Os
pacientes infantis do Hospital Universitário (HU) da
USP ganharam grandes aliados. São os alunos voluntários
da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH),
que dedicam algumas horas do seu dia para brincar, contar histórias,
conversar e divertir as crianças internadas. A ação
dos voluntários acontece na Brinquedoteca do hospital
e também na área ambulatorial, onde as crianças
ficam esperando o atendimento médico. São seis
horas semanais, entre segunda e quinta-feira, no período
da manhã ou da tarde. Cada voluntário dedica no
mínimo duas horas por dia à tarefa.
O Projeto de Integração Social foi uma ação
piloto que teve início em abril e contou com uma turma
de 25 voluntários. Coordenado por Maria Vicentina de Paula
do Amaral Dick, professora da FFLCH, foi planejado em três
fases. A primeira tem a finalidade de acompanhar crianças
e adolescentes de 2 a 15 anos de idade, ajudando-os com reforço
escolar, de modo a compensar a ausência às aulas
do ensino fundamental e médio. Dessa forma os estagiários
estabelecem uma ligação entre as crianças
e a sala de aula, quando elas se encontram impossibilitadas de
freqüentá-la. As crianças menores podem participar
da atividade de contação de histórias. “Apresentamos
não apenas os contos infantis tradicionais, já conhecidos,
mas também os mitos brasileiros e os contos de origem
indígena e africana”, ressalta Maria Vicentina.
A segunda fase do projeto organizou uma caixa-estante
com os livros e revistas infanto-juvenis doados durante a Semana
de Recepção aos Calouros da FFLCH, no início
do ano letivo. A partir dessa minibiblioteca, uma das ações
será promover o acesso à leitura tanto para os
pacientes internos quanto para a população externa.
Já a terceira etapa será a realização
de uma feira de estudantes, no segundo semestre deste ano, contando
com a participação de empresas que concedem estágios
para os alunos de graduação da FFLCH – algo
em torno de 530 instituições. “É um
evento para discutir a participação dos estudantes
em atividades práticas de estágio”, explica
Maria Vicentina.
Os benéficos efeitos da iniciativa já se fazem
sentir. Daniela Ribeiro Linhares, técnica de apoio educativo
da Brinquedoteca, destaca que o aumento de pessoas trabalhando
com as crianças ajuda muito na recuperação,
porque passam a receber mais atenção e isso faz
com que elas melhorem seu relacionamento interpessoal, conversem
mais e, principalmente, saiam do leito. “Elas se sentem
acalentadas e esse carinho e atenção é uma
força muito grande para que seu quadro clínico
melhore”, ressalta.
Daniela afirma ainda que a existência de uma pessoa para
orientar a criança nas atividades da Brinquedoteca só trouxe
resultados positivos, pois a educação não
se limita aos muros da escola. “Com os estagiários,
reforçamos a idéia de que, através do lúdico, é possível
conhecer melhor a criança no aspecto social e pessoal,
observando sua postura ao brincar, o relacionamento com a família
e as outras crianças, a criatividade, seus desejos e anseios.” Emoção – Celso
Tadeu Borzani, aluno do terceiro ano do curso de Geografia da
FFLCH, um dos estagiários,
concorda com Daniela ao relatar a experiência que vivenciou
com Ingrid, que fez um ano de idade na UTI do HU e estava desenganada
pelos médicos. “Comecei a visitá-la na UTI,
conversava com ela, fazia massagem em seus pezinhos, lia livros.
Um certo dia, chego para vê-la e ela tinha ido para o quarto.
Estava toda alegre na cama. Fiquei emocionado e percebi o quanto
podemos fazer com pequenos atos de doação”,
emociona-se o estudante.
Borzani conta que conheceu a menina Joyce, de
12 anos, que sempre estava de cara brava. Nunca queria conversar
com ninguém
e não saía da cama, mesmo podendo. “Eu tentava
sempre bater papo com ela, até que um dia ela veio conversar
e até chorou. Sugeri irmos para a Brinquedoteca, mostrei
as coisas que podiam ser feitas. Na hora de ir embora, disse que
ficaria magoado de vê-la na cama quando voltasse para o hospital.
Quando voltei, lá estava ela toda faceira na Brinquedoteca,
se divertindo e partilhando brincadeiras com os outros pacientes.
Para mim, isso foi uma grande satisfação e uma realização
pessoal. Pensei: estou ajudando alguém, que bom.”
“Sempre gostei de crianças”, reflete Julio César
Bazanini, estudante do segundo ano de História. O envolvimento
de Bazanini foi intenso com as crianças. Ele conta que principalmente
os meninos, que sentem muito a falta da figura masculina do pai ou
de um irmão, se identificaram muito com ele e vice-versa. “Brincamos
de coisas que meninos normalmente fazem, como correr e pular. Eu
me senti próximo deles e notei muita diferença nas
atitudes deles com o passar dos dias.” Profissionalmente, Bazanini
acha importante experiências práticas como essas, porque
têm muito a ver com educação em espaços
informais, que podem ser transferidas para a sala de aula. Para a assistente social do HU Maria Bernadete
Tanganelli Piotto, a experiência visa a muito mais coisas do que só o
atendimento às crianças. Segundo ela, esse projeto
mostra o funcionamento de um hospital para os alunos de graduação
e permite que estes realizem atividades socioeducativas fora do
ambiente escolar. “O HU é um hospital de ensino e
pesquisa e queremos que mais unidades da USP se aproximem de nós
e nos ajudem a realizar nossa missão da melhor forma possível.”
Maria Bernadete acredita que realizar atividades
recreativas e educativas, com brinquedos, fantoches e livros, facilita
a permanência
da criança no hospital, tornando a internação
mais humanizada e socializada. “Assim não rompemos
a atividade social que a criança tem quando está fora
do hospital.”
A experiência piloto terminou no primeiro semestre e teve
uma excelente avaliação. O grupo foi muito elogiado
pelos médicos, pedagogos e pais dos internados. “É importante
para o aluno da FFLCH entender que ele tem um potencial muito grande
e que provou capacidade ao trabalhar com um público-alvo
com o qual não estava acostumado a interagir”, ressalta
Maria Vicentina.
Para este segundo semestre, o projeto continua em atividade, e
já vai contar com recursos da Pró-Reitoria de Cultura
e Extensão Universitária, para suprir as necessidades
imediatas, como uma estagiária fixa e aquisição
de materiais de consumo necessários para a prática
escolar e de jogos adequados às idades dos pacientes atendidos.
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