Nem só de desvendar crimes e combater o banditismo
vive o policial civil. A partir deste mês, os policiais em
formação poderão participar da Mostra
Brasil de Cinema & Debates, uma parceria entre o Centro
de Direitos Humanos e Segurança Pública Celso Vilhena
Vieira, a Academia de Policia Civil do Estado de São Paulo
(Acadepol), o Centro de Estudos da Comunicação Barbarella,
o Unicentro Belas Artes de São Paulo e o Instituto Sou da
Paz. Entre março e maio, uma vez por mês, serão
apresentados os filmes Quase dois irmãos, de Lucia Murat,
Contra todos, de Roberto Moreira, e Os matadores, de Beto Brant,
todos seguidos de debates com especialistas na área (leia
ao lado a programação da mostra). O nosso objetivo
é promover filmes e debates sobre temas sociais, políticos
e de cidadania, enfatizando a valorização e a ampliação
dos direitos humanos, afirma Rosana Martins, coordenadora
do Centro de Estudos da Comunicação Barbarella
um núcleo de estudos que tem a participação
de professores da USP.
Para Tabajara Novazzi Pinto, coordenador do Centro Celso Vilhena
Vieira, a mostra permitirá uma discussão mais democrática
sobre a violência num ambiente em que essa temática
perpassa todas as instâncias. Através do cinema
brasileiro os alunos e o corpo docente da Acadepol, além
da comunidade, poderão discutir temas como violência
cometida pelo e contra o policial, racismo, direitos humanos, desigualdade
racial. Teremos oportunidade de contatar diretamente alguns diretores
ou alguém mais próximo, que explicará a intenção
do filme, criando um espaço de debates, explica.
O Centro de Direitos Humanos e Segurança Pública Celso
Vilhena Vieira foi criado no dia 10 de dezembro de 1997, com o objetivo
de fazer diferença, diz Novazzi. Segundo o coordenador,
a diferença que o centro propõe se dá no treinamento
dos alunos e na qualificação dos professores da academia,
que têm formação em direitos humanos. Quando
os professores dão aulas de armamento e tiro, defesa pessoal
ou investigação policial, eles têm que fazer
isso dentro de um viés de direitos humanos, diz o coordenador.
Hoje, quando fazemos um trabalho de abordagem policial, ou
seja, quando os investigadores abordam um carro para fazer uma busca,
um professor dos direitos humanos da Acadepol acompanha esse treinamento
para apontar onde estão as possíveis violações.
Diálogo
Para o diretor administrativo da Acadepol, Sidney Cardassi, também
delegado, professor e pesquisador na área de Criminologia
e Direito das Relações Sociais, o cinema é
um veículo de formação muito rico. Acredito
que o cinema, o teatro e as artes em geral transmitem ao espectador
uma gama de informações muito grande em diversos assuntos.
Na esfera da atividade policial não é diferente. À
medida que o indivíduo recebe informações diversificadas
daquela do seu cotidiano, ele começa a perceber e a se sensibilizar
para outros aspectos da vida em sociedade.
Para as aulas ministradas na Acadepol o cinema será de grande
contribuição, diz Cardassi. Ele ressalta que, numa
aula expositiva, normalmente se usa a palavra como meio de conscientização
e convencimento e, quando se acrescenta o recurso cinematográfico,
a linguagem visual e sonora enriquece muito mais as informações
fornecidas. O cinema ajuda a tratar as questões de
violência, desigualdade e direitos humanos de forma mais lúdica,
rica e menos cansativa.
Buscar um diálogo mais próximo com a comunidade é
o que a Acadepol tem feito nos últimos anos. Para Cardassi,
essa aproximação pode se dar ainda mais através
da arte, cinematográfica, teatral e audiovisual. Uma
mostra de cinema na Academia de Polícia é muito importante
porque durante muito tempo as artes, de forma geral, nunca foram
muito observadas na atividade policial, observa. Com
essa mostra queremos que tanto policiais como a comunidade em geral
percebam que é possível aprender junto.
Desumano
Eliminar a imagem de policial desumano é o objetivo que o
Centro de Estudos da Comunicação Barbarella propõe
para a Acadepol, que tem procurado se abrir para a comunidade intensificando
as trocas de experiências e informações. Segundo
a jornalista Maria Goretti Pedroso, também coordenadora do
Barbarella, a partir dessa mostra queremos proporcionar uma
formação mais humana e consciente na área dos
direitos humanos.
Novazzi conta que, ao criar o Centro Celso Vilhena Vieira, pensou
num espaço para troca de experiências tanto dos profissionais
que trabalham com direitos humanos quanto os que atuam na segurança
pública. Quero que o centro seja um ponto de encontro
para quebrar o preconceito e olhar receoso de ambas as partes. É
muito comum ouvir as pessoas dizerem que, depois de passar pelo
centro, começaram a ver os policiais com outro olhar. O mesmo
acontece com os policiais que não aceitam muito as entidades
que trabalham com os direitos humanos. Estamos propondo o conhecimento
mútuo e o trabalho integrado, ressalta.
A Mostra
Brasil de Cinema & Debates terá início nesta
terça-feira, dia 7 de março, às 14 horas, na
Academia de Policia Civil do Estado de São Paulo (praça
Reinaldo Porchat, 219, Cidade Universitária, São Paulo).
Mais informações podem ser obtidas pelos telefones
(11) 3813-2233 e 3813-2623.
Novazzi
e Cardassi: a intenção é eliminar a imagem
do policial desumano e intensificar troca de experiências
Filme
de estréia mostra favelas do Rio de Janeiro
Quase
dois Irmãos, de Lucia Murat, é o primeiro filme
da mostra, que acontece no dia 7 de março, às
14 horas, no auditório da Academia de Policia Civil
do Estado de São Paulo (Acadepol). É um retrato
da relação entre a classe média e a favela
carioca, marcada pela música popular e pela história
política recente. Miguel, senador da República,
visita seu amigo de infância Jorge, que se tornou um
poderoso traficante de drogas do Rio de Janeiro, para lhe
propor um projeto social nas favelas. Apesar de suas origens
diferentes, eles se tornaram amigos quando criança,
nos anos de 1950, pois o pai de Miguel tinha paixão
pela cultura negra e o pai de Jorge era compositor de sambas.
Na década de 1970 eles se encontram novamente na prisão
de Ilha Grande. Ali, as diferenças raciais eram mais
evidentes: enquanto a maior parte dos prisioneiros brancos
estava lá por motivos políticos, a maioria dos
prisioneiros negros era de criminosos comuns.
Em abril, ainda sem data agendada, a discussão se baseará
no filme Contra todos, de Roberto Moreira, que trata da relação
de uma família de classe média baixa assentada
na mentira. O marido Teodoro é matador e se passa por
religioso, bate na filha adolescente e tem relação
extraconjugal com a amiga de culto. A esposa Claudia tem um
caso com o filho do vizinho. A história gira em torno
do assassinato do amante de Claudia, levando a um desfecho
chocante.
Em maio, também sem data agendada, será a vez
de Os matadores, de Beto Brant, onde presente e passado se
misturam em torno da morte de Múcio, o pistoleiro mais
competente da região, mostrando que matar ou morrer
é uma fronteira fácil de se atravessar. Um chefe,
uma bela mulher, um serviço a ser feito. O filme testa
os limites da amizade, do medo e da traição.
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