O
encontro na USP para comemorar 25 anos de parceria acadêmica
entre Brasil e França
A
pesquisa brasileira mereceu elogio entusiasmado do professor
Daniel Nahon, presidente do Comitê Francês de Avaliação
da Cooperação Universitária com o Brasil (Cofecub).
Ele considera que nos últimos 25 anos, que é o tempo
da cooperação formal do Cofecub e da Capes (Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior),
o País deu um salto extraordinário nessa área,
tornando-se parceiro destacado de instituições, não
só francesas, mas também de outros países.
E isso em campos diversificados, como genética, engenharias
e ciências humanas, além de possuir forte atuação
em redes mundiais. Nisso teve e tem participação ativa
a USP, que, segundo Nahon, com 70 anos é uma universidade
muito jovem, principalmente se comparada com universidades européias,
algumas com mais de 700 anos. A juventude dos cientistas brasileiros
e seu entusiasmo criativo explicariam em parte a rápida evolução
da pesquisa nacional.
No caso da cooperação entre universidades públicas
francesas e brasileiras, o início foi modesto, como lembra
o coordenador-geral de Cooperação Internacional da
Capes, professor Benício Viero Schmidt. Começou como
assistência social e acadêmica dos franceses a alguns
cursos de mestrado de universidades do Norte e Nordeste do Brasil,
principalmente na área de humanidades, mas do estágio
quase exótico evoluiu para outros ramos do conhecimento e
para outras regiões do País. Atualmente, a Capes administra
140 projetos, sendo que neste ano serão encerrados 40 e aprovados
entre 30 e 40 novos.
A USP participa de duas formas: está incluída no acordo
Capes-Cofecub desde a sua assinatura, em 1978, e desenvolve programa
específico com os franceses, acordado em 1993 e gerenciado
pela Pró-Reitoria de Pesquisa. Segundo a pró-reitora
de Pós-Graduação Suely Vilela, a importância
da cooperação bilateral está na possibilidade
de intercâmbio de alunos (bolsa-sanduíche) e na co-tutela,
modelo de ensino e pesquisa de pós-graduação
que resulta para o aluno em titulação reconhecida
nos dois países. Até agora a modalidade está
restrita à França, mas, segundo Suely, a USP pretende
ampliar o modelo e mantém entendimentos com outros países.
Pelo menos duas universidades da Austrália já manifestaram
interesse.
doutoranda Fraulein de Paula : balanço
altamente positivo
Correções
de rumo
Para fazer um balanço dos 25 anos da cooperação
Capes-Cofecub e sugerir rumos para os próximos anos, coordenadores
dos programas, reitores e representantes dos dois países
reuniram-se nos dias 3 e 4, no auditório da Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo (algumas reuniões no Instituto de
Matemática e Estatística). O encontro consistiu em
seminários temáticos e um seminário internacional,
este com a presença de representantes dos dois governos
Nelson Maculan, secretário de Ensino Superior do MEC, representando
o ministro da Educação Tarso Genro; Jean de Gliniasty,
embaixador da França; Jorge Guimarães, presidente
da Capes; Daniel Nahon, presidente do Cofecub; André Siganos,
diretor-adjunto do Ministério das Relações
Exteriores da França; e Adolpho José Melfi, reitor
da USP.
Se, para Siganos, o programa Brasil-França é modelar
e referência internacional, para Maculan o acordo Capes-Cofecub
terá desdobramentos no âmbito da Comunidade Européia.
Ele disse que a iniciativa francesa levou o Brasil a se organizar
internamente e deu impulso ao ensino da língua francesa,
uma prática que costuma sair da rotina do estudante brasileiro.
Aliás, entre as sugestões apresentadas pelos brasileiros
para melhorar a eficiência dos programas bilaterais está
a criação de novos métodos de ensino do francês.
De acordo com Benício Schmidt, o universo da pesquisa, mesmo
quando se trata de países como a Alemanha, costuma adotar
o inglês como língua oficial. Mas a França faz
menos concessões nessa área e conhecer o francês
é pré-requisito para participar do programa bilateral.
O mesmo se exige da outra parte, que conheça o português.
Mesmo assim, o coordenador-geral de Cooperação Internacional
da Capes observa que, nesse ponto, o desempenho dos brasileiros
é superior ao dos franceses. Houve entre os expositores brasileiros
quem considerasse desnecessário o exame de proficiência
em língua francesa, argumentando que o estudante, mesmo desconhecendo
no início a língua do país do estágio,
é perfeitamente capaz de se sair bem no curso e de aprender
o idioma sem formalidades.
A facilidade do brasileiro para línguas é atestada
pela estudante do Departamento de Psicologia Escolar da USP Fraulein
Vidigal de Paula, que não teve maiores problemas com a língua
durante o estágio de oito meses, de dezembro de 2003 a julho
deste ano, na Universidade de Rennes 2 (na capital da Bretanha).
