Ler
é desejar a obra, é pretender ser a obra, escreveu
Roland Barthes (1915-1980) no livro Crítica e Verdade. Para
ele, o autor de um texto não pode prever a leitura que cada
pessoa fará do que ele escreveu e é aí que
reside “o prazer do texto”. Leitor
e escritor de “fragmentos”, Barthes conheceu o estruturalismo
por Saussure e Greimas e o ampliou para os recônditos da literatura,
sempre buscando os significados “ocultos” nos deleites
do texto. Discorreu ainda sobre semiótica, fotografia, moda,
gastronomia e cinema, chegando até a interpretar um papel
no filme As irmãs Brontë. Assim “teceu”
textos com prazer para serem “fruídos” também
com prazer – “saber com sabor”, como ele próprio
definia.
É
este nome que leva o encontro em torno de sua obra, realizado pelo
Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, o Curso de Língua
e Literatura Francesas da USP e o Centro Universitário Maria
Antonia. O período é de retomada de seus escritos,
junto aos lançamentos de reedições e inéditos
pela Editora Martins Fontes, coordenados pela professora da Faculdade
de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, Leyla
Perrone-Moysés, que também organiza o colóquio
e é uma das principais responsáveis pela divulgação
do escritor no Brasil. É ela quem abre o encontro, acompanhada
de Philippe Willemart, também da USP, e do francês
Antoine Compagnon, professor da Sorbonne – onde Barthes formou-se
em Literatura Clássica e Filologia – e que, a exemplo
de seu antecessor, vê a literatura como citações,
uma grande colagem de saberes.
A trajetória
até o prazer – Durante os oito anos que passou num
sanatório devido à tuberculose, Roland Barthes leu
“fragmentos” de Sartre, Camus e Michelet, anotando em
fichas o que mais lhe interessava nos autores e desenvolvendo o
método que usaria por toda sua vida e até mesmo em
suas anotações autobiográficas, Roland Barthes
por Roland Barthes (1975). São as relações
entre Barthes e Camus que serão abordadas no encontro pelo
crítico literário Manuel da Costa Pinto. Barthes,
de origem pobre, mas não necessariamente por isso, envolveu-se
numa polêmica com Camus por causa do marxismo, que defendia.
É o marxismo uma outra relação do escritor
discutida no colóquio, pelo francês Phillippe Roger,
professor da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de
Paris, instituição em que Barthes também lecionou,
nos anos 60.
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Ilustração
de Barthes utilizada no livro
Fragmentos de um discurso amoroso |
Iniciado
na lingüística por Greimas, Barthes foi um dos grandes
teóricos
do estruturalismo, ao lado de Lacan, Lévi-Strauss e Foucault.
Ele escreveu, nos anos 50, Mitologias e O grau zero da escritura,
na busca das estruturas simbólicas por trás dos acontecimentos,
inclusive da literatura e principalmente das marcas do mundo burguês,
por exemplo, a moda. Contudo, quando o estruturalismo se trava em
estereótipos, o escritor francês volta-se para O prazer
do texto (um de seus últimos títulos). “O horror
à estereotipia e o discurso político” é
debatido no encontro pelo jornalista J. B. Natali.
Barthes
só atinge maior popularidade com o título Fragmentos
de um discurso amoroso (1977), sua publicação mais
conhecida no Brasil. O livro transformou-se aqui em espetáculo
homônimo, protagonizado por Antonio Fagundes e dirigido por
Ulysses Cruz entre 1988 e 1991. Uma gravação em vídeo
da peça será exibida durante o colóquio. Depois
da publicação deste livro, Barthes ministra aulas
no Collège de France. Cursos
oferecidos por ele como O Neutro e Como Viver Junto serão
ineditamente publicados no Brasil e apresentados no evento com a
coleção Roland Barthes da Editora Martins Fontes.
Muitos dos livros relançados estão esgotados no Brasil.
Nada estranho para um escritor e teórico que vendeu muitos
títulos e que, ao final da vida, freqüentava, além
das telas de cinema, programas de televisão. Também
costumava ir a jantares com célebres figuras francesas. Após
um desses encontros, com o então primeiro-secretário
do Partido Socialista François Mitterand, Roland Barthes
morreu em 1980, atropelado em uma rua de Paris.
Mas
não se encerrou aí sua escrita do cotidiano e da sedução.
O legado de Barthes é discutido no último dia pela
socióloga francesa Françoise Gaillard e pelo professor
Evando Nascimento. Para alguém que tinha como influências
fragmentos diversos e que influenciou através de seus próprios
fragmentos, o legado maior não é deixar discípulos
e sim um modo peculiar de enxergar a linguagem e o mundo que ela
constrói – costurando poética, crítica
e, sobretudo, prazer.
O
colóquio Roland Barthes, O Saber com Sabor será realizado
entre os dias 29 de setembro e 1o de outubro no Centro Universitário
Maria Antonia (r. Maria Antonia, 294, Vila Buarque), com tradução
simultânea francês-português. As inscrições
são gratuitas e devem ser feitas pelos telefones 3091-3919
e 3031-2242 (com Sandra Codo) ou 3255-7182 (ramal 35, com Tuca),
ou ainda pelos e-mails sancodo@usp.br e mariantonia@edu.usp.br.
Programação completa no site www.usp.br/iea.
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