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A partir dos debates iniciados na semana passada no Senado, uma luz no fim do túnel pode estar surgindo para a Universidade no que se refere à reforma da Previdência. O texto aprovado na Câmara dos Deputados no prazo recorde de 119 dias começou a tramitar no Senado em 1o de setembro e, já no dia seguinte, recebeu sugestões de emendas que tocam em alguns pontos-chave reivindicados pelo meio acadêmico.

Líderes do PFL, PSDB e PDT apresentaram na terça-feira passada, dia 2, quatro propostas consensuais e outras ainda deveriam ser apresentadas após o fechamento desta edição, na quinta-feira, dia 4. Temas como taxação de inativos e subtetos salariais devem voltar à tona e coincidem com os focos de insatisfação expressos pelos três reitores das universidades estaduais paulistas – USP, Unesp e Unicamp – em documento entregue no dia 20 de agosto a parlamentares, entre eles o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP).

As emendas de consenso prevêem o aumento da idade para aposentadoria compulsória de 70 para 75 anos e a constituição de três fundos complementares para os funcionários (um para o Legislativo, um para o Executivo e outro para o Judiciário), incluindo a autorização para que o funcionário opte por um fundo privado. Propõem também o fim da reestatização do seguro de trabalho e a garantia clara de paridade para os atuais servidores. Para esses temas, os líderes dos três partidos já contavam com a adesão de 33 senadores, de um total de 81. “Nossas perspectivas de adesão da oposição a essas propostas são favoráveis, mas só confirmaremos isso no decorrer do processo”, disse ao Jornal da USP o senador José Agripino (RN), líder do PFL no Senado.

Outras três emendas deverão ser apresentadas, mas não têm unanimidade dos partidos de oposição ao governo. Elas estabelecem a fixação de um subteto salarial único nos Estados, que seria de 90,25% do salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), e o fim da taxação em 11% dos inativos, além da criação de dois níveis para as pensões que superarem determinado valor. Sobre este último item, a idéia, conforme o PFL, é fazer cortes diferenciados de 10% e 20% sobre pensões que ultrapassem R$ 2.400,00, ao passo que, no texto aprovado pelos deputados, os valores que excederem aquele teto sofrem corte linear de 30% e o excedente não tem paridade integral. O senador Agripino previa ainda apresentar na semana passada uma emenda individual formulando regras de transição para os servidores que estão prestes a se aposentar.

Concorrência e privatização – A emenda que constitui fundos de pensão diferenciados para o Executivo, o Legislativo e o Judiciário e prevê autorização para que o funcionário opte por um fundo privado – o texto da Câmara prevê que os fundos complementares sejam de natureza pública – foi justificada pelo senador Agripino como uma forma de imprimir concorrência no mercado de fundos de pensão no futuro. Mas o professor José Roberto Ferreira Savóia, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, ex-secretário de Previdência Complementar do governo federal, diz que não vê uma explicação técnica plausível para ecsa separação. Para ele, a possibilidade de mobilidade de um fundo para outro acarretará maiores custos de captação e gerenciamento de cotistas e gerará a necessidade de maior controle e fiscalização. Ele diz também que a autorização para que o funcionário opte por um fundo privado privilegia os fundos de pensão de caráter fechado e os planos abertos das seguradoras.

Já o presidente da Associação dos Docentes da USP (Adusp), professor Américo Kerr, acredita que a diferenciação de fundos advém provavelmente de interesses particulares do Judiciário e do Legislativo, onde estão as categorias de maiores salários do funcionalismo. Isso porque os cotistas de maior poder aquisitivo não correriam o risco de subsidiar benefícios dos que ganham menos. Além disso, com recursos maiores, esses fundos teriam maior poder de barganha no mercado. Nesse ponto, o professor da FEA discorda e diz que não existe o risco da regressividade, ou seja, de um cotista de salário maior subsidiar os que ganham menos, porque as contribuições e os benefícios recebidos na aposentadoria são proporcionais ao salário de cada contribuinte.