Lá ela desenvolveu trabalho para doutorado na área
de psicolingüística, com supervisão do professor
Jean-Émile Gombert, e defenderá a tese no final do
próximo ano. Sua bolsa-sanduíche foi transformada
em co-tutela, o que lhe renderá título reconhecido
no Brasil e na França. Valeu muito a pena, avalia
a estudante.
Também não teve problemas com a língua o grupo
de cinco estudantes do Instituto de Astronomia, Geofísica
e Ciências Atmosféricas coordenado pelo professor Ramachrisna
Teixeira, que tem sua base de estudo e pesquisa na unidade do IAG
em Valinhos. Teixeira diz que se beneficiou do acordo bilateral
durante quatro anos.
Ele mesmo fez estudos para o doutorado na Universidade de Bordeaux,
depois para lá seguiram os alunos, e um deles ainda lá
permanece. Seu projeto tem por objetivo medir o movimento de estrelas
fracas, próximas da Terra. O primeiro passo para dizer
se uma estrela está próxima de nós, ensina
o professor, é medir o movimento. As estrelas com grandes
movimentos têm de estar próximas de nós. O segundo
passo é medir a distância. A França, embora
tenha tradição de excelência na astronomia,
não possui grandes observatórios. Estes estão
no Chile; lá existem cinco gigantescos, três norte-americanos
e dois europeus. Cada observatório dispõe de vários
telescópios, de tamanhos variados. Recentemente entraram
em funcionamento dois telescópios para os quais o Brasil
contribuiu financeiramente e tem direito a uso por determinado tempo
por ano. Um deles é o Gemini, de 8 metros de diâmetro,
que dá aos astrônomos brasileiros o direito de observação
por uma semana ao ano. Em outro telescópio o tempo brasileiro
é um pouco mais dilatado: quatro meses por ano. A disputa
por um lugar nesses equipamentos é acirrada, mas nem por
isso Teixeira desiste de conseguir os seus momentos. Só que,
em razão da automação dos telescópios,
o trabalho do observador se realiza, não no alto da cúpula,
com um horizonte de abranger lonjuras do deserto de Atacama, mas
em computador instalado em recinto fechado e nada romântico.
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Nahon:
elogios à pesquisa do Brasil |
Schmidt:
avanços notáveis |
Além da língua, outros pequenos problemas foram lembrados
pela parte brasileira do acordo. A professora Suely apontou conflitos
entre a legislação brasileira e a prática francesa
relativamente à composição de bancas
aqui com número ímpar de integrantes, lá, par.
A proposta da pró-reitora é que se invista na flexibilidade
e se respeitem as especificidades de cada país. Suely também
fez críticas a algumas exigências, a seu ver indevidas,
da parte francesa, como no caso de cobrança da taxa
de bancada: para o aluno brasileiro desenvolver sua pesquisa
na França, a universidade de origem se responsabiliza pela
taxa de seguridade; no acordo de co-tutela o aluno fica isento.
No entanto, segundo a professora, os franceses estão exigindo
dos brasileiros o pagamento dessa taxa e ainda querem que a universidade
de origem pague a parte do aluno francês no Brasil. É
um retrocesso, diz.
Alguns expositores lamentaram o número menor, comparado com
o do Brasil, de estudantes franceses que vêm por intermédio
do programa; e reclamaram do excesso de burocracia e da lentidão
dos processos. A resposta francesa foi que é necessário
divulgar melhor, no exterior, o avanço do Brasil no campo
da pesquisa científica e fazer o País mais conhecido
lá fora.
De acordo com o professor Benício Schmidt, as bolsas da colaboração
com a França têm duração de dois anos,
renovável. Os recursos para cobrir o custeio básico
dos estágios, ou verba mobilidade, provêm da Capes
e do Cofecub, mas os recursos necessários para as pesquisas
propriamente ditas devem ser buscados nas agências de financiamento,
como CNPq, Finep e Fapesp. Nada impede que universidades privadas
participem da cooperação bilateral, desde que na liderança
do programa esteja uma instituição pública.
Nos casos em que as pesquisas resultam em produtos e haja necessidade
de assegurar patentes, tudo é administrado de acordo com
as legislações dos dois países conveniados.
Se no início do acordo Capes-Cofecub as ciências humanas
tinham precedência, logo o interesse dos dois países
atingiu também a agricultura, as ciências biológicas,
a área das comunicações e de energia. Na agricultura,
ainda de acordo com o coordenador-geral de Cooperação
Internacional da Capes, a grande beneficiada tem sido a Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
Nos 25 anos de vigência do acordo Brasil-França, foram
implementados os seguintes projetos: lingüística, letras
e artes: 19; ciências da saúde: 24; ciências
agrárias: 35; ciências sociais aplicadas: 40; ciências
biológicas: 58; ciências humanas: 78; engenharias:
87; ciências exatas e da terra: 141.
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