Por
US$149 (mais taxa de importação) é possível
comprar um bloqueador de telefone celular para ambientes pequenos;
para espaços maiores, em raio de até 350 metros, precisa
ser aparelho de potência maior, que custa mais, US$ 3.995,00.
São ofertas encontradas em um das centenas de sites de empresas
fabricantes de jammers e scanners, que também explicam onde
usá-los, como instalar e manter. No exterior, os bloqueadores
de sinal costumam proteger presídios, quartéis, campos
de batalha, embaixadas, instalações governamentais,
bibliotecas, teatros, automóveis e, em alguns países,
até casas de família, quando os pais querem que os
filhos estudem em vez de ficar horas falando com namoradas. O Brasil,
país de gente em geral pacífica, não fabrica
esses embaralhadores de sinal ou de voz, por falta de mercado e
porque a venda e uso deles são controlados, uma vez que podem
ser utilizados também pela bandidagem. Para assaltar bancos,
por exemplo. Em países com tradição de terrorismo
e guerras, ou de controle da vida dos cidadãos pelo Estado,
há demanda grande e muitos fabricantes. Só na China
existem mais de 300.
Então,
se há um sistema tão fácil e barato de bloquear
celulares, sem necessidade de desativar torres de retransmissão
de sinal, com prejuízo para usuários não envolvidos
com a Justiça, por que os presídios brasileiros continuam
sendo centros de onde organizações do crime comandam
rebeliões, assassinatos e desordens de rua? Segundo o professor
João Antonio Zuffo, engenheiro formado pela Escola Politécnica
da USP, fundador e coordenador do Laboratório de Sistemas
Integráveis (LSI) da Poli, parece haver uma tripla explicação:
as empresas que comercializam celulares não querem se envolver
com presídios; falta melhor diálogo entre elas e os
governantes; e o governo está sempre um passo atrás
do crime em matéria de tecnologia.
Às
universidades cabe informar à sociedade o que já existe
no setor e como avançar mais. É o que o LSI vem fazendo
por meio de entrevistas de seus pesquisadores em programas de rádio
e televisão, especialmente depois dos últimos atentados
em São Paulo. Há retorno, embora ainda tímido:
o Ministério Público paulista quer ouvir o pessoal
da Poli sobre os bloqueadores de celular, e o MP de Vitória
(ES) pediu mais informações. Embora tenha capacidade
para isso, não é do interesse dos cientistas do LSI
fabricar esse tipo de equipamento, mesmo porque continua não
havendo mercado para ele e do ponto de vista da ciência não
representaria nenhum avanço. Mesmo assim, a Universidade
dispõe-se a dar apoio técnico ao Estado, se for solicitada.
Como
a luz – Segundo Zuffo, o bloqueador de celular emite
ondas eletromagnéticas à semelhança das ondas
de luz, e bloquear um presídio é como iluminar uma
quadra de esportes. Assim como um facho de luz forte anula a luz
de lanterninhas que possam estar sendo usadas na quadra, o bloqueador
entra na faixa do celular, provoca ruído em torno e impede
que a ligação se conclua. Dispensa torres, mas pode
ser colocado do lado de fora do presídio, desestimulando
rebeliões com o objetivo de destruí-lo. Leves e móveis,
se ligados na tomada funcionam como transmissores, os bloqueadores
dispensam a desativação das torres de empresas telefônicas
nas proximidades de presídios, como elas estão sendo
obrigadas a fazer em São Paulo por ordem da Justiça.
Há casos bizarros e um deles, uma torre em área de
um presídio feminino no Rio Grande do Sul, deixou o professor
Zuffo impressionado. Ele estranhou também a sugestão
ouvida em programa de televisão de transformar os presídios
em gaiolas de faraday, isto é, empacotar as cadeias com tela
de galinheiro. De fato, a rede de arame ligada à terra bloqueia
os sinais de celulares e é até usada em pequenos ambientes,
com a desvantagem, porém, de se deteriorar em pouco tempo.
Quanto às torres, desativá-las pode ser solução
transitória, mas o recurso tem inconvenientes, pois o bloqueio
nem sempre é total.
O alcance
típico de uma torre de celular, explica o professor da Poli,
é da ordem de sete a sete quilômetros e meio de raio,
ou 150 quilômetros quadrados de área. Dependendo das
condições topográficas e de tempo, mesmo que
a torre esteja situada a 20 quilômetros de distância,
ainda será possível que o sinal de celular chegue
à cadeia. Assim se explica que em alguns presídios
paulistas visados pela justiça os celulares continuem a funcionar.
Quando o bloqueio não é satisfatório, seria
necessário desligar outras torres, mais distantes, com prejuízo
ainda maior para os usuários fora dos muros. “Se for
desligada uma torre em Pinheiros, quase a metade da cidade de São
Paulo será afetada”, pondera Zuffo.
Sem
ligações |
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Rádio
– Detentos também costumam se comunicar com o além
dos muros por meio de rádio. Na opinião do coordenador
do LSI, este é um problema menor, porque o sistema é
menos utilizado que o telefone celular e pode ser facilmente anulado
com a instalação de bloqueador de freqüência
de rádio. Também no caso de celulares por satélite
há necessidade de bloqueador específico. Vigilância
especial mereceriam os presos que tentassem puxar um fio para fora
da área de bloqueio. Agora, em vez de túneis, os presos
podem estar ocupados na construção de encanamento.
Nesse caso, as empresas telefônicas têm condições
de detectar as ligações clandestinas, usando scanners.
É dessa forma também, segundo o professor, que a bandidagem
clona telefones e a polícia escuta conversas de traficantes.
O problema dos scanners é de privacidade, uma vez que permitem
a escuta de conversas entre pessoas que nada têm a ver com
crimes.
Mas,
seria mesmo o celular responsável pelas rebeliões
em presídios paulistas? Zuffo responde que a comunicação
é fundamental em qualquer atividade humana e decisiva para
o progresso da ciência e tecnologia. No crime também.
“Estamos numa era que chamo de infoera. Há no horizonte
novos sistemas, que vão revolucionar a comunicação
que temos hoje. É o caso do Imax, sistema pelo qual uma só
antena abrange 50 quilômetros. Mais ainda: permitirá
comunicação em faixa larga, comunicação
de voz, de vídeo e mesmo TV de alta definição
em ambos os sentidos – da casa para a antena e da antena para
a casa.” Segundo o professor, esse sistema certamente vai
operar em frequência diferente da do celular e exigirá
novos bloqueadores. “É uma corrida contra o tempo,
e o governo precisa estar um passo adiante do crime.”
Os
interessados na evolução anunciada da tecnologia da
comunicação para os próximos anos e décadas
podem ler a obra em três volumes, A sociedade e a economia
no novo milênio – os empregos e as empresas no turbulento
alvorecer do século XXI, que o professor João Zuffo
publicou em 2003 pela editora Manole. “Não posso errar
o caminho a seguir, não terei uma segunda oportunidade”,
afirma o autor, ao observar que o Brasil está um tanto atrasado
na matéria por ele analisada.
Zuffo
alerta que tecnologia nenhuma dispensa as medidas tradicionais de
controle nos presídios – entrada de visitantes e visitas
íntimas. De advogados também.
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