no Brasil. A implantação de um sistema de TV digital vai afetar praticamente todos os cidadãos. Se as previsões se concretizarem, até 2010, com um sinal que permite o envio e a recepção de grande quantidade de dados – além da transmissão de imagem e som –, poderemos ver o início de uma nova era, a da interatividade. Um aparelho híbrido possibilitará o acesso ao conteúdo televisivo, serviços, Internet e ainda permitirá que o usuário responda a essas informações. A tecnologia já existente abre espaço para muitas inovações e transformações na vida cotidiana. Marcar uma consulta médica, acessar serviços públicos, navegar pela Internet, assistir a uma aula e enviar um comentário sobre um programa de TV são apenas algumas das possibilidades que poderão passar do mundo futurista da ficção para a realidade.

Toda essa revolução interativa não acontecerá de um momento para o outro. O processo de mudança deverá começar no próximo ano. Para discutir o assunto e auxiliar na formação de políticas públicas que atendam aos interesses de toda a sociedade, professores e integrantes de diferentes grupos de pesquisa da USP sobre a TV digital estão promovendo debates através do Fórum de Políticas Públicas.

O fórum foi criado no final do ano passado. De acordo com um de seus coordenadores, o professor do Departamento de Engenharia de Produção da Escola Politécnica Laerte Idal Sznelwar, a proposta do fórum é reunir grupos de pesquisa e promover um debate sobre os principais problemas do País. A TV digital foi o primeiro tema a ser escolhido por causa da urgência na definição de diretrizes para a implantação do sistema.

O grupo que integra o Fórum TV digital inclui 22 professores, ligados à Escola Politécnica, Escola de Comunicações e Artes, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Instituto de Estudos Avançados, o portal Cidade do Conhecimento, Escola do Futuro e TV USP. Numa reunião realizada na Escola Politécnica, no dia 8 passado, esse grupo lançou um documento de dez páginas sobre as discussões realizadas até agora. O documento foi enviado para o Ministério das Comunicações e para o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O tema foi dividido em quatro aspectos fundamentais: modelo e sistema de regulação; tecnologia e desenvolvimento; conteúdo da programação; e inclusão social e inclusão digital.

“A USP tem um papel fomentador desse debate. Um outro papel da Universidade é transferir tanto para o governo quanto para a sociedade informações mais amplas sobre a questão”, disse Sznelwar. Os outros agentes envolvidos no processo de implantação da TV digital no Brasil também terão a chance de participar da discussão. O fórum vai promover um seminário, com data ainda a ser definida, entre final de agosto ou início de setembro, e convidará representantes do governo, universidades, sociedade civil, setores industriais, produtores de audiovisual e emissoras, entre outros atuantes no processo de instalação da TV digital.

Modelo – O professor da Escola Politécnica diz que, através das reuniões do fórum, pôde-se perceber que a questão fundamental sobre a TV digital é a definição de um modelo. “A discussão é ampla: vai desde o padrão tecnológico até a geração dos futuros programas, o papel educativo, os serviços públicos, como o usuário poderá dar o retorno às informações, a gestão desse sistema e como serão distribuídas as concessões”, explica. “São muitos aspectos que envolvem a determinação de um modelo.”

O documento produzido pelo fórum defende a criação de um modelo próprio de TV digital para o Brasil e diz que, “apesar de algumas resistências esboçadas, é perfeitamente factível. Como se sabe, 40 anos atrás, com uma capacidade tecnológica muito inferior à existente atualmente no País, o Brasil foi capaz de criar um padrão próprio de TV analógica”.

Para a professora da ECA Marília Franco, ao tomar decisões sobre a digitalização, é importante a articulação de todas as instâncias envolvidas no processo, desde a política até a econômica, e a coerência com a atual situação do País. Marília acredita que a maior inovação que a digitalização trará é a possibilidade do uso da TV interativa como prestadora de seviços. No documento, destaca-se a democratização do acesso a esse novo serviço como fator decisivo para o futuro êxito da TV digital no Brasil. “A oferta de informações interativas para a maioria das residências contribuirá para promover um incremento na qualidade de vida, na medida em que amplia a oferta de serviços de utilidade pública em todas as camadas da população”, diz o documento.

