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A nova versão do anteprojeto da reforma universitária foi divulgada pelo governo federal no dia 30 de maio, mais de um mês depois do prazo previsto inicialmente. O primeiro texto, apresentado em dezembro do ano passado, recebeu 121 proposições de alterações.

O novo texto inclui uma seção para os sistemas estaduais de ensino – ausentes na primeira versão –, na qual o artigo 29 determina que “a União poderá participar no financiamento das instituições de educação superior estaduais e municipais que com ela celebrarem convênios ou consórcios públicos, com o compromisso de aumento da oferta de vagas e de qualificação dos cursos e programas”. Para Candotti, se der certo a proposta de converter em educação as dívidas dos Estados com a União, “estaremos dando um grande passo na direção de maior qualidade do ensino no País”. Um dos pontos que necessitam de revisão, diz, é a necessidade de fixar critérios que liguem o financiamento a mecanismos de avaliação.
Essa brecha para conversão de dívidas de Estados e municípios motivou uma pequena polêmica entre o secretário de Política Econômica da Fazenda, Bernardo Appy, e o ministro Tarso Genro. Para o primeiro, “tornar viáveis despesas públicas em troca de dívida não é um tipo de política adequada”. Já o ministro da Educação preferiu não prolongar o debate, limitando-se a dizer que a reforma “é um todo harmônico de alta qualidade, que não se presta a discussões laterais”.

Particulares

Entidades de docentes ligados ao ensino público criticaram o MEC devido à retirada de artigos que aumentariam o controle sobre as instituições privadas, o que foi considerado uma vitória da mobilização das escolas particulares – que criaram, em fevereiro, o Fórum Nacional da Livre Iniciativa na Educação. O Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN) emitiu documento criticando duramente a segunda versão do anteprojeto, afirmando que o texto faz uma opção “pelo setor privado e pelas demandas dos mercadores da educação”. O Andes-SN também qualifica como retrocesso a criação de cursos de pós-graduação stricto sensu profissionais e de cursos a distância.


Nunes: Falha no essencial
Pesquisadores e professores destacam a definição de porcentuais mínimos de mestres e doutores no corpo docente das universidades (o artigo 18 exige um terço do corpo docente em regime de tempo integral ou dedicação exclusiva, majoritariamente com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado; e metade do corpo docente com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado, sendo pelo menos metade destes doutores).

Ressalvam, entretanto, que o prazo dado pelo texto para a criação de cursos de mestrado (seis anos a partir da promulgação da lei) e doutorado (oito anos) dá chance para que instituições que, pela legislação vigente, já deveriam estar próximas desses porcentuais “estiquem” o prazo para alcançá-los.
Gabriel Mario Rodrigues, reitor da Universidade Anhembi-Morumbi e presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior, acredita que a queda de algumas exigências junto às mantenedoras foi um avanço do projeto. “A conceituação do ensino privado não pode ser a mesma do ensino público. São estruturas diferentes”, afirma. Rodrigues elogia a abertura do MEC para o diálogo e aposta que a versão definitiva do texto “será melhor”. Durante este mês, o governo seguirá promovendo rodadas de debate sobre o anteprojeto, que deve passar por novas alterações até ser encaminhado ao Congresso Nacional – o que, na previsão do MEC, ocorrerá depois do recesso parlamentar de julho.

