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É uma história que vem sendo gravada com sensibilidade. Há 20 anos, a artista argentina Maria Del Carmen Perez Sola, que chegou ao Brasil no início da década de 1960, teve a iniciativa luminosa de fundar, no Museu de Arte Moderna (MAM), o Clube dos Colecionadores da Gravura. A meta era divulgar a arte e torná-la acessível ao público, incentivando os colecionadores e também a produção artística. Hoje, o idealismo de Maria Sola já foi impresso nas matrizes dos mais importantes artistas brasileiros. Desde a semana passada, a trajetória do Clube da Gravura está sendo apresentada numa exposição que reúne 93 obras. Sob a curadoria de Cauê Alves e Margarida Sant’Anna, o público pode apreciar os trabalhos de Renina Katz, Anna Bella Geiger, Laurita Salles, Tomie Ohtake, Arcângelo Ianelli, Luiz Paulo Baravelli, Aldemir Martins, Beatriz Milhazes, Vik Muniz e Gregório Gruber, entre tantos outros. E o mais importante: vai perceber a dimensão infinita da gravura. Observar o desenho gravado na matriz de madeira de Maria Bonomi, ver as paisagens delicadas no papel de Evandro Carlos Jardim e perceber a criatividade com que se aliou às novas técnicas. É a gravura saindo pequenina do papel para se apresentar contemporânea, em formas tridimensionais, como no trabalho de Paulo Climachauska, que mostra um desenho grafado em papel carbono diretamente na parede, legendado por uma pedra, ou o aparelho de madeira e couro, com visor estereoscópico de Vik Muniz.

“Desde o seu início, nosso clube acolheu os principais artistas gravadores do País”, conta Tadeu Chiarelli, diretor do MAM e professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP. “Ao mesmo tempo, permitiu a todas as pessoas que quisessem se associar adquirir as obras desses artistas e, assim, iniciar uma importante coleção.”

Todos os anos, o MAM convida um grupo de artistas para gravar os seus trabalhos. Os sócios recebem essas obras através de um pagamento de R$ 2.750,00, que pode ser dividido em dez parcelas de R$ 275,00. Neste ano, o MAM convidou cinco artistas: Hércules Barsotti, Vânia Mignone, Antonio Henrique Amaral, Chico Linares e Karin Lambrecht.



Entre diversas técnicas – “Ao percorrer a mostra, o público pode acompanhar as diferentes orientações adotadas pela curadoria do MAM nestes 20 anos”, explica o curador Cauê Alves. “Se, inicialmente, participaram das edições apenas artistas que possuíam um sólido trabalho como gravadores, aos poucos, principalmente a partir da década de 1990, os convites foram direcionados também àqueles que faziam uso prioritariamente de outros meios, como a pintura e a escultura.”

Alves observa que a partir da gestão de Tadeu Chiarelli o clube mudou de orientação. “Interessado em acertar o passo com as discussões da cena contemporânea, que questionava a própria definição da gravura, o MAM, assumindo o papel de laboratório e lugar de experimentação, deu total liberdade para artistas de uma nova geração desenvolverem trabalhos que superassem os limites da linguagem. A fotografia, entre outras novas tecnologias, a instalação, o carimbo, fundidos com técnicas tradicionais, permitiram a elaboração de uma noção mais híbrida e alargada de gravura, que tende, no limite, para o público.”

Os novos caminhos que a gravura vem percorrendo surpreendem o artista Dudi Maia Rosa. “Eu participei da edição do clube em 2003”, conta. “Agora, vendo todas as obras juntas, percebo que a minha é uma das mais tradicionais.” Para Laura Vinci, que tem se dedicado às instalações, o clube é um grande incentivo para que os artistas possam retomar a gravura. “Na verdade, fiz poucas gravuras. Achei muito importante participar da edição de 2004 e ver o meu trabalho sendo divulgado em um contexto diferente.”

Luiz Paulo Baravelli gravou o seu trabalho em 1989, que é uma obra inusitada na trajetória do artista. “Foi, na verdade, a minha única gravura”, diz. “Na década de 70, cheguei a ter uma prensa, mas confesso que sempre tive uma certa preguiça de enfrentar os processos que a gravura exige.”

Quando recebeu o convite do MAM para participar, Baravelli se dispôs. “Resolvi fazer uma litografia. Podia trabalhar em casa, mas esse é um processo que exige a gravação em uma pedra que pesa cem quilos. Resolvi, então, trabalhar na própria editora. Levei a modelo, uma moça delicada chamada Heloísa, e montei um pequeno ateliê.” Baravelli desenhou, com traços leves, Heloísa nua, de costas.

Os temas das gravuras são os mais diversos. “Waltercio Caldas e Jac Leirner nos fazem refletir sobre os possíveis sentidos do colecionismo”, orienta o curador Alves. “A série Metros, de Cildo Meireles, lida com a mensuração de espaços, sugerindo deformações espaciais em que as seqüências numéricas perdem sua lógica linear e apontam para uma outra noção de espaço. Há também o trabalho de José Damasceno, em que não há qualquer imagem, lemos apenas as palavras: vale o escrito.”

A exposição “Clube da Gravura: 20 Anos” fica em cartaz até 10 de setembro, de terça-feira a domingo, das 10 às 18 horas, no Museu de Arte Moderna (MAM), avenida Pedro Álvares Cabral, sem número, portão 3 do Parque do Ibirapuera. Ingressos: R$ 5,50 (estudantes pagam meia). Sócios e parceiros do MAM, crianças até 10 anos e adultos com mais de 65 anos não pagam. A entrada é franca aos domingos.

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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