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Mais informações sobre o Projeto Mogi-Guaçu podem ser obtidas na página eletrônica www.projetomogiguacu.
org.br.


O Projeto Mogi-Guaçu está dividido em vários núcleos, que analisam e realizam
ações nas mais diferentes áreas, como educação ambiental, proteção de nascentes,
combate ao uso de agrotóxicos e desenvolvimento do turismo



O rio Mogi-Guaçu, principal afluente do rio Pardo, que nasce no município de Bom Repouso, na Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais, a 1.594 metros de altitude, e percorre dezenas de municípios de Minas Gerais e São Paulo, há anos vem sofrendo com o descaso e o abuso de suas águas e encostas. Contaminação fecal, atividades econômicas de grande impacto, desmatamento irregular, secamento dos riachos, contaminação por substâncias químicas, despejo de esgoto e deposição de lixo são alguns dos hábitos da população local que têm transformado o rio e seus riachos em esgoto a céu aberto.

Para promover ações que contribuam para a redução dos impactos ambientais na bacia hidrográfica da nascente desse rio tão importante, foi criado em 2005 o Projeto Mogi-Guaçu, uma iniciativa do Núcleo de Estudos de Ecossistemas Aquáticos do Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada (Crhea), ligado ao Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia da USP, em São Carlos, e da Fundação para o Incremento da Pesquisa e do Aperfeiçoamento Industrial.

Com recursos obtidos através do Programa Petrobras Ambiental, o projeto – composto por uma equipe multidisciplinar de biólogos, engenheiros, engenheiros ambientais, advogados, agrônomos, físicos, assistentes sociais e zootecnista – tem desenvolvido diversas ações, como conservação, recuperação de matas ciliares, adequação ambiental e elaboração de projetos em parcerias com escolas, ONGs e prefeituras, buscando um trabalho multidisciplinar na região da bacia hidrográfica do rio Mogi-Guaçu. As atividades envolvem 18 municípios localizados entre os Estados de Minas Gerais e São Paulo. A população total é de cerca de 330 mil habitantes.

Depois de um estudo realizado nessa bacia, entre os anos 2000 e 2003, detectou-se a importância da área da nascente para as atividades econômicas dessa região – principalmente agrícolas, de piscicultura e turismo –, responsáveis pela geração de divisas para os dois Estados envolvidos. O diagnóstico apontou os efeitos da alteração da qualidade da água na nascente sobre os cursos d’água na foz do rio. Por ser rica em nascentes e mananciais, a bacia hidrográfica tem sofrido fortes impactos ambientais devido a atividades agrícolas irregulares, que contaminam o solo e causam assoreamento dos riachos, que muitas vezes deixam de existir. “Por isso elegemos essa área como prioritária para as ações de defesa do ambiente, a curto e médio prazos, a fim de promover reflexos positivos na população local”, explica o professor Evaldo Gaeta Espíndola, coordenador-geral do Projeto Mogi-Guaçu.

De extrema beleza natural, com grande riqueza de nascentes – existem 368 nascentes catalogadas, quase duas por quilômetro quadrado –, a região da bacia hidrográfica da nascente do rio Mogi-Guaçu passa por problemas cada dia mais comprometedores ao seu desenvolvimento, devido aos múltiplos usos da água.

Problemas

Segundo Espíndola, os riachos dessa região são de baixo volume hídrico e suscetíveis aos impactos da atividade humana. O esgoto doméstico vindo das áreas urbanas é lançado nos riachos indiscriminadamente, sem tratamento, contaminando os cursos d’água. “Dos 18 municípios envolvidos, apenas um deles, Itapira, em São Paulo, coleta 92% de seu esgoto e trata 100% desse montante”, esclarece.

Outro problema apresentado é a questão da contaminação fecal nas águas, que são utilizadas para consumo na área rural sem desinfecção, como também para a irrigação das lavouras de morango, batata, café, alho e tomate. Mais perto da foz do rio, na região de Lindóia, essas águas são intensamente utilizadas nas atividades de pesqueiros, além das indústrias de engarrafamento de água mineral.

Um exemplo do descaso e do hábito de considerar os riachos como depósitos de lixo e esgoto foi a equipe encontrar, na primeira cachoeira do rio Mogi-Guaçu, restos despejados de um matadouro, sem contar as centenas de embalagens de agrotóxicos jogadas nas margens e na mata ciliar do rio das Antas, área que abastece a cidade de Bueno Brandão, em Minas Gerais.

O cultivo de batata e morango, principal atividade econômica da região da nascente – responsável por fazer de Minas Gerais o primeiro produtor nacional da batata inglesa e dono de 40% da produção nacional do morango –, tem alto impacto ambiental, principalmente por ser praticado em áreas inaptas e impróprias pela topografia regional. O cultivo causa grande movimentação do solo, já que muitas vezes ocorrem duas safras ao ano e há uso maciço de agrotóxicos, que, aliados à grande incidência de chuvas, aumentam os efeitos do escoamento superficial da terra nas águas do rio. Isso acaba acarretando sérios problemas de erosão e assoreamento dos mananciais.



