Bem
ou mal, a democratização no ensino superior segue
a passos largos. De 1998 a 2003, o número de cursos de graduação
presenciais cresceu 107%, passando de 6.950 para 14.399, segundo
dados do Censo da Educação Superior, realizado em
2002 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (Inep), do Ministério da Educação.
Mesmo assim, somente 9% dos brasileiros com idade entre 18 e 24
anos freqüentam um curso superior, quando em outros países
essa taxa ultrapassa 50%.
Na
USP, democratizar o acesso e promover constantemente a melhoria
da qualidade do ensino é uma das metas prioritárias
da atual gestão. A pró-reitora de Graduação,
Sonia Penin, afirma que a meta é aumentar para cerca de 10
mil o número de vagas nos cursos de graduação
até 2005, além de dar andamento a uma série
de programas de valorização do ensino. “Democratizar
o ensino é uma necessidade”, diz Sonia. “Precisamos
ter os pés no chão e avançar realisticamente
dentro do orçamento da Universidade e mesmo do PIB brasileiro”
(leia o texto ao lado).
A questão
é como manter a qualidade diante da rápida expansão
do ensino superior verificada no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Para o professor Sérgio Cardoso, do Departamento de Filosofia
da USP, o que se viu nos últimos oito anos foi uma mutilação
do ensino promovida pela massificação de cursos e
abertura descontrolada de estabelecimentos. Já o professor
Otaviano Helene, docente do Instituto de Física da USP e
ex-presidente do Inep, acha que a manutenção dos padrões
de qualidade do ensino superior público depende especialmente
da contratação de mais docentes.
Descentralização
– Se é para mudar, antes é preciso avaliar o
passado e pensar como, para onde e por que mudar. Essa é
a idéia do Núcleo de Pesquisas sobre Ensino Superior
(Nupes) da USP, co-fundado pela professora Eunice Ribeiro Durham,
que reúne pesquisadores de política acadêmica,
formação de professores e outros temas ligados à
universidade. Eunice formulou uma série de propostas para
o setor em 1991, quando dirigiu a Secretaria Nacional de Educação
Superior no governo Collor. “A discussão sobre a universidade
no Brasil é essencialmente ideológica. Havia muito
pouca informação objetiva. Precisávamos de
dados mais confiáveis”, diz a professora, lembrando
os motivos que a levaram a elaborar suas propostas.
Segundo
Eunice, é fundamental, para a universidade brasileira, mudar
o sistema de financiamento e promover uma descentralização,
que inclua autonomia administrativa e financeira efetiva. O sistema
de financiamento deve ser associado a uma avaliação
de desempenho, “único modo de modernizar as universidades
e torná-las mais eficientes”, acrescenta.
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Sonia
Penin (esquerda) e Eunice Durham:
propostas em prol da universidade pública |
O futuro
da universidade, afirma Eunice, depende de um enfoque amplo, o que
inclui reavaliar a maneira como hoje é visto o ensino superior.
“Nenhum país do mundo tem condições de
formar gente suficiente apenas através de universidades de
pesquisa, que são muito especializadas e dependem de pessoal
muito qualificado e caro”, defende a professora. “Temos
um problema sério na democratização do ensino
e, para resolvermos isso, precisamos diversificar cursos e estabelecimentos.
O Estado de São Paulo, por exemplo, não carece simplesmente
de novos campi, mas de instituições como centros de
educação superior com cursos adequados à necessidades
locais.” Ela cita como exemplo o sistema superior dos Estados
Unidos, em que há renomadas universidades voltadas à
pesquisa, aquelas dedicadas ao ensino e ainda os colleges, que são
centros de profissionalização. Para Eunice, as escolas
técnicas podem igualmente formar bons profissionais sem que
isso seja necessariamente feito em universidades.
Eunice
não acha positivo simplesmente criar novos campi ou abrir
mais vagas nas universidades públicas sem a contrapartida
de uma reformulação administrativa e estrutural nas
instituições. “Grandes corporações
criam entraves burocráticos enormes”, afirma. A fim
de facilitar o gerenciamento, ela acredita que o campus da zona
leste deveria constituir um instituto independente, da mesma forma
que a administração de outros campi deveria ser descentralizada.
Andifes
defende autonomia
Um
dos indicadores do custo-benefício do investimento
em ensino superior pode ser visualizado no aumento da produtividade
econômica em diversos setores. Agronegócios,
por exemplo, já respondem por cerca de 40% das exportações
do País e expandiram-se em grande parte por causa dos
investimentos em pesquisa e formação de recursos
humanos. Nesse contexto, a universidade não deve ser
vista apenas como um instrumento de mobilidade social pessoal,
mas como um instrumento estratégico para o desenvolvimento
das nações. A educação deve ser
um bem público e o conhecimento, patrimônio social.
