Num
futuro próximo, mais precisamente até 2022, o mundo
globalizado dará grande importância à utilização
de fontes renováveis de energia. O Brasil terá 70%
de probabilidade de consolidar sua liderança no continente
sul-americano, o que não ocorrerá sem ônus,
pois suas responsabilidades econômicas, políticas e
relativas à segurança também aumentarão.
Até 2022, haverá 60% de chances de aumentar o poderio
econômico e militar da China. Em mesmo grau, a identidade
política européia se afirmará, da mesma forma
que se reduzirá a primazia dos Estados Unidos na economia
e na política mundiais.
O
que parece previsão de guru é um estudo prospectivo
de fôlego para cenários futuros realizado por mais
de 200 especialistas reunidos em torno de um programa recém-lançado
pelo Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP. O primeiro
dossiê desse levantamento está na revista Estudos Avançados
número 56, que será lançada no dia 8 de maio,
segunda-feira, às 17h30, no Anfiteatro Camargo Guarnieri.
Na ocasião, o frei Luiz Flávio Cappio, bispo da diocese
da Barra (BA), fará uma exposição sobre o projeto
de transposição do Rio São Francisco.
Pensar
as possibilidades futuras é uma prática comum em países
do Hemisfério Norte, haja vista, por exemplo, a quantidade
de indicadores econômicos publicados semanalmente nos Estados
Unidos e nos principais mercados europeus. No Brasil, essa prática
ainda engatinha, embora comece a ser reconhecida pelas esferas governamentais
como parte indissociável do exercício da liderança
e da mobilização da sociedade para o desenvolvimento
do País. Tanto que o IEA foi contratado em 2004 pelo Núcleo
de Estudos Estratégicos da Secretaria de Governo e Gestão
Estratégica da Presidência da República (NAE)
para colaborar no Projeto Brasil 3 Tempos – 2007, 2015, 2022
(Br3T).
Coordenado
pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE),
uma organização civil de interesse público,
o Br3T é um dos mais importantes e polêmicos programas
de prospecção de cenários futuros já
feitos no Brasil. Dentro daqueles marcos temporais – o primeiro
ano de mandato do futuro governo (2007), a data do 20o aniversário
do último plano de desenvolvimento da ONU e da avaliação
das Metas do Milênio (2015) e, finalmente, o bicentenário
da Independência (2022) – diversas instituições
de pesquisa analisaram sete campos da vida em sociedade, incluindo
a Dimensão Global e a Dimensão Institucional, ambas
a cargo do IEA. Outras dimensões analisadas foram a econômica,
sociocultural, ambiental, do conhecimento e territorial.
Os
relatórios entregues ao NAE e ao CGEE constituíram
a montagem de quatro cenários distintos para cada dimensão:
o cenário desejado, correspondente à média
daquilo que os pesquisadores gostariam que ocorresse; o cenário
provável, contendo aquilo que acreditam que ocorrerá;
e dois cenários contrastados, com variações
problemáticas ou catastróficas em torno dos outros
dois cenários.
Concluídos
aqueles documentos, os estudiosos do IEA decidiram se debruçar
sobre um ambicioso projeto, inspirado no trabalho encomendado pelo
governo federal. Nascia o Brasil: o país no futuro –
2022, um programa que se propõe a produzir conhecimento e
fornecer subsídios para o planejamento do futuro, a partir
de um debate pluralista, realizado dentro do rigor científico.
O resultado inicial do programa é justamente este primeiro
dossiê publicado na edição 56 da revista Estudos
Avançados.
Debates
e consultas – Iniciados em agosto de 2005, os seminários
que marcaram as primeiras atividades do programa do IEA se pautaram
pela identificação de pontos críticos que dificultam
o desenvolvimento do Brasil. Professores como Gildo Marçal
Brandão, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas (FFLCH), Rewina Meyer, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
(FAU) da USP, Hélio Zilberstein, da Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade (FEA), João Steiner,
do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas
(IAG), Simon Schwartzman, do Instituto do Trabalho e Sociedade do
Rio de Janeiro, e José Galizia Tundisi, do Instituto Internacional
de Ecologia de São Carlos, participaram ou coordenaram debates
sobre variados temas: instituições políticas;
relações internacionais e território; segurança
pública e desenvolvimento urbano; economia e seguridade;
conhecimento; e ambiente.
A
partir de uma metodologia própria e contando com técnicas
consagradas para esse tipo de levantamento – entre elas a
pesquisa Delphi, a Análise e Estruturação de
Modelos (AEM), o Brainwriting e outras –, o programa do IEA
prossegue em 2006 com a preparação de uma segunda
pesquisa Delphi que se realizará em duas rodadas. Dessa forma,
será possível atualizar os cenários desenhados
em 2005, além de preparar a base de dados para um programa
sistemático e permanente de prospecção de cenários.
Coordenado
e dirigido pelos professores do IEA Geraldo de Forbes e João
Steiner, o estudo traz no “cenário desejado”
para o Brasil nos próximos 16 anos “um país
capaz de estabilizar o regime democrático; de ampliar a fiscalização
popular nas decisões políticas (accountability); de
voltar a crescer a taxas históricas pré-anos 1980;
de enfrentar com sucesso as disparidades regionais e de investir
na educação e no desenvolvimento tecnológico”,
entre outras boas notícias.
No entanto, no artigo “O Brasil no mundo: conjecturas e cenários”,
assinado pelo professor Sebastião Velasco e Cruz, da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), e Ricardo Sennes, sócio-diretor
da Prospectiva Consultoria Brasileira de Assuntos Internacionais,
o “cenário mais provável” para o País
dentro do contexto globalizado será uma “desconcentração
conflituosa”.
Ou
seja, a redução da primazia dos Estados Unidos, o
aumento do poder econômico e militar da China, a efetiva identidade
política da União Européia através de
uma Constituição própria e de uma Política
Externa e de Segurança Comum (Pesce), a ascensão da
Índia e a integração da Rússia à
União Européia ocorrerão por meio de uma tensão
maior entre os principais atores da política econômica
internacional.
Num
mundo em crise e com maiores perspectivas de intensificação
da atividade terrorista, o Brasil se favorece no plano internacional
de maneira a fortalecer sua importância econômica e
institucional. Os acordos multilaterais diminuirão as garantias
efetivas de acesso aos mercados globais para os produtos agrícolas
brasileiros. Mas a busca de novos mercados, tais como China, Índia,
Rússia e Oriente Médio, compensará em parte
a redução de acesso via Organização
Mundial do Comércio (OMC). Esse ambiente permitirá
o aumento das exportações brasileiras e a redução
da relação dívida externa/PIB.
Além
dos artigos com os quatros cenários imaginados para cada
um dos temas tratados nos seminários realizados pelo IEA,
a nova edição de Estudos Avançados reacende
a questão da transposição do rio São
Francisco, com uma entrevista de dom Luiz Flávio Cappio.
O governador do Ceará, Lúcio Alcântara, e o
professor Aziz Ab’Sáber, do IEA, abordam o tema em
artigos assinados na seção Polêmica. Além
das resenhas de livros assinadas pelo jornalista Washington Novaes
e pelo economista João Machado Borges Neto, entre outros,
a revista traz ainda uma homenagem à professora Gilda de
Mello e Souza, falecida em dezembro passado, tema de artigo da professora
Otília Beatriz Fiori Arantes, da FFLCH.
O
lançamento da revista Estudos Avançados será
no dia 8 de maio, segunda-feira, às 17h30, no Anfiteatro
Camargo Guarnieri, na Cidade Universitária, em São
Paulo. Mais informações pelo telefone (11) 3091-3919. |