Ser diretora do Instituto de Psicologia da USP não
estava no projeto de vida da professora Maria Helena Souza Patto.
Nos últimos 30 anos, ela vem se dedicando em tempo integral
à docência e à pesquisa. Não quis ser
chefe de departamento. Nunca ocupou a presidência de comissões
e sempre se desviou de funções técnico-administrativas.
Mas foi exatamente a trajetória como professora e pesquisadora
que, há dois meses, resultou na sua indicação
para ficar à frente do instituto. Seu nome foi apresentado
em uma lista tríplice e escolhido pelo reitor Adolpho José
Melfi, que levou em conta a vontade da unidade. Sinceramente,
eu jamais me imaginava nessa função, diz Maria
Helena. Mas, diante da indicação, estou assumindo
com uma grande responsabilidade, que vou desenvolver da melhor forma
possível. A professora tomou posse no dia 20 de abril,
em cerimônia realizada na Sala do Conselho Universitário.
Maria Helena vê a sua gestão com a colaboração
dos alunos, funcionários e docentes. Estamos desenvolvendo
um projeto para que a administração flua mais. Quero
tornar a papelada a serviço dos nossos objetivos e não
um empecilho aos objetivos de ensino, pesquisa e extensão.
Dentro do que está previsto nas regras e regimentos da Universidade,
a professora está estudando meios para simplificar a burocracia,
que muitas vezes acaba emperrando as atividades do cotidiano. Acho
que há muitas coisas que podem ser aprimoradas, que abrangem
desde o funcionamento administrativo, passando pela formação
dos alunos e indo até os nossos serviços de atendimento
à comunidade.
Contra
a burocracia
A formação dos alunos é uma prioridade. Maria
Helena está investindo nas comissões de Graduação,
Pós-Graduação, Pesquisa e Cultura e Extensão
Universitária. Ela quer, por exemplo, aumentar o número
de bolsistas de iniciação científica na graduação.
A pesquisa é indispensável para o conhecimento,
portanto, vamos nos concentrar para que os alunos tenham todas as
oportunidades.
Também aliviar o cotidiano dos professores das questões
burocráticas é outra meta. Queremos livrar os
professores, na medida do possível, do excesso de burocracia,
para que possam desenvolver as suas atividades de maneira mais livre,
solta e fácil, observa Maria Helena. Por exemplo,
os relatórios de final de ano, de formatos diversos, exigem
dados que causam verdadeira aflição. Vamos, então,
procurar instalar um banco de dados que possa fornecer todas as
informações necessárias para esses relatórios.
Embora ainda não tenha se reunido com os representantes do
bloco de atendimento do instituto, a diretora afirma que os serviços
de assistência terão uma atenção muito
especial. Vamos procurar aprimorar o nosso atendimento, mas,
para isso, precisamos de mais técnicos. Buscaremos atender
ao maior número de pessoas através da expansão
da infra-estrutura humana dos serviços.
O Instituto de Psicologia vem se destacando na cidade pela sua assistência.
Oferece serviços de atendimento clínico, desenvolve
um trabalho nas escolas da rede pública orientando professores
e educadores e dando assistência nas próprias escolas,
auxiliando nos problemas de aprendizagem e fracasso escolar. Dispõe,
ainda, de um serviço de orientação profissional
para adolescentes e jovens e assessora vários órgãos
públicos de atendimento, como a Febem, entre outros ligados
às Secretarias de Educação, Bem-Estar Social
e Saúde. Estamos o tempo todo colocando o nosso conhecimento
e a nossa prática à disposição,
acentua Maria Helena. Escrevemos livros, artigos, levamos
a nossa crítica, a nossa palavra. Um conhecimento a que têm
acesso os governantes, a quem cabe a decisão de utilizá-lo
ou não nas políticas públicas.
Questão
política
Desde que decidiu pela trajetória como professora e pesquisadora
da USP, Maria Helena tem se dedicado ao estudo da psicologia aplicada
à educação. O foco de todo o seu trabalho é
a aprendizagem nas escolas públicas. Minhas pesquisas
procuram observar o fracasso escolar das crianças das classes
menos favorecidas. Há explicações oficiais
dizendo que essas crianças são menos capazes de aprendizagem.
No entanto, tenho uma postura crítica diante dessas avaliações.
A professora atribui esse fracasso escolar à política
educacional que deteriora a escola pública. Os professores
são o produto de uma política que não investe
na formação adequada, que não os valoriza como
verdadeiros trabalhadores intelectuais. Maria Helena conta
que a escola pública teve o seu momento de excelência
pedagógica a duras penas. No entanto, a partir dos anos 70,
começou a se desmantelar com a visão tecnicista do
ensino e a perda do compromisso social diante da formação
educacional das classes populares.
Transformaram a educação em uma mera questão
de técnicas de ensino. E a educação é
muito mais do que isto. Tem uma dimensão ética, uma
dimensão política. É uma questão de
valores que orientam a prática pedagógica.
A falta de políticas para a educação pública
é, segundo Maria Helena, uma questão histórica.
Essa falha, na verdade, vem desde a época do Brasil
Colônia e do Brasil Império, afirma. A
educação pública sempre foi muito descuidada
pelas autoridades. Isso aconteceu também na Primeira República
e continuou assim. Não houve investimentos na formação
escolar das classes populares. O que a escola pública conseguiu
foi a duras penas. No entanto, essa imagem foi destruída
com a ditadura.
Todo esse descaso resultou no atual sucateamento do ensino público
fundamental e médio. Há crianças terminando
o primeiro grau completamente analfabetas, lamenta a professora.
Diante dessa realidade, tanto os professores como os alunos sofrem
todos os prejuízos. O índice de adoecimento
entre os professores da rede pública vem crescendo cada vez
mais. As estatísticas de professores que são obrigados
a se afastar por esgotamento físico e mental, por problemas
de coluna e por hipertensão compõem um quadro desolador.
Maria Helena lembra que uma pesquisa recente do Núcleo de
Estudos da Violência (NEV) da USP mostra que várias
escolas públicas de todo o Brasil vêm se transformando
em um campo de guerra. Mas volto a insistir: essa situação
não é por culpa dos professores, nem dos alunos, mas
o resultado de uma política educacional perversa, em que
nem alunos nem professores são respeitados.
Segundo as pesquisas de Maria Helena, a psicologia, aliada à
educação, tem muito a contribuir para a melhoria das
políticas públicas. É muito importante
a atuação dos psicólogos nas escolas públicas.
O governo precisa decidir, enfim, se a instrução pública
e a escola pública são de fato prioridades fundamentais
como ele tanto alega. Para a professora, os investimentos
que foram e estão sendo feitos pelo governo são irrisórios
diante da população de crianças e jovens. É
preciso investir muito mais. É urgente a valorização
dos professores. Não basta pagar melhores salários.
É preciso valorizar a educação continuada e
dar oportunidade aos professores de tomar decisões naquilo
que diz respeito à sua própria prática como
educadores. Deveriam ter acesso fácil à literatura
e às artes plásticas e ter oportunidade de viajar,
ir ao cinema. Enfim, um conhecimento que poderia ser propiciado
através das políticas públicas.
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