Avaliação

Para o professor João Palma Filho, diretor do Instituto de Artes da Unesp e integrante do Conselho Estadual de Educação, “de um modo geral a segunda versão está bem melhor do que a primeira”. “É importante ressaltar que de fato o MEC levou em consideração muitas das sugestões feitas pela comunidade científica e pelas universidades estaduais paulistas”, avalia Palma, que vem se dedicando ao tema na Unesp.
O professor diz que o texto define melhor as finalidades da educação superior e elogia a mudança para a possibilidade (não a obrigação) de que as universidades criem cursos de menor duração voltados para formação geral. “É necessário romper com o preconceito que existe contra a educação a distância, pois é possível fazê-la com qualidade”, afirma. João Palma Filho cita ainda como avanços a retirada de artigos considerados inconstitucionais – como a própria USP havia apontado – e a melhor definição da reserva de vagas para egressos de escolas públicas (leia o texto abaixo).
Entretanto, é necessário, em sua opinião, deixar mais claro quais artigos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) são alterados ou mesmo revogados com o novo texto. “Defendo que a reforma do ensino superior fosse incorporada à LDB, para que tivéssemos uma única lei geral para a educação. Embora alguns artigos do ensino superior continuem na LDB, fica evidente que a maior parte dos artigos relacionados a ele estará na Lei de Educação Superior (o atual anteprojeto), e desse modo a LDB ficará reduzida, na prática, à educação básica”, pondera. “Considero essa forma inadequada, pois dificulta a articulação dos dois níveis.”
Para o pró-reitor de Pesquisa da USP, professor Luiz Nunes de Oliveira, a proposta “continua falha no que é essencial: não deixa transparecer uma visão clara de qual é a universidade que a sociedade brasileira gostaria de ter daqui a dez ou quinze anos”. O ideal, defende, é que o projeto defina metas e objetivos para o ensino superior dentro de uma visão estratégica, cabendo a cada instituição trilhar o caminho para chegar lá. “Essa visão ninguém constrói por decreto, é um projeto que demanda um grande debate”, aponta. Um exemplo que poderia ser seguido, de acordo com o pró-reitor, é o modelo da Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia, realizada em 2001 e que terá nova edição no próximo mês de outubro. “A conferência teve excelentes resultados. Uma discussão semelhante seria mais ampla e muito frutífera”, acredita.
O professor cita outros temas que o preocupam. “Não vi nenhuma definição sobre os processos de avaliação na graduação. Quem vai fazer isso, e como? A palavra pesquisa também praticamente não aparece no texto. Como será feita a avaliação da pesquisa na universidade?”, pergunta. Essas preocupações foram externadas a representantes do MEC em debates realizados na USP no primeiro semestre, mas não foram contempladas no texto, diz Nunes de Oliveira.
Uma comissão formada no Conselho Universitário da USP está encarregada de produzir um documento com a visão da Universidade sobre o ensino superior no País. De acordo com o pró-reitor, o grupo enfrentou dificuldades porque estava aguardando a nova versão do anteprojeto do MEC e deve, agora, intensificar o trabalho.



Metade das vagas para alunos de escolas públicas

Leia a seguir alguns dos itens da segunda versão do anteprojeto de reforma universitária do MEC.

Acesso – Até 2015 todas as instituições federais devem ter pelo menos 50% das vagas ocupadas por alunos da rede pública, inclusive cotas para afrodescendentes e índios. As instituições federais devem oferecer pelo menos um terço de seus cursos e matrículas de graduação à noite. O sistema federal deve cooperar com os estaduais para assegurar pelo menos 40% das vagas para egressos do ensino público, podendo firmar consórcios e parcerias com Estados e municípios para criação de novos estabelecimentos.

Assistência estudantil – Pelo menos 5% da verba de custeio das federais devem ser investidos em benefícios aos alunos carentes, por meio de bolsa de fomento, moradia, restaurante, auxílio-transporte e outros. A Caixa Econômica Federal poderá realizar loteria com renda destinada a programas estudantis.

Rede particular – Caem os artigos que tratavam dos conselhos administrativos das universidades particulares. O conselho social de desenvolvimento, de caráter consultivo e presidido pelo reitor, fica mantido para todas as universidades. As instituições que quiserem receber o credenciamento como universidades deverão ter, pelo menos, um doutorado e três mestrados. É mantido o artigo que limita em até 30% o capital total e votante das mantenedoras nas mãos de estrangeiros.

Fundações de apoio – Ficam subordinadas ao conselho superior da instituição, com estatuto referendado por esse conselho e tendo seu plano de trabalho submetido ao Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI).

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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