Outra conseqüência é a redução da disponibilidade de água. Muitos riachos estão secando, deixando sulcos no terreno onde antes corria água. Essa redução se deve principalmente à prática de irrigação e à retirada da vegetação nativa, que aumenta a respiração do solo, provocando o abaixamento do lençol subterrâneo e enxugamento de nascentes. “A redução das matas tem afetado a biodiversidade. Animais e aves comuns na área, como lobo-guará, veado-catingueiro, veado-mateiro, paca e tangará, estão cada dia mais raros na região”, diz Espíndola.

Um estudo sobre o uso abusivo de pesticidas organofosforados nos riachos da região detectou quantidades preocupantes desse agrotóxico, levantando fortes suspeitas de que ele seja o responsável pelo aumento de casos de suicídios entre os agricultores locais, por sua reconhecida ação inibitória sobre a enzima acetilcolinesterase – fundamental para as operações do cérebro.

Para o prefeito de Jacutinga, Roosevelt Rodrigues, o Projeto Mogi-Guaçu é um marco e ponto básico para a aglutinação de todos em prol de uma luta em comum. “Nossa cidade capta a água do rio, que já vem cheia de dejetos pesados, lançados por outras cidades que se encontram acima da nossa. Para conscientizar e envolver a população, criamos a Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente e o projeto veio para ajudar nessa luta.”
Elcio Fiori de Godoy, presidente da Bacia Hidrográfica do Mogi-Guaçu, acredita que as ações do projeto “vão somar” e ajudar cada município a entender a importância de tratar o esgoto e dar um destino correto para o lixo, prioridades para um futuro próximo.

Múltiplas ações

O projeto foi dividido em nove núcleos de atuação. Segundo Janete Brigante Castele, coordenadora executiva, houve necessidade de segmentar o projeto por ele ter múltiplas ações, como agricultura, piscicultura, saneamento, produção de nascentes, mata ciliar e turismo, reunindo uma grande quantidade de informações diferenciadas (leia ao lado as atividades de cada núcleo).

Janete acredita que, através da educação ambiental, é possível obter resultados a médio e longo prazos. “Estamos tentando manter a presença constante da nossa equipe na região, para provocar nas pessoas a preocupação com o ambiente que os rodeia e chamar a atenção para fatos que elas não estavam acostumadas a se preocupar.”

Com um ano de atuação, a equipe do projeto quer buscar mais recursos para manter as ações por mais tempo entre as comunidades, evitando descontinuidade. Para isso as parcerias são muito bem-vindas. “Queremos perceber se realmente alguma mudança está ocorrendo no rio e suas margens em termos de cobertura vegetal, de destinação do esgoto e de cuidado com as nascentes”, ressalta Janete. “Não é de hoje que diferentes grupos se locomovem nas regiões para realizar algum trabalho de conscientização. Com o projeto, estamos incentivando mais ainda essa luta, criando parcerias com as prefeituras, órgãos ambientais e associações de bairro.”

As mudanças só vão ocorrer se os valores da sociedade forem revertidos, acredita Janete. Ela diz que só a partir da mudança da visão consumista, materialista e imediatista da sociedade é que as propostas de proteção ambiental poderão ser bem-sucedidas. “Pouca coisa está se concretizando no mundo por ser uma questão de valor humano. A atitude de cada um de nós deve mudar, para o ambiente melhorar”, ressalta Janete.



Para Suellen Andrade Rodríguez, de 16 anos, aluna do segundo ano do ensino médio de Bueno Brandão, que participou do plantio de mudas na área da nascente do rio Mogi-Guaçu, o projeto a ajudou a entender a importância do plantio de árvores. “A árvore vai ajudar a preservar o fluxo de água do rio e, com isso, melhorar a natureza e as nossas vidas. Daqui a alguns anos, vai garantir a vida dos nossos filhos e das outras gerações.”
Também de Bueno Brandão, o estudante Gabriel Miller de Oliveira compreendeu que precisava mudar seus hábitos para que o ambiente não sofresse tanto. “Antes jogava papel em qualquer lugar. Hoje não faço mais isso e fico de olho em quem faz, porque a gente já viu as conseqüências do lixo jogado no rio.”

Enquanto isso, a educadora ambiental Josilaine Dias de Souza, moradora na área rural da região de Mogi-Guaçu, quer recuperar o tempo perdido. “O projeto passou para nós muitos conceitos importantes, que repassamos aos alunos e que eu e minha família também estamos tentando aplicar na área onde moramos. Infelizmente, no passado, não se deu muita atenção e foram feitas muitas coisas erradas na nossa propriedade. Agora precisamos recuperar.”

As várias frentes de atuação

Estes são os núcleos de atuação em que está dividido o Projeto Mogi-Guaçu.

Núcleo de Educação Ambiental
Desenvolve cursos de Educação Ambiental a professores da rede de ensino dos municípios abrangidos pelo projeto. Durante o curso é exigida dos professores a elaboração de projetos ambientais a serem desenvolvidos em suas cidades de origem. Os temas devem contemplar as linhas de atuação do Projeto Mogi-Guaçu. “Cada escola representada no curso recebe kits de análise de água, solo e biodiversidade para auxiliar na abordagem e estudos dos temas ambientais”, ressalta Rita de Cássia Almeida, coordenadora do núcleo.

