O
Brasil forma cerca de 6 mil doutores por ano e a meta
do governo federal é chegar, em quatro anos, a 10 mil. Entretanto,
para Carlos Henrique de Brito Cruz, reitor da Unicamp e ex-presidente
da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
de São Paulo (Fapesp), o problema não é apenas
aumentar o número de pesquisadores, mas garantir que a maioria
deles seja contratada para fazer pesquisa em empresas. Essas e outras
idéias foram apresentadas por Cruz no dia 15 passado, durante
o simpósio Desafios da Inovação no Sistema
Produtivo Nacional, que integrou a programação da
55ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso
da Ciência (SBPC), em Recife (PE). “É a empresa
que mais faz inovação, ou seja, que pega uma idéia
e a transforma em algo real, em produto”, afirma. “Para
que a tecnologia cresça, é fundamental que haja maior
participação da iniciativa privada.”
Após
um breve relato sobre a importância dos investimentos estatais,
iniciados nos anos 60, que permitiram ao Brasil formar um forte
sistema de pesquisa nas suas universidades públicas, Cruz
lembrou que, no mundo todo, a maior parte da pesquisa desenvolvida
nas universidades continua a ser financiada por recursos públicos.
“Nos Estados Unidos, apenas 7% dos recursos das pesquisas
universitárias têm origem na iniciativa privada, o
que significa que o papel do Estado continua sendo fundamental na
manutenção e indução da pesquisa de
base, ou seja, no fortalecimento da criatividade.”
Em
seguida, o presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep)
e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Sérgio
Rezende, relatou algumas das realizações da Finep
nos últimos meses. Ele declarou que, entre as metas da instituição,
ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT),
estão a mudança de procedimentos para a aprovação
de projetos, visando à agilidade do fornecimento de recursos,
e a instalação, até o final do ano, de um calendário
anual dos editais que serão publicados para os grupos interessados
em obter recursos dos fundos setoriais.
Vacina
– Em entrevista coletiva realizada no dia 14, durante a reunião
da SBPC, a professora do Instituto de Ciências Biomédicas
(ICB) da USP Magda Carneiro Sampaio anunciou que uma vacina transgênica
contra a diarréia infantil – causada pela bactéria
Esdredria coli – foi testada com sucesso em ratos e coelhos,
atingindo um índice de imunização superior
a 90%.
A Esdredria
coli atinge principalmente crianças pobres, que vivem em
situações de falta de higiene e de alimentação
adequada. O microorganismo é responsável, anualmente,
por cerca de 2,6 milhões de mortes de crianças com
até dois anos.
O trabalho, desenvolvido em parceria com o também professor
da USP e pesquisador do Instituto Butantan Luís Trabulsi,
partiu da identificação dos anticorpos presentes no
leite materno responsáveis pela imunização
dos bebês contra o problema. De posse desses dados, os pesquisadores
injetaram os genes na bactéria Lactococus lactis, encontrada
no organismo humano e inofensiva para a saúde, conseguindo
produzir a vacina.
Estiveram
presentes na coletiva os professores Hugo Issler, também
da USP, e Vilneide Braga Serva, do Instituto Materno Infantil de
Pernambuco (Imip), centro de referência do Ministério
da Saúde na área. Os pesquisadores falaram sobre a
importância do trabalho com mães de baixa renda, no
sentido de educá-las para conseguir maior assepsia, ou seja,
maiores cuidados com a higiene. Eles lembraram também a importância
de manterem o aleitamento materno pelo maior tempo possível,
como forma natural de reforçar a imunidade de suas crianças
contra agentes patógenos.
“De
acordo com a Organização Mundial da Saúde,
o ideal é que todas as crianças sejam amamentadas
até os dois anos de idade, somando isso, claro, com outros
tipos de alimentos”, explicou Vil-neide. “No Brasil,
nossas crianças são amamentadas, na média,
até os nove meses de idade, um bom resultado se compararmos
com a realidade de outros países ou com o fato de muitas
mães serem subnutridas.”
“O
próximo passo da pesquisa será a realização
de testes em humanos, começando com adultos com baixa imunidade
contra o problema pelo fato de viverem em uma situação
higiênica e sanitária boa, que limita seu contato com
a E. coli e, posteriormente, em crianças”, declarou
Magda, que antes da coletiva apresentara alguns dados da pesquisa,
junto com seus colegas, no simpósio Saúde Materno
Infantil.
Constelações
indígenas – Outra novidade científica foi levada
à reunião da SBPC pelo professor de Física
da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Germano Bruno Affonso.
Durante mais de dez anos, Affonso reconstituiu as constelações
conhecidas pelos povos indígenas do Brasil, principalmente
os tupinambás. Registradas em relatos antigos, escritos entre
os séculos 16 e 17 e ainda hoje lembradas por alguns índios
apesar da lenta perda desses conhecimentos, as constelações
eram uma referência para a marcação do tempo,
das estações do ano e como pontos de orientação
geográfica.
“As
constelações indígenas, muitas vezes, incluíam
em sua formação manchas da Via-Láctea, chamada
por muitas tribos como o Caminho dos Espíritos ou o Caminho
da Anta”, disse Affonso.
Entre
as principais constelações encontradas destacam-se
a de Ema, Anta, Homem Velho e Veado, de um total de cerca de cem
grupos de estrelas.
A cultura
ocidental reconhece, atualmente, a existência de 88 constelações.
Para recolher depoimentos dos índios, o cientista afirma
que percorreu boa parte das atuais reservas indígenas do
País. A pesquisa teve como estímulo inicial a leitura
do relato do padre francês Claude d’Abbeville, escrito
no século 17. Cada constelação traz um significado,
como a do Homem Velho, que indica o início do verão
ou das chuvas (estação das águas).
Entretanto,
muitas das constelações indígenas são
formadas por estrelas que compõem as constelações
da cultura ocidental, como a de Ema, cuja cabeça é
constituída por partes do conhecido Cruzeiro do Sul, enquanto
seu pescoço é formado pelas estrelas Alfa e Beta Centauro.
Cursos
noturnos – Uma pesquisa divulgada no dia 15 mostrou que uma
das alternativas para a diminuição do elitismo do
ensino superior brasileiro é o aumento da oferta de cursos
noturnos. Os resultados foram apresentados na reunião da
SBPC pelo professor Mauro Mendes Braga, da Universidade Federal
de Minas Gerais (UFMG), no seminário Políticas Afirmativas
em Educação. Para a realização do estudo,
uma equipe coordenada pelo pesquisador analisou o perfil socioeconômico
dos alunos dos cursos noturnos da UFMG, comparando as notas obtidas
por esses estudantes no vestibular e no Provão, e por meio
de questionários.
Apesar
de terem menos recursos materiais que os alunos dos cursos diurnos,
os estudantes do período noturno tiveram praticamente o mesmo
desempenho. Segundo dados do Censo do Ensino Superior do Ministério
da Educação, atualmente as universidades federais
oferecem cerca de 24,6% de suas matrículas no período
noturno. Para Braga, as universidades precisam, gradualmente, ampliar
esse número.
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