PROCURAR POR
 NESTA EDIÇÃO
  
 

Baile na roça é o título que Cândido Portinari deu à primeira tela em que retratou o Brasil, pintando uma típica festa popular de sua cidade natal no interior de São Paulo, Brodósqui. A obra foi rejeitada pelo Salão Oficial da Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro, pelas inovações técnicas incorporadas pelo pintor. Baile na roça é também o nome do espetáculo que o Balé da Cidade de São Paulo remonta neste ano para comemorar os cem anos desse pintor brasileiro que sempre buscou as raízes de seu país. Mas as relações entre Portinari e a dança estão longe de se esgotar neste nome. Além de pintar variadas telas sobre bailes e festas de sua terra, ele ainda estendeu sua arte para os figurinos e os cenários do balé Iara, apresentado no Brasil em 1946 pelo Original Ballet Russe.

Aliás, foi a partir do convite de remontar Iara, história da rainha das águas e sua luta contra o Sol da seca nordestina, que Baile na roça – Coreografias para Portinari começou a andar com seus próprios pés. O Projeto Portinari, coordenado pelo filho do pintor, conseguiu resgatar os cenários e os figurinos da peça, mas a coreografia permaneceu desconhecida. Diante da falta de registros sobre Iara, o diretor José Possi Neto (ECA/USP) montou um novo espetáculo, inspirado em diferentes telas do pintor e dançado pela primeira vez em 1998, quando Possi era diretor do Balé da Cidade.

A versão atual mantém a divisão anterior em cinco balés, sendo que um deles subdivide-se ainda em três partes. “Cada um dos balés foi coreografado por bailarinos da companhia. Cada um tem uma busca e se inspirou em telas e aspectos diferentes de Portinari”, explica Possi. A ligação entre eles são os trechos da coreografia de Ana Teixeira que se alternam com as criações dos outros bailarinos. “Ela quis mostrar as mulheres fortes através de seus pés, suas mãos e costas marcantes nas telas. Os três quadros da coreógrafa são mais conceituais”, conta a diretora artística do Balé da Cidade de São Paulo, Mônica Mion, que dançou o espetáculo em 1998. Na cena sobre as mãos, os figurinos de Lino Villaventura permitem que somente as mãos dos dançarinos apareçam. O mesmo acontece com outras partes do corpo.

Da roça para o palco – Os pés dos bailarinos traduzem para a dança os pés da roça, dos espantalhos, dos retirantes, dos músicos, das crianças, dos brasileiros enfim retratados por Portinari, ele próprio “um caipira”, como se definia. Ao fundo do palco, as pinturas que influenciaram cada cena do espetáculo são projetadas com uma alteração – os personagens de Brodósqui foram retirados para que os dançarinos dessem vida a eles durante o balé. É assim que o sanfoneiro, o João Negrinho e os familiares de Portinari, retratados em Baile na roça, pulam para o palco e que os cenários das telas do pintor se transformam em cenários do espetáculo.

Um ícone bastante pintado por Portinari, ao qual ele se compara em um de seus depoimentos, é o espantalho. Essa importante figura da crendice popular, tema apreciado pelo pintor, recebe o único solo do espetáculo, quando um dançarino se movimenta pendurado por elásticos, utilizando técnicas circenses. Além de retratar a realidade na “roça”, a temática urbana das telas do pintor também serviu de inspiração, como conta Possi. Representando retirantes oprimidos na cidade grande, uma bailarina dança dentro de uma espécie de aquário que se esvazia ao fim da cena, ao som de Deodeca, de Caetano Veloso e Jacques Morelembaum. A Orquestra Sinfônica Municipal, com regência do maestro Henrique Lian, interpreta as composições também assinadas por Egberto Gismonti, Sérgio Assada e Hermeto Paschoal, que encerra o balé com forrós, “os bailes da roça”, segundo Possi. Para o diretor, o espetáculo tem uma estética com valores e temáticas brasileiros, características que Portinari teve coragem de assumir em sua obra Baile na roça, desafiando os preceitos acadêmicos vigentes no País para retratar a identidade nacional.

As apresentações de Baile na roça – Coreografias para Portinari acontecem nesta semana, de quinta a sábado, às 21h, e no domingo, às 17h. No Teatro Municipal de São Paulo, que fica na Praça Ramos de Azevedo, s/no, tel. 223-3022. Os ingressos custam de R$ 10,00 a R$ 15,00 (com meia-entrada).

 

Espetáculo de balé resgata temas nacionais pintados por Portinari em suas obras, como na tela Baile na roça (acima)

 

 




ir para o topo da página


O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
[EXPEDIENTE] [EMAIL]