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25 mulheres que estão fazendo a nova literatura brasileira, de Luiz Ruffato (organizador), Editora Record, 368 páginas, R$ 39,90.


Revelando segredos, criando mistérios, trazendo surpresas. Contando contos. Dialogando com sua história, inovando sua linguagem, revolucionando textos. Escrevendo. Sem limitações de temas ou estilos, o escritor Luiz Ruffato organizou a antologia de contos 25 mulheres que estão fazendo a nova literatura brasileira.

O livro inclui textos de autoras com experiências diversas, como uma jovem que começou a escrever em blogs da Internet e aos 17 anos já publicava seu primeiro romance ou a escritora de um best-seller adaptado para a televisão. Nele há desde referências pop e urbanas a elementos poéticos e eruditos. A diversidade é a marca da nova produção literária brasileira, que hoje reverte uma história escrita fundamentalmente por homens.

Um painel representativo dessa diversidade e atualidade foi o que o organizador pretendeu contemplar na coletânea, incomodado por ver poucas citações de mulheres nas abordagens da literatura contemporânea do País. Seu único critério foi trazer textos inéditos de autoras que começaram a publicar nos anos 90. “O que tentei foi abrir o mais possível o leque para mostrar que existem diversas maneiras de escrever hoje, trazendo autoras que saíram de blogs, de pequenas editoras e também aquelas já reconhecidas. Não queria fechar em um tema para o leitor ter uma idéia clara do universo particular de cada uma das escritoras”, esclarece o organizador. “Portanto, trata-se de uma coletânea que se quer panorâmica e não se arroga definitiva, nem em relação aos nomes nem à qualidade dos textos”, conforme explica no prefácio. Entretanto, o número de brasileiras escrevendo obras de qualidade é tão elevado que, ao concluir esse primeiro livro, Ruffato já tinha os 30 nomes que vão integrar o próximo volume de contos escritos por mulheres.

Sem rótulos

Contos escritos por mulheres, mas não contos femininos. O organizador – e as escritoras – rejeitam essa classificação, que pode resvalar em preconceito. “Enquanto os homens escrevem simplesmente ‘literatura’, em geral se considera que as escritoras estão produzindo ‘literatura feminina’ – e o adjetivo marca uma posição subalterna, menos legítima”, afirma a professora de literatura Regina Dalcastagnè, que escreveu a orelha do livro.

O próprio pseudônimo que a escritora Índigo, por exemplo, escolheu para assinar sua obra – em vez de Ana Cristina, seu verdadeiro nome – demonstra a vontade de não se definir pelo gênero, mas por seus escritos. “Há uma visão estereotipada de que a mulher tem uma gama de interesses restritos”, completa Ruffato, referindo-se ao estigma de que os textos escritos por mulheres têm de ser intimistas. “Talvez ainda se possa distinguir um tom mais confessional, que a convenção nos ensinou a considerar ‘feminino’, e o predomínio de protagonistas mulheres, como se falar dos homens não lhes coubesse. Mas não são traços uniformes: há exceções, e elas são significativas”, analisa Regina.

Se a jovem Simone Campos, por exemplo, que nasceu em 1983 (isso mesmo: a escritora, ainda estudante de jornalismo, tem apenas 21 anos), inicia o conto Bondade com um tom autobiográfico, a autora de Glória, Guiomar de Grammont, oferece um contraponto relevante ao trazer em seu conto um protagonista masculino, em primeira pessoa. Fernanda Benevides Carvalho também constrói um personagem masculino, um velho que escreve uma carta a sua irmã.

Assim é que a urbanidade e a Internet são trabalhadas nos contos de Mara Coradello, Claudia Tajes e Állex Leilla. Símbolos pop dos anos 70 são rememorados por Ana Paula Maia. Já Augusta Faro traz o fantástico à história de uma costureira numa cidadezinha. O mistério é chave no texto Madrugada, de Heloisa Seixas, que relata a paixão de uma mulher por outra. A efemeridade dos relacionamentos, por esperar ou por temer o amor, aparece em Nilza Rezende e Clarah Averbuck.
São temas que, à primeira vista, até podem ser considerados “femininos”, mas que, mesmo quando parecem óbvios para uma mulher, derrubam tabus. Como o da maternidade, que traz revolta à personagem desdenhada pela mãe, criada por Ivana Arruda Leite em Mãe, o cacete. E que faz sofrer a protagonista de Desalento, de Tatiana Salem Levy, ao perder um filho. Por outro lado, o cuidado paterno está presente no conto da autora do romance A casa das sete mulheres, Letícia Wierzchowski, história de uma menina criada por um cigano.

Linguagem

Ao mesmo tempo, as pesquisas lingüísticas de algumas dessas escritoras podem apontar rumos de vanguarda. Ora no apuro das palavras e das frases, ora na influência das linguagens da Internet, do cinema, da modernidade. A metalinguagem, o diálogo com o leitor e ainda a reflexão sobre os termos usados estão explícitos em muitos dos contos. Talvez por influência direta da interatividade que algumas das escritoras estão acostumadas a vivenciar em seus blogs, talvez por um diálogo com a própria história da literatura.

As influências são muitas e as escritoras que vivem essas diferenças renovam, inovam, transformam, criam. Pouco importa se o substrato é sua própria vida, sua imaginação ou sua redenção, que, como artistas da palavra, necessitam da escrita. Clarice Lispector, em suas correspondências, já revelava sua opção: “Vou criar o que me aconteceu. Só porque viver não é relatável. Viver não é vivível. Terei que criar sobre a vida. E sem mentir. Criar sim, mentir não. Criar não é imaginação, é correr o grande risco de se ter a realidade”.

 




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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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