A novidade do 6O Prêmio USP de Direitos Humanos,
que será entregue nesta sexta-feira (9), às 17 horas,
na sala do Conselho Universitário, é que, além
da premiação principal nas categorias individual e
institucional, também conferirá Menção
Honrosa a duas personalidades em cada uma dessas categorias. Os
vencedores do prêmio maior são o padre Jaime Crowe
(Individual), que há 13 anos atua no Jardim Ângela,
periferia sul de São Paulo, e a Organização
Não-Governamental Viva Rio (Institucional), presente em cerca
de 350 favelas cariocas e comunidades de baixa renda; as Menções
Honrosas na categoria Individual vão para o advogado gaúcho
Ari Antonio Keck, que trabalha com deficientes físicos, sendo
ele um deles, e o desembargador Siro Darlan, juiz da Vara da Infância
e Juventude do Rio de Janeiro, desenvolvendo projetos com menores
infratores; na categoria Institucional, para a Universidade da Amazônia
(Unama), campus Alcindo Cacela, de Belém (PA), por seu projeto
de extensão Liberdade Assistida, programa de educação
para menores infratores; e os Doutores da Alegria Arte, Formação
e Desenvolvimento, de São Paulo, grupo de artistas que visita
hospitais para descontrair crianças internadas.
Os vencedores do Prêmio USP de Direitos Humanos recebem diploma
e um troféu; a Menção Honrosa dá direito
a diploma e medalha. A solenidade de entrega é tradicionalmente
presidida pelo reitor; este ano, pela primeira reitora da USP, professora
Suely Vilela. De acordo com a presidente da comissão que
organiza o prêmio, professora Maria Luiza Marcílio,
embora na premiação não estejam envolvidos
valores materiais, o interesse e o número de inscrições
vindas de todo o País são grandes cerca de
200 por versão. Os trabalhos sugeridos costumam ser de excelente
nível, dificultando sobremaneira a definição
dos melhores. Esta é uma das razões pelas quais a
Comissão de Direitos Humanos sugeriu a categoria Menção
Honrosa, presente pela primeira vez desde a criação
do prêmio, em 1999, pelo então reitor Jacques Marcovitch.
Na primeira versão, uma das personalidades premiadas foi
a médica Zilda Arns, presidente da Pastoral da Criança
que atua em treze países, depois indicada por três
vezes consecutivas pelo governo brasileiro (Fernando Henrique Cardoso
e Luiz Inácio Lula da Silva) para o Nobel da Paz.
Jardim
Ângela
O padre Jaime Crowe, irlandês da Sociedade São Patrício,
que mantém um seminário no bairro de Santana, veio
ao Brasil em novembro de 1969 e desde 1986 lidera movimentos sociais
no Jardim Ângela, extremo sul da capital paulista, distrito
da Subprefeitura do MBoi Mirim, apontado no ano 2000 pela
Organização das Nações Unidas (ONU)
como o lugar mais violento do mundo. O título resultava de
uma taxa anual de 116,23 assassinatos para cada 100 mil habitantes,
índice que subia para 200 quando calculado apenas sobre a
população masculina entre 15 e 25 anos. São
dados do Mapa da Exclusão Social, organizado por pesquisadores
da PUC paulista e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
A região também liderava os índices de mortalidade
materna e infantil, sendo que esta apresentou aumento de 40% entre
os anos de 1994 e 1999.
A reação da comunidade começou no início
da década de 80 com a criação do Serviço
Social Bom Jesus, que atualmente reúne mais de 200 profissionais
e uma centena de voluntários que atuam em parceria com outras
instituições, como a Unicef/Unesco e o Instituto Sou
da Paz, que atendem a mais de 5 mil pessoas, oferecendo opções
de lazer, cultura, esporte e cursos profissionalizantes. Vieram
em seguida o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente,
que ensina panificação e informática, e a Casa
Sofia, coordenada pelo padre Jaime e que atende mulheres vítimas
de violência.
Outra organização liderada pelo padre irlandês
é a Sociedade Santos Mártires que, em 1996, criou
o Fórum em Defesa da Vida, que reúne 200 entidades
que atuam na região. No ano seguinte foi a vez da Unidade
Comunitária de Álcool e Drogas que, com a colaboração
da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), trata de
dependentes dessas drogas. O projeto mais recente da comunidade
do Jardim Ângela e da paróquia Santos Mártires,
onde o padre Jaime trabalha, é uma parceria com o governo
para gerar empregos para os jovens e aqueles que já os perderam.
O fato é que as ações coordenadas envolvendo
líderes comunitários, religiosos, Prefeitura, Estado
e universidades conseguiram reduzir drasticamente a violência
e reduzir a níveis muito baixos os índices de criminalidade
na região.