Núcleo Agrotóxicos e Agricultura Orgânica
Esse núcleo trabalha diretamente com os produtores rurais. Busca orientá-los sobre os possíveis impactos das atividades que estão desenvolvendo em suas propriedades, mostrando como o uso indiscriminado de agrotóxicos pode afetar o rio e a qualidade de vida deles e de seus familiares. Como parte das atividades, são obtidos dados sobre o nível de conhecimento dos agricultores em relação aos agrotóxicos, seu uso e as principais culturas. A partir daí, são ministradas palestras e distribuídas cartilhas, que abordam os cuidados necessários para a aplicação de agrotóxicos. Outra ação do núcleo, segundo a coordenadora Maria Edna Tenório Nunes, é orientar e incentivar a prática de agricultura alternativa e sistemas agroflorestais.

Núcleo Proteção de Nascentes
Os trabalhos desse núcleo incluem a catalogação e o diagnóstico ambiental das nascentes existentes no município de Bom Repouso. São dadas palestras para produtores rurais sobre boas práticas de manejo de nascentes, buscando a adequação ambiental dos recursos florestais e hídricos. Giselle Queirós, coordenadora do núcleo, afirma existir um grande dilema entre o fato de proteger a terra e o ganho que se quer dela. “Embora a população já esteja visivelmente sensibilizada pela qualidade e diminuição das nascentes, a questão econômica pesa muito.”

Núcleo Saneamento Básico Rural
Segundo a coordenadora Andréa Novelli, o objetivo é a transferência de noções básicas sobre saneamento rural, enfatizando o tratamento de efluentes domésticos e o destino das fezes de currais e pocilgas. A equipe, através de um questionário, obtém informações sobre as condições sanitárias da população rural dos municípios com o intuito de subsidiar o conteúdo das palestras e do material didático. O conhecimento também é utilizado na formação de agentes de difusão, que são os multiplicadores das boas práticas de saneamento. “Outra meta importante é a capacitação do sitiante para a instalação da fossa séptica biodigestora, que é feita por meio de palestras e oficinas em campo”, explica Andréa.

Núcleo de Piscicultura
Esse núcleo trabalha diretamente com os proprietários e funcionários de pesqueiros, mostrando as boas práticas de manejo e explicando as leis de recursos hídricos, o Código Florestal e as leis para crime ambiental. Promove workshops mostrando a importância de cumprir as leis e o que melhoraria e preservaria a biodiversidade do rio. “Procuramos explicar como o proprietário pode oferecer um produto de primeira qualidade segundo as exigências da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)”, explica
a coordenadora Márcia Noelia Eler.

Núcleo de Vegetação
Tem como objetivo recuperar e incentivar futuras ações de recuperação da mata ciliar das nascentes e riachos da bacia hidrográfica da nascente do rio Mogi-Guaçu. Já plantou cerca de 3 mil mudas de essências arbóreas nativas nos primeiros 500 metros de mata ciliar do rio. Segundo a coordenadora do núcleo, Janete Brigante Castele, trata-se de uma ação simbólica em defesa da vegetação dessa bacia, que será complementada com a distribuição de manuais detalhados sobre como reflorestar matas ciliares e sua importância para a proteção dos cursos d’água. “Também foram realizados um levantamento da fitofisionomia de Bom Repouso e palestras sobre a criação de viveiros florestais em sistema de cooperativa de produção de essências nativas, como forma de estimular novas iniciativas e promover a geração de empregos, além de atender
à demanda regional
pelo produto.”

Núcleo de Desenvolvimento Turístico Regional
Esse núcleo pretende colocar o turismo como alternativa econômica e opção social, tentando minimizar os impactos das atividades agrícolas da região. Para isso, o coordenador Frederico Yuri Hanai e sua equipe realizam palestras e cursos sobre educação e conscientização turísticas. São apresentadas propostas de desenvolvimento turístico, disponibilizando assessoria, apoio e assistência às associações envolvidas e aos empreendimentos emergentes da região. “Além de resgatar e valorizar os patrimônios histórico-culturais locais, a implementação do turismo como atividade econômica alternativa poderá induzir os produtores rurais ao uso sustentável
dos recursos paisagísticos, hídricos e naturais.”

Núcleo de Acervo Histórico-Cultural
A proposta é resgatar e valorizar os patrimônios históricos, culturais e naturais da região, fazendo coleta de informações sobre costumes e manifestações culturais e artísticas locais. Esse material gerará um documentário de imagens e um atlas fotográfico da bacia hidrográfica, apresentando a biodiversidade da região e descrevendo
suas riquezas.

Núcleo de Assessoria Jurídica às ONGs
Presta assistência jurídica às Organizações Não-Governamentais (ONGs) envolvidas com o ambiente, a fim de garantir sua integridade institucional. Também dá apoio para a criação de novas ONGs e outras associações. A coordenadora Ana Lucia Cotrim Gomes afirma que o “fortalecimento das ONGs ajudará na continuidade
das ações do projeto ao longo do tempo”.

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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