A USP
está em guerra. O “inimigo” é uma
droga usada por 25% dos paulistanos, que causa mais dependência
do que a cocaína mas é comercializada livremente
em todo o mundo: o cigarro. O Ambulatório Antitabágico
do Hospital Universitário (HU) se transformou no “quartel-general” da
campanha contra o fumo e oferece tratamento para a comunidade USP.
O hospital agora procura aliados entre os diretores
de unidades da Universidade e membros das Comissões Internas de Prevenção
de Acidentes (Cipas) que queiram implantar grupos de tratamento
em suas próprias faculdades e institutos. “Queremos
envolver toda a comunidade. É importante que os diretores
nos procurem”, convoca o médico João Paulo
Lotufo, responsável pelo ambulatório.
Já foram formados grupos no Instituto de Química
e na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia. Em agosto
será a vez da Reitoria. “A USP já tem consciência
da gravidade do tabagismo e já há leis que proíbem
o fumo em recintos coletivos. Precisamos agora de uma posição
mais firme dos diretores”, destaca Lotufo.
O atendimento para os fumantes que querem se livrar da dependência
consiste, segundo Lotufo, em medicação gratuita,
palestras de uma hora e meia durante quatro semanas e terapia cognitivo-comportamental.
Os funcionários recebem o tratamento na Unidade Básica
de Saúde (Ubas) e o restante da comunidade, no ambulatório
do HU. O contato é feito diretamente nesses locais ou pelo
e-mail antitabagismo@hu.usp.br.
“A terapia é importante porque, além da dependência
química, o cigarro causa uma dependência comportamental.
Com as palestras, conseguimos empolgar o pessoal para parar de
fumar”, explica Lotufo. Como parte da campanha, o HU também
disponibilizou todo tipo de dicas e informações sobre
o tabagismo na página eletrônica www.tabagismo.hu.usp.br.
Os pacientes recebem a medicação para combater a
síndrome de abstinência: adesivos de reposição
de nicotina e antidepressivos. “Quem pára de fumar
continua o tratamento com enfermeiros. Quem não pára
segue o tratamento ambulatorial com psiquiatras. Quem tem uma dependência
forte, além do acompanhamento, recebe tratamento mais intenso”,
diz o médico.
O serviço está sendo oferecido pelo HU há pouco
mais de um ano e mais de 300 pacientes já passaram pelos
grupos. O número de atendimentos no ambulatório não
foi divulgado. A taxa de sucesso do tratamento é de 40%
em média, segundo Lotufo. “Há fraco-dependentes,
médio-dependentes e forte-dependentes. Os primeiros, muitas
vezes, conseguem largar o cigarro até mesmo sem medicação.
Os últimos eventualmente continuam fumando mesmo após
sofrerem amputações por causa do cigarro”,
comenta o médico.
Tabaco e infância – Pediatra e pneumologista, Lotufo
se envolveu no combate ao tabagismo ao fazer estudos sobre o fumante
passivo. Cerca de metade das crianças, segundo ele, são
fumantes passivas. Paradoxalmente, no entanto, esse dado pode ser
usado como mais uma arma no combate ao cigarro. “A preocupação
com as crianças mexe mais com o fumante do que a preocupação
com sua própria saúde. Muitas vezes o fumante não
se impressiona com as possibilidades de câncer, enfarte e
amputação, mas fica em pânico quando descobre
que seus filhos podem adoecer”, explica Lotufo.
Além de causar preocupação nos pais fumantes,
as crianças também estão cada vez mais antitabagistas. “Elas
são muito mais conscientes hoje em dia, já que recebem
orientação nas escolas. É muito comum recebermos
pacientes que procuraram tratamento porque os filhos pequenos pegaram
no seu pé”, conta.
O tabagismo pode até mesmo ser considerado uma doença
pediátrica: a maioria das pessoas começa a fumar
entre 15 e 19 anos. “De cada três adolescentes que
começam a brincar de fumar, um vai fumar para o resto da
vida.” Lotufo explica que os pais forte-dependentes precisam,
a todo custo, evitar que os filhos comecem a fumar. “Fatores
genéticos não levam a pessoa a fumar, mas estão
relacionados com o grau de dependência que ela terá se
começar a fumar. Se o filho de um forte-dependente começar
a fumar, terá grande chance de também desenvolver
uma dependência nesse grau.”
Segundo os dados divulgados no livro Saúde e condição
de vida em São Paulo, lançado recentemente pela Faculdade
de Saúde Pública da USP, mais de 80% dos fumantes
paulistas adquiriram o vício do tabaco durante a adolescência.
Mais de 30%, antes dos 15 anos. O tabagismo aumenta na medida em
que cai a escolaridade. Os fumantes correspondem a 24% dos entrevistados.
Mas, entre as pessoas com condições de moradia precária,
o índice sobe para 50%. Pessoas separadas fumam mais que
as casadas.
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