Sobre o prêmio que receberá da USP nesta sexta-feira
em nome de sua comunidade, o padre Jaime Crowe diz que representa
um incentivo especial para continuar o trabalho na periferia em
favor de melhores condições de vida para a população.
Não é o seu primeiro contato com a USP. Sempre
fizemos parte da luta do NEV (Núcleo de Estudos da Violência)
e fazemos reuniões com alunos e palestras para grupos da
Universidade, disse e concluiu: Acho importante educar
para a paz e a USP faz isso pelo Brasil.
O
desarmamento é um ponto fundamental na luta da ONG Viva Rio
pelos Direitos
Humanos
Viva
Rio
A ONG Viva Rio nasceu em 1993 como resposta da comunidade ao assassinato
de oito meninos na escadaria da Igreja da Candelária e à
chacina de 21 pessoas em Vigário Geral. O clima no Rio de
Janeiro era de medo e indignação. A resposta veio
na forma de uma mobilização em toda a cidade e no
dia 17 de dezembro daquele ano milhares de pessoas vestidas de branco
fizeram dez minutos de silêncio e pediram paz. Desde então,
o Viva Rio incentiva pessoas, associações e empresas
a construir uma sociedade mais justa, desenvolvendo projetos sociais
em cinco áreas: direitos humanos e segurança pública,
desenvolvimento comunitário, educação, esportes
e meio ambiente.
Entre os projetos mais visíveis destacam-se o Acelera Jovem,
que atende crianças com atraso na escola, tanto em idade
como nas séries, e jovens que abandonaram a escola antes
de completar o ensino fundamental, com a colaboração
da Secretaria da Educação e da Fundação
Roberto Marinho; o Crianças e Jovens em Violência Armada
Organizada, que luta para tirar do meio e recuperar integrantes
de facções de tráfico e gangues. Calcula-se
que 5 mil crianças armadas disputem no Rio a liderança
pela distribuição e venda de drogas. Há ainda
a Campanha de Desarmamento, atuante desde 1993, projeto integrado
a uma rede de ONGs do Mercosul.
O padre Jaime Crowe e a professora Maria Luiza
Marcílio: contra a violência e pelos altos valores
Para o diretor-executivo do Viva Rio, Rubens César Fernandes,
com a criação do Prêmio USP de Direitos Humanos
a Universidade de São Paulo reafirma fortemente o conceito
de direitos humanos como prática e ação concreta,
pois sem isso a palavra não passaria de linguagem angelical.
A própria ONG, doze anos depois da fundação
e ainda sob o impacto da derrota na campanha contra a venda de armas
no referendo nacional, está num momento de reavaliar o conceito
e entendê-lo no contexto internacional. A pergunta-chave,
segundo o diretor, é esta: por que os direitos humanos são
prevalentes nos discursos do sistema internacional, como a ONU,
suas agências, as ONGs e os pronunciamentos diplomáticos,
ao mesmo tempo que esses mesmos direitos humanos sofrem forte desgaste
no mundo inteiro, como se não fosse possível incorporá-los
ao dia-a-dia das administrações? Ainda segundo Fernandes,
direitos humanos é conceito-chave desde quando o mundo vive
sob o impacto da Segunda Guerra Mundial e da vitória contra
o nazismo, mas precisa ser reavaliado, pois não está
acompanhado da prática, constituindo verdadeiro desafio quando
se trata de estabelecer políticas para os mais pobres.
O diretor entende que a ONG que administra trabalha com um
pé no Rio, outro voando, até internacionalmente,
e conseguiu abrir um horizonte para superar a violência com
propostas bem pragmáticas. Quando o ambiente parece
sem saída, dominado pela desigualdade social e pela violência,
é importante abrir perspectivas, sem usar de linguagem de
guerra, e isso o Viva Rio está conseguindo.
Inscrições
As inscrições para a sétima versão do
Prêmio USP de Direitos Humanos já estão abertas,
avisa Maria Luiza Marcílio. Podem ser feitas pela internet
(www.direitoshumanos.usp.br)
ou por carta para o Centro Universitário Maria Antonia (
Rua Maria Antonia, 294, 01222-010, Vila Buarque, São Paulo),
endereçada à professora. Os nomes (nas categorias
Individual ou Institucional) podem ser indicados pelo próprio
candidato ou por terceiros. Estão excluídas do prêmio
pessoas que têm vínculo com a USP.
De acordo com Maria Luiza (autora de alentado volume com o título
História da escola em São Paulo e no Brasil), ao criar
o Prêmio USP de Direitos Humanos, a idéia que norteou
o professor Jacques Marcovitch era criar, para além da excelência
do ensino e da pesquisa, valores para os jovens, os professores
e a sociedade.