É através da utilização de um conversor do sinal analógico para o digital, com um custo inferior a um terço do preço de um aparelho de televisão popular – ou seja, aproximadamente R$ 100 –, que os integrantes do fórum propõem a inclusão digital. Essa seria uma alternativa que nenhum dos padrões já existentes, da Europa, Estados Unidos e Japão, oferece a um valor acessível ao brasileiro. O conversor é um projeto inovador e revolucionário que está em desenvolvimento desde 1996 no Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI) do Departamento de Engenharia Elétrica da Escola Politécnica da USP, com previsão para ser industrializado em 2004.

Sznelwar e Marília: diretrizes para a implantação da TV digital no Brasil

 

 

 

Sugestões da USP
para o governo

O Fórum de Políticas Públicas sobre TV digital da USP gerou outro resultado prático além do documento lançado na semana passada. Um conjunto representativo dos grupos de pesquisa atuantes em TV digital na USP analisou a “Minuta de exposição de motivos”, proposta pelo Ministério das Comunicações, que estabelece algumas diretrizes para a implantação do novo sistema. Dessa análise, surgiram observações e sugestões que foram agrupadas num documento chamado “Manifestação da Universidade de São Paulo para a consulta pública do Ministério das Comunicações”, enviado ao governo na primeira semana de julho.

Para o pró-reitor de Pesquisa da USP, Luiz Nunes de Oliveira, que também participou da análise do documento, a proposta do governo é muito cuidadosa e responsável. “Esse é um documento muito valioso, que chama a atenção para as decisões de problemas complexos que envolvem uma mudança de paradigma.”

Oliveira acredita que a implantação da TV digital é mais do que um avanço tecnológico que permitirá a evolução do sinal analógico para o sistema digital. “Essa será uma mudança cultural comparável ao surgimento da TV. O impacto é muito maior do que pode parecer à primeira vista.”

As sugestões de mudanças feitas pela USP na minuta do governo dizem respeito à pesquisa e à propriedade intelectual. No primeiro aspecto, o Ministério das Comunicações propõe que a pesquisa seja dividida em básica, a cargo das universidades, e aplicada, executada através de praticamente dois órgãos, a Fundação CPqD (Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações) e o Instituto Genius, de Manaus, que se encarregariam de transpor as soluções acadêmicas às indústrias. O pró-reitor acredita que o melhor é não haver divisões. “Queremos participar de todo o processo. A pesquisa é um processo integrado e a Universidade tem competência para trabalhar em todos os pontos.”

Quanto à propriedade intelectual, o documento do Ministério prevê a cessão de todos os direitos dos envolvidos à União, o que na opinião do professor Marcelo Zuffo, do Laboratório de Sistemas Integráveis (LSI) da Escola Politécnica da USP, também um dos redatores do manifesto, “é uma forma de afugentar investimentos tecnológicos, sobretudo do setor privado”. Ele acredita que seria mais benéfico se o governo atuasse apenas na gestão da propriedade intelectual.

Zuffo acredita que a USP pode contribuir em diversos aspectos na implantação do sistema digital no Brasil através dos diferentes grupos que pesquisam o mesma tema na Universidade. O LSI está trabalhando com alunos de mestrado e doutorado desde 1996 num projeto que terá grande influência na inclusão digital e social.

O laboratório desenvolve uma caixa de conversão do sinal analógico para o digital chamado de Set-top-box. O custo desse conversor seria, para o consumidor, equivalente a um terço de preço de um aparelho de TV popular. “O conversor seria fundamental para facilitar o acesso a essa nova tecnologia”, diz o professor.

Zuffo destaca que uma das grandes revoluções do novo sistema é a convergência com a Internet e a possibilidade de colocar na rede a maioria da população, já que 90% têm TV. “Isso vai ser uma revolução nos serviços interativos. E o acesso à Internet – hoje apenas 10% estão na rede – vai gerar um grande impacto na educação a distância.”

 

O documento “Manifestação da Universidade de São Paulo para a consulta pública do Ministério das Comunicações” está disponível na página eletrônica da Pró-Reitoria de Pesquisa (www.usp.br/prp).

 




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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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