As
atas das mais de 880 sessões realizadas pelo Conselho Universitário
desde a sua criação, em 1934, e que representam um
importante registro de parte da memória da Universidade de
São Paulo. Esse foi o material que deu base para o livro
Autonomia Universitária na USP 1934-1969 (Edusp, 408
páginas, R$ 64,00), primeiro dos dois volumes de uma obra
organizada pela secretária-geral da Universidade, professora
doutora Nina Beatriz Stocco Ranieri, e que teve como pesquisadoras
as funcionárias que integram a Divisão de Assistência
aos Colegiados e o Serviço de Apoio ao Conselho Universitário
e Comissões Permanentes da Secretaria, além da participação
da doutora Marisa Vilarino e de Marlene Dantas, do Setor de Legislação
da Consultoria Jurídica.
Essa foi a primeira experiência da Secretaria-Geral
na realização de atividades-fim da Universidade, no
caso, a pesquisa. As servidoras são responsáveis pela
elaboração das atas do Conselho, mas não tinham
se dado conta da importância histórica desse trabalho,
que é o registro das decisões em um documento formal,
avalia Nina.
Segundo a secretária-geral, a idéia da elaboração
de um livro surgiu a partir da busca de um projeto que valorizasse
o trabalho realizado por essas servidoras e que atuasse como um
elemento de integração entre elas. O trabalho
da Secretaria-Geral é extremamente burocrático. Queria
encontrar algo que elevasse esse trabalho acima da mera burocracia,
do mero registro, que houvesse sentido. E eu posso dizer que, agora,
fazer uma ata adquiriu uma outra importância, considera.
Para a funcionária Edinalva Ferreira Marinho, a compreensão
da importância histórica do trabalho que realiza rotineiramente
só se concretizou quando chegou às suas mãos
um exemplar do livro já editado. O mesmo sentimento teve
Inês Aparecida Vicente de Oliveira, que chegou a desacreditar
que o livro chegasse a ficar pronto. Tive um choque quando
me dei conta do volume de leitura que tinha de ser feito,
afirma.
E não é para menos. O acervo analisado, desde o primeiro
livro da primeira sessão do Conselho, Universitário
em 1934, é composto por mais de 19.500 páginas manuscritas,
datilografadas ou digitadas. Não foi um trabalho simples,
mas elas realmente se saíram muito bem, estima a secretária-geral.
Metodologia
A magnitude dos livros arquivados na Secretaria Geral também
foi responsável por uma mudança do plano previamente
previsto para a publicação. No início,
a minha idéia era encontrar decisões, nas atas do
Conselho, que tivessem influenciado diretamente na formulação
posterior de leis de educação no País,
conta Nina. Entretanto, esse objetivo foi deixado de lado tão
logo a secretária-geral se deu conta da riqueza do material.
Objetivo abandonado, mas não descartado. Essa talvez
seja a continuação do projeto, revela.
Uma análise prévia das atas, entretanto, permitiu
a identificação de um ponto recorrente em todos os
registros: a autonomia universitária. A partir daí,
definiu-se, então, a elaboração de uma obra
de referência que permitisse acompanhar a construção
e evolução do tema na Universidade de forma sistematizada.
Para isso, foi necessário que se estabelecesse uma metodologia
nos trabalhos. Essa metodologia, desenvolvida pela professora Ana
Lúcia Lanna, diretora do Centro de Preservação
Cultural da USP, consistiu no levantamento de um rol de palavras-chave,
sempre com foco na autonomia universitária. A partir
dessas palavras, que foram revistas várias vezes, as funcionárias
liam os livros para procurar conexões, explica a secretária.
Todo o trabalho de pesquisa foi coordenado por Marcos Maurício
Toba, que, pacientemente, como enfatiza Nina, orientou passo a passo
a equipe.
Metodologia aplicada, as pesquisadoras dedicaram uma hora da jornada
de trabalho diária e algumas horas extras no final de semana
durante praticamente um ano para que a publicação
se tornasse uma realidade. Dificuldades no caminho? Sem dúvida,
foram muitas. Entender a letra foi muito difícil,
considera Maria José de Carvalho Oliveira, referindo-se às
atas manuscritas que, para Jurema Lúcia dos Santos, foram
as mais interessantes, por contarem o início da história
da USP.
Um
pouco da história
Desde sessões em que os conselheiros discutiam sobre o uso
da beca até debates sobre temas de repercussão nacional,
as atas do Conselho Universitário, órgão máximo
da Universidade, são documentos essenciais para se entender
o desenvolvimento da USP nesses quase 72 anos de existência.
Durante a pesquisa, conseguimos identificar algumas pautas
de discussão que são comuns até os dias de
hoje, como salários, aposentadoria e benefícios,
cita a secretária geral.
Nina menciona também o posicionamento firme do Conselho durante
o período militar no sentido de manter a autonomia da Universidade,
o que fica muito perceptível nas atas. Especialmente
no começo, o fato de se entender que o governo federal não
poderia ter uma ascendência extrema sobre a USP é que
destacou a Universidade em um conjunto e acredito que é daí
que vem essa cultura da autonomia, explica. Há ainda
alguns casos de sessões secretas, cujas atas foram guardadas
em separado, fora dos livros, e tornaram-se inacessíveis.
Não tivemos como aferir o que se passou nessas sessões,
acrescenta.
Nesse processo, alguns cuidados tiveram de ser tomados. Não
se podia citar nomes, por causa do direito à imagem, à
privacidade. As atas são públicas, mas não
se pode levar ao conhecimento público o recurso de alguém
que perdeu um concurso ou recebeu uma sanção disciplinar,
porque isso pode afetar a imagem, diz Nina. Não
se foca a pessoa, mas a evolução que a Universidade
deu no tratamento de diversas questões jurídicas,
regime disciplinar, carreira docente, decisões que afetavam
a estrutura das escolas, sempre em nível institucional,
conclui.
Além da análise dos 39 livros de atas de 1934 a 1969,
o primeiro volume do livro traz ainda a legislação
estadual e a nacional que incidiram sobre a USP nesse período.
O segundo volume da obra, que abrangerá os anos de 1970 a
2004, também será publicado pela Edusp e já
está no prelo.
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