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A diretora Eni: mais espaço

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 



A
lberto Santos Dumont volta a Paris “e causa o mesmo frisson que despertava entre os franceses com os seus inventos, estilo próprio e inovações há um século”, informa a diretora do Museu Paulista, professora Eni de Mesquita Samara, que acompanhou na capital francesa a abertura, segunda-feira (13), no Museu do Ar e do Espaço de Le Bourget, da exposição “Eu naveguei pelo ar”, composta de objetos, documentos textuais e iconográficos que constituem parte da memória do Pai da Aviação. A mostra, aberta até 20 de setembro, é iniciativa do Ministério da Aeronáutica como parte das comemorações do ano do Brasil na França. O Museu Paulista mandou para Paris 178 dos 1.600 itens da coleção entregue a seus cuidados pela família do construtor do 14 Bis, depois de sua morte em 1932. A curadoria geral da mostra é do professor João Luiz Musa, da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, e da professora Solange Ferraz de Lima na parte referente ao Museu Paulista. A montagem contou com a colaboração do historiador Adilson José de Almeida.

Na inauguração da exposição, patrocinada pela Embraer, Petrobras, Varig e Infraero, contavam-se entre autoridades brasileiras e francesas o vice-presidente José Alencar, o comandante da Aeronáutica Luiz Carlos da Silva Bueno, o embaixador do Brasil na França Sérgio do Amaral, a ministra da Defesa da França Michele Alliot-Marie e o diretor do Musée de L’Air et Espace. No mesmo dia foi aberta a Aero 2005, feira bianual de aviação que atrai milhares de visitantes do mundo inteiro.
A exposição de Paris precede as comemorações, em 2006, do centenário do primeiro vôo de Santos Dumont no “mais pesado que o ar”. A USP prepara-se para a data, destacando-se o projeto do Departamento de Engenharia de Materiais, Aeronáutica e Automobilística, da Escola de Engenharia de São Carlos, de construir uma réplica do 14 Bis, em escala menor, para exposição itinerante na região.

 

Museus em museu

Para a professora Eni Samara, a exposição de parte da coleção Santos Dumont em Paris é importante porque mostra que o Museu Paulista possui uma rica reserva técnica, especialmente em forma de coleções, não disponível rotineiramente ao público. “Expomos apenas 10% do que possuímos”, informa a diretora. “Existem muitos museus dentro do Museu Paulista e uma das coleções é a de Santos Dumont.”

As parcerias com outros museus nacionais, ou do exterior, como neste caso, também servem para divulgar o acervo sob responsabilidade da USP, o cuidado na guarda e preservação do patrimônio cultural e artístico. Neste momento, o museu expõe na Casa de Dona Yayá a coleção Carlos Eugênio Nascimento, sobre mulheres de elite, suas vestimentas, objetos de uso dos séculos 19 e 20. “As pessoas nem imaginam que isso exista no Museu Paulista”, comenta a diretora. Do mesmo modo, afirma que muitas pessoas se surpreenderam ao saber que o museu tem a coleção Santos Dumont, tornada pública graças a uma atividade mensal de divulgação chamada “Museu Oculto”, que mereceu a atenção da imprensa paulista e mostrou em primeiro lugar uma peça do escultor Eugênio Rodin, assinada e dedicada ao seu amigo brasileiro.

O Museu Paulista trabalha com exposições permanentes e temporárias. Segundo Eni, não dispõe de espaços adequados para as mostras temporárias. No prédio de 6 mil metros quadrados de área estão guardadas as reservas técnicas e funcionam os serviços administrativos. As áreas expositivas são poucas. O ideal e a prioridade da diretora é conseguir um anexo, que receberia as reservas técnicas, a administração, os serviços de restauro e fotográficos, entre outros. O edifício principal se destinaria apenas a exposições. “A magnitude do espaço sugere melhor aproveitamento do que simplesmente guardar reservas técnicas e administrar o museu”, diz a diretora, acrescentando que já fez um mapeamento da região e encontrou terrenos adequados bem próximos da sede. “Daria para ir a pé.”



Perfil

Voltando a Santos Dumont, a diretora informa que o acervo do pioneiro da aviação foi parcialmente exposto pela primeira vez em 1936, quando o museu era
dirigido por Affonso de Escragnolle Taunay, logo depois da doação do acervo pela família Dumont. O material abrange várias facetas do inventor, desde roupas e objetos de uso pessoal, livros, cartas, fotografias, até instrumentos que têm a ver com sua arte inventiva.

De acordo com a historiadora Heloisa Barbuy, “Santos Dumont condensou em si todos aqueles atributos que definiam o homem moderno: dos feitos aeronáuticos ao modo de vestir, em tudo se identificava com o dinamismo, a novidade, o refinamento estético que marcavam os valores de seu tempo. E a coleção do Museu Paulista revela diferentes aspectos, todos interligados, dessa figura que em tudo transpira modernidade. Motores, ferramentas, instrumentos de desenhos e um sem-número de apetrechos para concepções e experimentações aerostáticas e vários inventos de uso cotidiano, dão a medida do indivíduo inquieto, sempre em busca de soluções práticas, em permanente atividade. Um modo de ser não contemplativo”.

