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o dia 2 de maio, o diretor de Avaliação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Renato Janine Ribeiro – professor do Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP –, defendeu, em entrevista ao Jornal da USP, que a reforma do ensino deve começar pela universidade, e especificamente pela pós-graduação. É ela, justificou, que vai formar os docentes do ensino superior, que por sua vez são responsáveis pela formação dos professores dos níveis básicos. “De que valerá o diploma se esse professor não tiver uma formação boa na sua universidade, que, por sua vez, depende em larga medida de haver professores com mestrado e doutorado?”, questionou Janine, que naquele dia fez uma palestra ao Conselho Universitário da USP.

“Acho que não é ou um ou outro”, responde o professor Franco Maria Lajolo, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP e integrante da comissão do Conselho Universitário encarregada de redigir um documento da Universidade sobre o ensino superior no Brasil (leia o texto abaixo). “Devemos desenvolver o ensino em todos os níveis, sem o que a democratização do acesso e a qualificação dos recursos humanos para as tarefas do desenvolvimento social e tecnológico necessárias ao País não serão possíveis.”

Para o professor, é patente a necessidade de melhorar a formação de professores dos níveis básicos, mas também é preciso prover “uma avaliação qualitativa mais conseqüente de todo o sistema, principalmente do privado, com real possibilidade de fechar instituições e cursos inadequados”. “A universidade não vive no vácuo. O seu projeto deve ser construído olhando em volta, deve estar articulado com outros níveis de ensino e deve ser pensado dentro de um projeto de desenvolvimento tecnológico e social, global e regional, articulado com sistemas de fomento”, enfatiza.

Contribuição da USP

A USP já tem diversos programas voltados para a formação de professores que atuam no ensino fundamental e médio, diz a pró-reitora de Pós-Graduação, Suely Vilela. “A Faculdade de Educação, por exemplo, tem mestrado e doutorado consolidados com conceito 6 na Capes (considerados de alto nível) que oferecem formação continuada para esses docentes”, cita a pró-reitora. São programas em áreas como Filosofia da Educação ou Linguagem e Educação, que têm grande procura por professores de outros Estados. Embora não saiba estimar quantos docentes formados nas universidades públicas atuam no sistema escolar, Suely Vilela diz que “a contribuição da USP nessa área é bastante significativa”.

Para se ter uma idéia da gravidade dos problemas nos níveis básicos da educação brasileira, pode-se olhar para os números apresentados por Márcio Pochmann, professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e ex-secretário de Emprego da Prefeitura de São Paulo na gestão de Marta Suplicy. Para ter 80% de seus jovens entre 15 e 17 anos matriculados no ensino médio em 2020, o Brasil terá de investir na inclusão de 4,9 milhões de jovens, na abertura de 50 mil escolas e na contratação de 300 mil professores. São números impressionantes para um País onde atualmente apenas 34% da população nessa faixa etária freqüentam os bancos escolares nas séries adequadas à idade. Em palestra que proferiu na Unicamp na última quarta-feira, Pochmann afirmou que, considerados os investimentos necessários para se alcançar padrões intermediários ou avançados em áreas como saúde, transporte e outras – exemplos do que chamou de dívida social acumulada no País –, seria preciso aplicar R$ 7,2 trilhões nesse período.

Massa crítica

Em sua palestra ao Conselho Universitário, no dia 2, Renato Janine Ribeiro discorreu sobre os procedimentos da Capes para torná-la mais eficiente na avaliação dos programas da pós-graduação brasileira. Uma das idéias em discussão é a extinção dos doutorados que mantenham conceito 3 – ou seja, considerados fracos – em duas avaliações consecutivas da agência. Dos 220 programas de pós da USP examinados pela Capes, 28 tiveram conceito 3 na última avaliação trienal, de 2001 a 2003. O número caiu em relação à avaliação anterior (de 1998 a 2000), quando totalizava 40. “A USP já tem desde 2002 uma norma clara de que programas que tenham só mestrado com conceito 3 não podem abrir doutorado”, diz a pró-reitora Suely Vilela.

