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Créditos: Francisco Emolo

Pesquisadores do Departamento de Engenharia Naval e Oceânica da Escola Politécnica da USP desenvolveram o Simulador Digital de Manobras de Navios em Águas Rasas e Restritas, que pode aumentar a segurança e efetividade das manobras nos portos do País. O programa promete diminuir o tempo e os custos dessas manobras, agilizando a operação dos portos, que hoje são responsáveis pela maior porcentagem do escoamento de produtos brasileiros para o exterior.

O software começou a ser desenvolvido em 1989, como trabalho de mestrado do coordenador do projeto, Jessé Rebello de Souza Júnior. Na época, o terminal de Alemoa, em Santos, enfrentava problemas de correntes de maré, que prejudicavam a atracação dos barcos, atirando-os contra o terminal. Assim, a Capitania dos Portos proibiu as operações no terminal em todo o período no qual a maré estivesse subindo ou descendo. “Eles perdiam muito dinheiro porque só podiam trabalhar com a maré parada. Então eles nos contataram e pediram que fizéssemos um estudo da situação. Foi aí que desenvolvemos este programa, com as condições de operação de lá”, explica Souza Júnior.

Nos 17 anos seguintes, com a ajuda do professor Hélio Morishita e do pesquisador Eduardo Tannuri, Souza Júnior foi aperfeiçoando o programa e incorporando novas situações estudadas por outros pesquisadores do departamento. “Aquela primeira versão era bem preliminar. Nesta versão, utilizamos um modelo matemático completamente diferente, derivado de estudos de manobra que foram feitos para navios petroleiros”, diz o professor.

A nova versão simula manobras em águas restritas (quando a lateral do navio passa muito próximo de um obstáculo, como uma parede ou mesmo outro navio) e águas rasas (quando ele está navegando muito perto do fundo). “Não é um programa de computador comum, que se compra. Ele é uma ferramenta de trabalho dentro de uma metodologia empregada por cada empresa de acordo com os problemas que ela enfrenta. Essas condições das águas exigem uma mudança no comportamento do navio, que pode ser simulada pelo programa, de acordo com as restrições e dificuldades específicas daquela situação”, explica Souza Júnior.

Créditos: Cecília Bastos

Como todo simulador, o software reproduz na tela do computador o comportamento dinâmico real do navio, atualizado com as dimensões, forma e peso do casco do navio, tamanho, posição e velocidade de acionamento do leme e dados dos propulsores e mesmo dos ventos e das correntezas da região. O programa permite simular perfeitamente qualquer situação que ocorra nos portos brasileiros, sem nenhum custo ou risco para as empresas. “Foi importante adicionar essa análise de águas rasas e restritas porque, quando passam com uma velocidade razoável pelo canal de acesso aos terminais, os navios são sugados uns em direção aos outros. Da mesma forma, se você navega com um navio próximo ao fundo, a tendência dele é afundar mais um pouco. Por isso temos que calcular esse efeito e as distâncias mínimas, para evitar acidentes”, diz Souza Júnior.

Com todos os dados do navio e das condições do porto, o software é capaz de simular os movimentos horizontais das embarcações, que são realizados durante as manobras de atracação e desatracação nos terminais. Esses movimentos são de avanço, para frente e para trás, de deriva, para os lados e o movimento de guinada, o giro do navio em torno de um eixo vertical. O Simulador de Manobras de Navios em Águas Rasas e Restritas será apresentado no 21o Congresso Nacional de Transportes Marítimos, Construção Naval e Off-Shore, que ocorre nesta semana no Rio de Janeiro.

Aplicações – Graças ao seu realismo, o simulador pode ser aplicado na resolução de um grande número de problemas técnicos, como a determinação de condições ambientais-limite para a operação de um terminal, desenvolvimento de métodos para aumentar a eficiência nas manobras ou mesmo para a análise de risco de colisão em determinadas manobras. “Toda vez que você tem um problema desse tipo, em que é arriscado testar com o próprio navio porque há um dano potencial muito grande, você pode usar o simulador”, resume Souza Júnior.

Assim como as versões mais antigas, o novo software foi desenvolvido a pedido de empresas privadas, que vivenciam problemas na atracação e desatracação de navios nesse tipo específico de águas. Entre elas está a Companhia Vale do Rio Doce. Acostumada a trabalhar com grandes navios graneleiros (que carregam grandes cargas a granel), a Vale queria entrar no porto de Vitória (ES) com um navio ainda maior. “O navio é muito grande e por isso iria passar perto tanto do fundo do mar quanto da lateral do terminal e de outros navios. Nós incorporamos os efeitos de água rasa e restrita especialmente para poder responder se esse navio poderia entrar com segurança ou não”, conta Souza Júnior.

Além da simulação da atracação do navio, a Vale precisava determinar a área e o volume de dragagem do assoreamento do fundo do rio, para que o navio tivesse espaço suficiente para fazer a manobra de giro. “Isso custa tempo e dinheiro e por isso a empresa quer saber qual a área mínima necessária para o navio poder efetuar sua manobra sem riscos. Não há uma fórmula matemática simples para isso. É preciso simular a situação para poder determinar a bacia de evolução (local onde se faz essa manobra)”, afirma Souza Júnior.

Com o sucesso da simulação nesses casos, a Vale quer acoplar o simulador criado pela equipe da Poli ao seu modelo de logística, já utilizado em seus terminais. Esse modelo simula de forma simplificada todas as operações do terminal, entre elas a chegada e saída dos navios. “No modelo da empresa, as manobras dos navios são feitas de maneira muito simplificada. Para ela, pareceu interessante acoplar o nosso Simulador de Manobras ao seu modelo, para que tivesse um maior grau de realismo”, adianta Souza Júnior.

Outra empresa que já utiliza o simulador em suas operações é a Aracruz. Produtora de celulose, a empresa desejava aumentar a velocidade e eficiência das manobras de comboios de chatas entre seus terminais em Caravelas, extremo sul da Bahia, e Portocel, no norte do Espírito Santo. Devido à dificuldade desse tipo de manobra, os terminais têm movimentado uma quantidade de carga menor do que a planejada inicialmente. “A Aracruz tem também um problema no transporte da mercadoria de um terminal ao outro. Ela usa barcaças que, por não se comportarem bem no mar, devem ser operadas a baixa velocidade. É um estudo que não fizemos ainda, um estudo acoplado de comportamento no mar, que dependerá do interesse da Aracruz para que o façamos. Este é o diferencial do simulador: ele sempre pode ser aperfeiçoado, acrescentando novas situações que não tínhamos pensado antes”, conclui Souza Júnior.

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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