“Sou contra fundos de pensão porque deslocam dinheiro da Previdência pública e solidária para fundos de capitalização. A Seguridade Social movimentou R$ 177 bilhões no ano passado no País e é claro que os mercados financeiros querem abocanhar parte disso. Trata-se de um mecanismo perverso que alimenta a política de juros altos. Os fundos investem prioritariamente em títulos do Tesouro e depois o Estado lhes devolve o dinheiro com as altas taxas de juros que vemos atualmente. Quem, neste país, garante que pode confiar os benefícios de 35 anos de trabalho às instituições financeiras? É só olhar para a história e verificar a frágil saúde financeira de tantos fundos ‘poderosos’ que, no entanto, quebraram. Os exemplos estão aí para quem quiser ver, tanto nos Estados Unidos como no México e na América Latina”, diz Kerr.

Sobre a quebradeira de fundos, o senador Agripino justifica que os que estão em crise são os de benefício definido e não os de contribuição definida. Ele concorda ser impopular a medida que estabelece uma parcela para o cotista contribuir ao longo da vida sem a contrapartida da garantia de um benefício definido quando se aposentar. “Todos gostaríamos que a União garantisse isso. Mas é impossível, o País quebra.”

O professor Savóia elogia a proposta de subteto salarial único nos Estados, mas alerta que, por problemas de constitucionalidade, a redação do tema deverá ser feita com todo o cuidado. Para Kerr, essa mudança no texto é importante “não simplesmente por questões salariais, mas por uma questão de princípios”. “Discutir salários nem é propriamente uma discussão de reforma previdenciária. Mas o docente não pode ficar sujeito a uma ‘canetada’ do governador”, avalia. Kerr elogia a proposta de isenção dos inativos, mas critica o aumento da idade para aposentadoria compulsória. “O problema é perpetuar alguém num posto de comando sem fazer a renovação necessária.” Por outro lado, Savóia acredita que a medida pode trazer benefícios ao sistema previdenciário. “Atende a um desejo antigo do Judiciário, que entende ser possível manter juízes e ministros por mais tempo no serviço público. O efeito disso é benéfico porque, se a pessoa permanece mais tempo em atividade, traz economia à Previdência e ajuda a reduzir o déficit do sistema.”

Ameaça à Universidade – Vários temas abordados nas emendas apresentadas pela oposição no Senado foram tratados pelo reitor da USP, Adolpho José Melfi, na edição 654 do Jornal da USP (de 18 a 24 de agosto, página 3). Na ocasião, Melfi alertou para o fato de que “criar um subteto para determinadas carreiras com base num salário que não pertence àquelas carreiras em questão é perigoso”, lembrando o caso do governador Aécio Neves, de Minas Gerais, que baixou o próprio salário. Ele disse também que o texto aprovado na Câmara pode trazer riscos à pesquisa e ao ensino público na medida em que desestimula a permanência na Universidade de professores em Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa (RDIDP). “Do jeito que está o texto, não há atrativos para o ingresso no serviço público e muitos docentes não quererão mais lecionar em tempo integral. Eles preferirão trabalhar em tempo parcial e arrumar um outro emprego, por exemplo, em universidades particulares.”

Para o reitor, a falta de clareza sobre as regras de transição para a aposentadoria também afetam a Universidade. Muitos docentes em condições de se aposentar já solicitaram contagem de tempo de trabalho, com medo de perder dinheiro caso não se aposentem agora, por exemplo. “Os aposentados continuarão onerando a nossa folha e, se tivermos um grande número de aposentadorias, não teremos possibilidade de contratar na mesma proporção. Além disso, também perderemos as pessoas mais experientes”, disse.

 

Docentes preparam carta ao Congresso

Depois de reunião com o reitor na semana passada, a Associação dos Docentes da USP (Adusp) decidiu encaminhar ao Congresso Nacional uma carta com abaixo-assinado trazendo as principais reivindicações da categoria no que se refere à reforma da Previdência, segundo o presidente da entidade, professor Américo Kerr. A carta – que ainda não havia sido finalizada até o fechamento desta edição do Jornal da USP – reforçará os pedidos feitos pelos reitores das universidades estaduais paulistas, que no dia 20 de agosto foram ao Senado solicitar mudanças nos rumos da reforma. Isso significa que o término da greve dos docentes da USP não significa o fim das pressões em Brasília. A greve dos professores contra a reforma da Previdência – iniciada no dia 7 de agosto – terminou no dia 21 de agosto sem ter obtido significativa adesão, mesmo com o apoio dos estudantes de graduação e de pós-graduação e do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp).

 

 




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