Em
nome da dignidade humana
Museu
da Tolerância define projeto e procura recursos para
ficar pronto até 2007
O
Museu da Tolerância a ser construído até
2007 na Cidade Universitária, em frente do prédio
de História e Geografia, será um espaço
de reflexão e pesquisa sobre todas as formas de discriminação
das minorias, de todos os tempos e de todos os lugares, da
Bíblia ao século 20. De acordo com a historiadora
Anita Novinsky, idealizadora da obra, os pesquisadores encontrarão
no acervo da instituição seções
dedicadas a questões raciais, escravidão humana,
minorias étnicas, negros, índios, holocausto,
inquisição, exploração da mulher
e toda forma de violência física, moral ou religiosa
contra a pessoa. O museu tem por objetivo transmitir
o sentido da tolerância, lutar pela paz, liberdade e
convivência pacífica dos povos e estará
aberto a todos os brasileiros e visitantes do mundo inteiro,
disse Anita na cerimônia de premiação
dos projetos arquitetônicos vencedores, escolhidos em
concurso público nacional, dia 24 de novembro na 6a
Bienal Internacional de Arquitetura. Entre 173 inscritos,
obteve o primeiro lugar o dos arquitetos José Alves
e Juliana Corradini. Ele chama atenção por um
detalhe: um vão de 50 metros sem nenhum apoio, que
será a marca do Museu da Tolerância. Em segundo
lugar ficou o projeto de José Maria de Macedo Filho,
e, em terceiro, o do arquiteto Alexandre Brasil Garcia. A
solenidade de premiação teve a presença
do então reitor da USP, professor Adolpho José
Melfi, de dirigentes do Instituto de Arquitetos do Brasil,
e de pesquisadores da Universidade.
A comissão julgadora, formada pelos arquitetos Arnaldo
Antonio Martino (SP), Marcos de Azevedo Acayaba (SP), Jorge
Wilheim (SP), Vasco de Mello (SP) e Antonio Carlos Campelo
Costa (CE), considerou que o projeto vencedor confere singularidade
e beleza à expressão arquitetônica do
museu, destacando-se na paisagem e valorizando a excepcional
localização do terreno.
Anita Novinsky não esconde seu entusiasmo diante do
projeto do Museu da Tolerância, que, segundo ela, será
uma extensão do laboratório de pesquisas sobre
as injustiças da história humana, e constituirá
uma lição ao povo brasileiro e um presente
da USP ao Brasil. Disse que o idealizou inspirada em
modelo existente na cidade de Los Angeles, Estados Unidos,
que atrai milhares de crianças todos os anos. Outro
museu semelhante está sendo construído em Jerusalém,
ao custo de US$ 250 milhões. Não está
ainda definido o custo do museu da USP, mas uma equipe de
arquitetos trabalha na definição das despesas,
provavelmente uns bons milhões de dólares.
Anita está segura de que os recursos virão dos
brasileiros conscientes de que, se não percebermos
a importância de lutar contra a intolerância,
sucumbiremos todos. A historiadora também não
duvida de que o edifício, situado no espaço
mais lindo da USP, vai projetar o Brasil internacionalmente.
A professora Anita Novinsky: um museu para
lutar pela paz
Pesquisa
O museu ocupará área de 5.200 metros quadrados,
terá dez salas temáticas para exposição
permanente, seis salas para exposições temporárias,
biblioteca, auditório, salas para audiovisual e informática,
cinema e restaurante.
A própria professora Anita dará início
à instalação do acervo documental, entregando
ao laboratório do museu grande parte das cópias
manuscritas que conseguiu nos seus quase 40 anos de pesquisa
em centros de Lisboa, Portugal. Grande parte do material refere-se
à Inquisição; no entanto, a sua biblioteca,
de 10 mil volumes, abriga também documentos sobre a
questão judaica em geral, sobre Portugal e Espanha,
Brasil-Colônia, filosofia, sociologia, antropologia
e muitas outras áreas do conhecimento. O Museu
da Tolerância será do povo; o laboratório,
dos acadêmicos pesquisadores, resume. Também
deverão colocar material próprio à disposição
do museu outros professores da USP, como Maria Luiza Tucci
Carneiro e Zilda Yokoi, além de alunos de Anita.
Na fase de implantação, a instituição
não dispensará a colaboração de
museólogos, bibliotecários e intelectuais de
várias áreas, assim como já vem recebendo,
conforme testemunha Anita, o apoio da Reitoria, diretores
de unidades e arquitetos.
|
|