Cursos avaliados com conceito 3 e 4 na USP são acompanhados por uma comissão que analisa seu progresso. “‘Incubamos’ esse curso como área de concentração de outro programa até que ele venha a formar massa crítica, produção significativa e fluxo regular de alunos. No momento em que voltar a apresentar essas características, pode ser novamente um programa individual”, explica Suely. Um exemplo ocorreu na Faculdade de Odontologia, em São Paulo, em que seis programas com conceito 3 foram transformados num só, o de Ciências Odontológicas, com áreas de concentração como Endodontia e Odontopediatria. Na mesma linha, a Faculdade de Medicina também apresentou uma proposta, ainda em análise, de condensar alguns programas num novo, que seria o de Ciências Médicas.

No último triênio, a Capes avaliou 220 programas da USP, e tanto os de conceito 3 quanto os de 4 decresceram comparando-se com a avaliação anterior (de 40 para 28 e de 74 para 56, respectivamente). Com conceito 5, são 81 programas (contra 71 no triênio anterior); 35 com conceito 6 (contra 20), e 20 com conceito 7 (contra 17).


 

 

Comissão ainda trabalha em texto sobre o tema

Na USP seguem os trabalhos da comissão formada pelo Conselho Universitário para formatar o texto que será divulgado como contribuição ao debate público sobre o ensino superior no Brasil. Um dos eixos do documento será a defesa de mudanças mais amplas no cenário educacional brasileiro, abrangendo os sistemas fundamental e médio, e não apenas o superior. “A forma mais justa e radical de enfrentar os problemas da universidade é melhorando a educação básica, para que os alunos cheguem bem formados”, acredita a pró-reitora de Graduação da USP, professora Sonia Penin. “Mudanças no ensino médio são fundamentais, pois não podemos construir um sistema forte começando pelo teto e sem pensar nas estruturas de base.”

O Ministério da Educação (MEC) deve divulgar nesta semana a segunda versão do anteprojeto da reforma universitária, já contendo alterações na proposta inicial, divulgada em dezembro de 2004, a partir das sugestões encaminhadas por instituições ligadas ao ensino superior no País. O novo texto também será submetido a um período de debate, e a intenção do governo é encaminhar a terceira versão ao Congresso Nacional no início do segundo semestre.

 

 

 

 

 

Os resultados do Enade

O MEC divulgou recentemente os resultados do Exame Nacional de Avaliação e Desempenho dos Estudantes (Enade), realizado em novembro do ano passado. Foram avaliados pouco mais de 140 mil estudantes do primeiro e último anos de 2.184 cursos de instituições públicas e privadas em todo o País. De acordo com o MEC, o Enade constatou que o melhor desempenho – as notas 4 e 5 – estão com estudantes das universidades federais e que as instituições mais bem avaliadas estão nas regiões Sul e Nordeste.

A USP e a Unicamp não participaram do exame em 2004. Para a pró-reitora de Graduação, Sonia Penin, o Enade foi concebido fora da colaboração com os sistemas. “A avaliação do rendimento foi feita com adesão extrema a um projeto das universidades federais, enquanto esqueceu-se que os sistemas estaduais já fazem avaliação institucional por imposição da lei”, diz.

O Enade e outras formas de medir o desempenho dos alunos dos níveis médio e superior foram criticados no recente workshop sobre a reforma universitária promovido pelo Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP. O professor Otaviano Helene, docente do Instituto de Física e ex-presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais do MEC (Inep), disse que a grande utilidade de um sistema de avaliação “é permitir o estabelecimento de políticas que venham a corrigir os problemas detectados”. “Entretanto, e infelizmente, não é esse o caso do Brasil. Parece que, como um Narciso às avessas, ficaremos a contemplar a feiúra de nosso sistema educacional sem intervir, até sermos inteiramente consumidos”, afirmou.

Para o professor Franco Lajolo, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP, “a avaliação dos egressos é importante e deve ser feita na USP de acordo com os nossos objetivos educacionais para que se mantenha e se expanda o nível de qualidade”. Participar de avaliações externas, diz o professor, é perfeitamente aceitável – “desde que possamos participar da sua construção e da definição clara de seus objetivos”, defende.

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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