Com a sua Leica, o fotógrafo Henri Cartier-Bresson
saiu pelo mundo documentando e testemunhando acontecimentos importantes
como os últimos dias de Gandhi. E momentos delicados como
o sorriso das crianças brincando em uma rua qualquer. Na
verdade, não era com a Leica que ele fotografava. Cartier-Bresson
focava as cenas com a alma. As fotos fluíam em seu momento
decisivo, como ele próprio definia. Ou o momento em
que as paisagens e os seres têm uma luz única, onde
todos os elementos internos e externos estão no lugar. É
desse jeito que ele conseguia retratar as emoções.
No brilho do olhar ou na espontaneidade dos gestos, buscava revelar
a dimensão dos homens no mundo.
Com essa sensibilidade, Cartier-Bresson documentou uma realidade
que poderia passar despercebida. Daí ser considerado o pai
do fotojornalismo moderno. Ele ensinou que não basta
perceber o fato para fotografar. Dizia que fotografar é pôr
numa mesma linha a mente, os olhos e o coração,
afirma o professor Boris Kossoy, da Escola de Comunicações
e Artes (ECA) da USP. Fotografava com um equipamento muito
simples, mas sua sensibilidade e cultura faziam com que ele documentasse
cenas que passavam despercebidas.
As fotos de Cartier-Bresson dispensam legendas. Conseguem reunir
informações e despertar emoções como
se ele estivesse pintando. Importante lembrar que ele também
desenhava. Tinha 20 anos quando foi estudar arte com o pintor cubista
André Lhote, explica Kossoy.
Equilíbrio
geométrico
Cartier-Bresson nasceu no dia 22 de agosto de 1908 na cidade de
Chanteloup, na França, em uma família próspera.
Depois de ter aulas de desenho e pintura, passou a dedicar-se, em
1931, à fotografia. Comprou sua primeira Leica, de 35 milímetros,
em 1932, e nunca mais conseguiu se separar dela. Dizia que a máquina
era o seu caderno de anotações, um instrumento da
intuição e da espontaneidade. Para fotografar,
precisamos estar envolvidos com aquilo que estamos vendo diante
da lente. Precisamos de concentração, disciplina mental,
senso de equilíbrio geométrico, dizia.
Em 1934, vai para o México participar de uma expedição
antropológica, onde conhece o fotógrafo Manuel Alvarez
Bravo. No ano seguinte, muda-se para os Estados Unidos e se dedica
ao cinema. Passa a trabalhar como assistente de direção
de Jean Renoir em alguns filmes, como As regras do jogo. Foi reconhecido
por dois documentários que fez sobre os hospitais da Espanha
e sobre os prisioneiros franceses que retornaram para casa no final
da Segunda Guerra Mundial.
Em 1947, Bresson fundou a agência Magnum, com Robert Capa,
David Seymor e George Rodger. Ficou três anos percorrendo
o Oriente e, na sua estadia na Índia, fotografou o funeral
de Mahatma Gandhi. Foi o primeiro fotógrafo ocidental a ter
a entrada permitida na União Soviética, em 1954. Fotografou
na China, Japão, Cuba e foi reunindo uma obra grandiosa.
No início da década de 70 decidiu aposentar sua Leica
e se dedicar ao desenho e à pintura. Justificava: O
desenho é uma meditação, enquanto a foto é
um tiro.
Henri Cartier-Bresson morreu na segunda-feira, dia 2, aos 95 anos
de idade. Uma notícia que só foi divulgada na quarta-feira,
4. Nos últimos anos, Cartier-Bresson preferiu o aconchego
dos amigos mais próximos. Mas sabia que as imagens de uma
vida decisiva vão continuar pelo mundo, contando as histórias
do século 20 que ele conseguiu capturar com a mente, os olhos
e o coração. Imagens que influenciaram também
a história de outros fotógrafos. Quando ouvi
a notícia de sua morte fiquei muito sensibilizado, porque
ele é uma dessas pessoas que temos a certeza de que não
irão morrer jamais, conta Cristiano Mascaro. Ainda
era estudante da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP)
quando me deparei com um de seus livros na biblioteca. Lembro-me
até hoje da foto de um casal em um parque de Paris. Fiquei
tão impressionado que decidi que jamais seria arquiteto.
Queria tentar fotografar. Com paixão e sensibilidade.
Morre
um revolucionário
morre,
aos 88 anos, Francis Crick, que junto com James Watson descobriu
em 1953 a estrutura da dupla hélice do DNA. A grande
questão que esses dois pesquisadores tentavam entender
era: o que é a vida? Como ela era transmitida de geração
para geração?
A descoberta de como o DNA era organizado dentro das células
foi um marco gigantesco porque permitiu que se compreendessem
dois grandes mistérios: como são armazenadas
as informações genéticas e como elas
são transmitidas de uma geração para
outra sem perder suas características. Na década
de 60, foi elucidado o código genético, isto
é, como as quatro letras, ATGC, do alfabeto
do DNA as bases nitrogenadas adenina, timina, guanina
e citosina , codificam as proteínas para o funcionamento
dos organismos. Foi o início da biologia molecular.
Outra revolução ocorreu na década de
70 com a introdução da tecnologia para manipular
e analisar o DNA. E em 1990 foi iniciado o Projeto Genoma
Humano. O objetivo era seqüenciar, até 2005, as
três bilhões de letras que constituem
o DNA humano e identificar os genes (as seqüências
de DNA) responsáveis por nossas características
hereditárias. Mas o Projeto Genoma Humano foi concluído
dois anos antes do previsto.
Em 2003 festejaram-se ao mesmo tempo dois feitos que revolucionaram
a genética: os 50 anos da descoberta da dupla hélice
e o fim do seqüenciamento do genoma humano. Era o fim
do começo. Temos ainda um longo caminho a percorrer.
As perguntas que gostaríamos de responder são:
Por que envelhecemos? Por que ficamos doentes? Por que morremos?
Quanto da nossa personalidade e do nosso comportamento é
determinado por nossos genes? Como nossos genes controlam
a nossa memória? As nossas emoções? Por
que reagimos diferentemente a medicamentos? O que nos distingue
das outras espécies?
Mas enquanto buscamos as respostas para essas perguntas e
para o tratamento das doenças humanas, a biologia molecular
tem trazido avanços enormes na nossa compreensão
acerca dessas patologias, no aprimoramento do diagnóstico
e na prevenção de doenças genéticas
a partir da identificação de casais em risco.
Com esses avanços, abrem-se enormes questões
éticas que têm que ser debatidas por toda a sociedade.
Tudo isso tem sido possível porque Watson e Crick desvendaram
o segredo da dupla hélice do DNA. Dizem que o homem
é eterno quando sua obra permanece. Francis Crick será
lembrado para sempre, pois ele contribuiu para descobrir o
segredo da vida.
Mayana
Zatz (mayazatz@usp.br)
é coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano
do Instituto de Biociências da USP
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