Essa
foi a tônica do discurso da professora Wrana Maria Panizzi,
presidente da Associação Nacional dos Dirigentes
das Instituições de Ensino Superior (Andifes
), ao entregar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva
a proposta da entidade para a expansão e modernização
do sistema federal de ensino superior, durante o seminário
Universidade XXI, ocorrido em novembro passado em Brasília.
Wrana é reitora da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, instituição que também completa
70 anos de fundação este ano.
O
documento da Andifes coincide em boa parte com as idéias
dos intelectuais reunidos em torno do Fórum de Políticas
Públicas da USP (leia texto na página ao lado).
A entidade é contrária às teses privatistas
do Banco Mundial e defende maior autonomia às universidades
federais, que hoje não controlam sequer suas folhas
de pagamento nem podem contratar ou demitir funcionários
e professores sem anuência do Congresso Nacional.
Relatório
produzido pelo Banco Mundial em 2003 sugere transferir recursos
de aposentadorias e das universidades para os ensinos pré-escolar
e primário, além da revisão do financiamento
das universidades públicas e a realocação
de serviços públicos para programas que beneficiem
setores mais pobres, entre outros pontos.
Em
outra frente, a comissão interministerial nomeada pelo
presidente da República para avaliar a atual situação
das instituições de ensino superior já
concluiu seus trabalhos, no dia 23 de dezembro passado. Formada
por técnicos dos ministérios da Educação,
Planejamento, Fazenda, Ciência e Tecnologia e da Casa
Civil, a comissão foi incumbida também de propor
medidas para reestruturar o modelo atual e promover a redemocratização
das universidades. A assessoria
de imprensa da Casa Civil informou que o órgão
ainda analisa o documento e que outro estudo deverá
ser realizado a fim de apontar diretrizes gerais para a reforma
do ensino superior no País.
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USP
quer ter 10 mil vagas em 2005
Ao
mesmo tempo em que busca aumentar, na capital, o número
de vagas para alunos de 7.175, em 2000, para 10 mil em 2005,
a USP pretende reduzir a evasão de alunos, já
que o número de evadidos desde o vestibular de 1996
até o de 2003 cresceu de 373 para 1.091. Democratizar
o acesso à Universidade e promover a melhoria das condições
de ensino e aprendizagem são metas prioritárias
da atual gestão.
A
criação do campus da zona leste, assim como
dos cursos noturnos e novos cursos no interior, bem como o
aumento de vagas nos diversos campi, fazem parte das diretrizes
de democratização do ensino promovidas pela
Reitoria da USP. “Nossos
jovens ainda estão distantes da universidade. Democratizar
o ensino é uma questão polêmica, mas uma
necessidade. Precisamos ter os pés no chão e
avançar realisticamente dentro do orçamento
da Universidade
e mesmo do PIB brasileiro”, afirma a pró-reitora
de Graduação, professora Sonia Penin.
Implantar
essas metas implica colocar em andamento uma série
de ações. Para valorizar o ensino e as condições
de aprendizagem, foram criados o Programa de Reequipamento
de Laboratórios Didáticos de Graduaàão
(Pró-Lab), o Programa de Apoio à Realização
e Participação em Eventos voltados à
Graduação (Pró-Eve) e o Programa de Apoio
à Produção de Material Didático
(Pró-Mat). Foram mantidos outros, como o Programa Sala
Pró-Aluno (Pró-Aluno) e o Programa de Recuperação
de Salas de Aulas (Pró-Salas). Além
disso, programas de apoio acadêmico buscam incentivar
o docente a aprimorar o ensino e as técnicas pedagógicas.
A
evasão, que em alguns cursos chega a 30%, será
combatida por estratégias como a melhoria de laboratórios,
materiais, bibliotecas, atendimento, informatização
e instalações em geral. As grades curriculares
deverão ser aprimoradas, a fim de torná-las
mais atraentes ao aluno. “As grades vêm sendo
analisadas nas comissões de graduação
de cada unidade e estamos envolvendo mais o aluno nesta discussão”,
afirma Sonia. Um grupo de professores da Faculdade de Educação
faz atualmente uma pesquisa para mapear as principais razões
que levam à evasão e
servirá de subsídio no aperfeiçoamento
de ações que evitem o abandono de cursos.
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