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O mercado de etanol ainda tem um longo percurso a percorrer até que o combustível se transforme em commodity negociada nas principais bolsas de valores do mundo, como Nyse (New York Stock Exchange, na sigla em inglês) e Bolsa de Chicago. A entrada de grupos estrangeiros no setor de açúcar e álcool brasileiro é bem-vinda, da mesma forma que os investimentos em pesquisa feitos por outros países também devem ser vistos com bons olhos por toda a comunidade internacional, não só pela decisiva e comprovada redução dos gases do efeito estufa que o uso da bioenergia trará ao planeta, mas especialmente pelo desenvolvimento que tais iniciativas trarão a esse mercado como um todo. Um dos mais graves entraves à confiança do consumidor e à consolidação do mercado interno de etanol ainda reside no fato de o governo não cumprir, como faz com outros combustíveis, a prerrogativa de criar estoques reguladores e estratégicos. Quanto ao programa do biodiesel, ainda é discutível o desenvolvimento que as culturas de certas oleaginosas poderão trazer a determinadas regiões do País, dado que já existem exemplos de áreas de cultivo de alimentos e de vegetações nativas, como a caatinga, sendo substituídas por aquelas plantas destinadas à produção do biodiesel.

Essas foram algumas das conclusões apresentadas no seminário Perspectivas da Agroenergia no Brasil: Interação entre Estado e Sociedade Civil no Século 21, realizado no dia 18 de setembro na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba. Com o objetivo de analisar as novas relações constituídas no atual cenário brasileiro e mundial com a expansão da bioenergia, o encontro reuniu docentes e pesquisadores da USP, Unicamp e Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), além de agentes e interlocutores do setor, como Antonio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Unica), Paulo de Tarso Costa, executivo de comercialização de álcool e oxigenados da Petrobras, Marcos Farhat, da Cooperativa dos Plantadores de Cana do Estado de São Paulo (Coplana), Alex Garbelini, procurador regional do Ministério do Trabalho de Campinas, Raimundo Pires da Silva, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), e Elísio Contini, assessor de gestão estratégica do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, entre outros.

Ambições sociais – Mesmo com uma taxa de crescimento entre 4% e 5% ao ano e um aumento de 218% nas exportações do etanol brasileiro no período 2003-2004, a produção nacional do produto deverá ser alcançada em 2007 pelos Estados Unidos. Nos anos seguintes, será superada, apesar de o etanol norte-americano ser extraído a partir do milho, que possui custos maiores de produção e taxas menores de unidade de energia, comparado à cana, demonstrou o professor Luiz Fernando Paulillo, da Ufscar, a partir do relatório “Análise da Competitividade das Cadeias de Agroenergia no Brasil”, produzido por um grupo de pesquisadores para o Ministério da Agricultura.

créditos: francisco emolo
Vian: ainda há muitas indefinições

O mundo está preocupado com o Protocolo de Kyoto e a redução da dependência de matrizes energéticas de origem fóssil, como petróleo e carvão. Por isso o mercado bioenergético vem crescendo e o assunto é discutido como nunca. “O diferencial deste em relação a muitos eventos que têm ocorrido recentemente sobre bioenergia é que buscamos dar um tratamento adequado para o foco produtivo, aliado ao ambiental e trabalhista, promovendo uma interação entre os atores sociais e discutindo ações possíveis de se tomar em conjunto”, disse o coordenador do seminário, Carlos Eduardo de Freitas Vian, professor do Departamento de Economia, Administração e Sociologia da Esalq. “Não é possível pensar em qualquer atividade produtiva sem o tripé da sustentabilidade econômica, ambiental e social”, destacou o diretor técnico da Unica, Antonio de Pádua Rodrigues (leia entrevista na página seguinte).

Tarso Costa, da Petrobras, também frisou que os contratos de longo prazo com as distribuidoras de combustíveis dariam maiores garantias ao consumidor brasileiro. Segundo o executivo, já existem tanques para o armazenamento de etanol e projetos adiantados para a construção de alcooldutos e hidrovias, com vistas a escoar a crescente produção do centro-sul. “Só falta tirar do papel”, disse Costa, em sua apresentação.

créditos: francisco emolo
O seminário na Esalq, em Piracicaba: entrada de grupos estrangeiros e investimentos em pesquisas feitos por outros países são importantes para o setor, avaliam especialistas

Todos os elos da cadeia produtiva da cana-de-açúcar têm ganhado, mas são mínimos os reflexos desses lucros para a mão-de-obra, que convive com insalubridade e supressão corriqueira dos direitos trabalhistas, lembrou o procurador Alex Garbelini.

No painel sobre biodiesel, o professor Weber Amaral, do Pólo Nacional de Biodiesel, da Esalq, falou sobre o papel do organismo, criado há cerca de um ano, de “facilitador” e “aglutinador” de idéias e ações que promovam o desenvolvimento do setor no País. Uma fábrica de biocombustível está sendo construída em Piracicaba e já existem projetos de usinas pensados com unidades produtoras de biodiesel acopladas à refinaria. Mesmo assim, Amaral frisou as incertezas sobre o programa de o biodiesel atingir a meta de produzir 800 milhões de litros até 2008, como o governo federal anunciou no lançamento do programa. “Não vejo essa perspectiva, especialmente se as especificações da Agência Nacional de Petróleo (ANP) tiverem que ser seguidas à risca”, afirmou. Segundo o professor, ainda é necessário estruturar um esquema de fiscalização para que áreas de cultivo de alimentos e vegetação nativa não se transformem em monoculturas de oleaginosas.

“Precisamos cuidar para que o álcool e o biodiesel não fiquem atrelados somente aos preços do petróleo. A sociedade deve estar atenta para que o programa do biodiesel não se transforme num novo Proálcool, que frustrou suas ambições sociais e morreu agonizante. Além do mais, ainda existem muitas indefinições quanto às regras para investidores e bancos”, disse o professor Carlos Vian, que expôs o panorama sobre o biodiesel no Brasil e no mundo.


 

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