Ainda de acordo com o perfil traçado por Heloisa: “O terno risca-de-giz, o chapéu panamá, as pastas de couro deixam ver o dândi, seguindo ou lançando moda.” Entre os amigos famosos, Santos Dumont contava, além de Rodin, com o joalheiro Cartier, nada mal para quem inventou o relógio de bolso. “Esquis, tacos de golfe, maiô para banhos de mar em Biarritz o delineiam afeito aos esportes de elite. Medalhas de São Cristóvão e souvenirs de Lourdes revelam a faceta íntima do devoto, talvez a menos conhecida”, acrescenta a historiadora.

De graça

O Museu Paulista não teve despesas com a cessão de parte do acervo de Santos Dumont para a exposição de Paris. “Somos parceiros convidados. Os franceses pagaram tudo, inclusive o seguro e o courrier” (pessoa que acompanha o transporte das peças). Não só isso. Eni espera que a parceria com os franceses traga experiência e novos acordos. “Eu gostaria de promover no Museu Paulista ou em outro local, junto com outras instituições brasileiras, uma grande exposição sobre Santos Dumont”, sonha a diretora. Trazer para o Brasil a exposição agora aberta em Paris é uma das hipóteses que ela levanta.

Eni Samara ainda se refere a um episódio pouco agradável, a disputa com a Aeronáutica por peças da coleção Santos Dumont. É que em 1956 o museu da USP fez um empréstimo de 160 itens para a exposição comemorativa que daria origem ao Museu de Aeronáutica da Fundação Santos Dumont. Muitos anos e muitas idas e vindas depois, o material continua com a Aeronáutica, que não abre mão dele. Embora empenhada na recuperação daqueles itens, a diretora do Museu Paulista reconhece que a diretoria da época não tomou os devidos cuidados para garantir a devolução, não havendo nenhum documento-recibo assinado. Mesmo que a instituição consiga retomar o que cedeu por empréstimo, a professora diz que não haveria local disponível para guardá-lo.

Independentemente da disputa, os museus Paulista e da Aeronáutica, a Fundação Santos Dumont, a Fazenda Cabangu (no atual município Santos Dumont, em Minas Gerais, onde o pioneiro da aviação nasceu) e o Museu do Ar e do Espaço da França estão unidos na homenagem ao brasileiro que primeiro decolou por seus próprios meios. O Museu Paulista não se esquece de manifestar gratidão à família de Santos Dumont que, além de doar a coleção do parente famoso, acompanha continuamente a preservação do acervo.


Como se fosse hoje

Uma contribuição preciosa para as comemorações do centenário do primeiro vôo de um engenho mais pesado que o ar deve ser creditada a dois professores da USP: João Luiz Musa, da ECA, e Marcelo Breda Mourão, da Escola Politécnica, e, ainda, ao designer gráfico Ricardo Tilkian. Eles publicaram pela Editora Nova Fronteira a obra Alberto Santos Dumont: Eu naveguei pelo vento, uma edição de luxo que recupera, em texto e fotografia, momentos históricos do inventor brasileiro na França. Lá estão os vôos em balão, inclusive em torno da Torre Eiffel, e no 14 Bis, e ensaios em bote a motor, sempre observados por um público atento às novidades. Musa, além de fotógrafo, é formado em engenharia pela Poli, tem doutorado em poesia visual e dá aulas no Departamento de Artes Dramáticas da ECA desde 1984. Breda é engenheiro metalúrgico, tem título de doutor e fez pós-doutorado no MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), Estados Unidos. Tilkian graduou-se em comunicação visual no Mackenzie.

Outra unidade da USP em que se estuda engenharia e se preparam programas em homenagem a Santos Dumont é a Escola de Engenharia de São Carlos. Atarefado no túnel de vento, onde faz testes de aerodinâmica para a réplica do 14 Bis – que precisa ficar pronta para a exposição itinerante do próximo ano, se a proposta for aprovada pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária –, o professor Fernando Catalano enfatiza a originalidade do inventor nascido em Minas Gerais, o primeiro a falar em transporte aéreo, em linhas regulares e em dirigíveis de vôo controlado. O que Júlio Verne imaginou, o seu admirador se pôs a executar.

É também de Catalano a informação de que restos do 14 Bis se encontram em Cotia, São Paulo, integrando o Museu da Aeronáutica. O que o professor considera inútil é a discussão em torno de quem tem a primazia do primeiro vôo, se Santos Dumont ou os irmãos Wright, norte-americanos. Mas não deixa de dar a sua opinião, assegurando que o primeiro vôo completo, com o aparelho decolando por seus próprios meios, foi do brasileiro. Quando conseguiram vôo semelhante, em 1908, os americanos já tinham sido influenciados pela tecnologia de Santos Dumont. Na opinião do professor, os brasileiros fariam bem se pensassem em cultivar e preservar a memória do pioneiro nacional, em vez de ficar discutindo o mérito dos irmãos Wright

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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