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© Francisco EmoloA Cidade Universitária acaba de ganhar uma nova obra de arte. Finalizada na semana passada, a Coluna Civilizatória está instalada entre o Instituto de Matemática e Estatística (IME) e o Instituto Oceanográfico (IO), em comemoração ao Dia do Meio Ambiente, celebrado mundialmente em 5 de junho.

Construída a partir de resíduos plásticos e terra crua, a Coluna simboliza a participação da Universidade no projeto Lixo Zero = Arquitetura Sustentável. Desenvolvido pelos arquitetos Sérgio Prado e Márcia Macul, em parceria com o Centro de Estudos de Construções Sustentáveis da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, o projeto desenvolve uma alternativa barata e ecológica para a construção de casas populares e espaços públicos. “Como matéria-prima, nós usamos a terra para construir tijolos e paredes e resíduos plásticos e minerais para construir vigas e janelas. Tudo vem do próprio local e utiliza o trabalho da própria comunidade. Como são materiais rejeitados, o custo é praticamente zero”, explica Márcia.

Mais do que uma obra a ser contemplada, a Coluna Civilizatória é um marco, para toda a comunidade universitária, das possibilidades de aproveitamento dos resíduos inorgânicos que se acumulam na cidade. “Lixo não existe. É uma questão de falta de cultura de saber aproveitá-lo. O vinicultor não joga fora vinho azedo, ele o utiliza como vinagre”, compara Sérgio Prado.

A Coluna Civilizatória foi construída com o dinheiro recebido pelos arquitetos como prêmio do Concurso de Apoio a Produção nas áreas de Artes Visuais, Fotografia e Novas Mídias, promovido pela Secretaria de Cultura do Estado. “O apoio de uma instituição como a USP torna o nosso projeto mais forte e mais viável, além de ser uma forma de ensinar uma preciosa lição de reaproveitamento para os futuros arquitetos e engenheiros”, afirma Prado.

© Francisco Emolo
Os arquitetos Sérgio Prado e Márcia Macul:
“O lixo não existe”

Exposição – A parceria dos arquitetos com a Universidade renderá também uma exposição no Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP, intitulada “A Arte de Ocupar o Mundo”. Nela, os arquitetos convidam o visitante a ser parte ativa da arte e propor soluções ambientais para o lixo, seja na arte ou na arquitetura. Com instalações arquitetônicas e obras de arte feitas a partir de plástico e outros materiais não-biodegradáveis, os arquitetos pretendem criar uma nova dinâmica de interação dentro do museu, como uma forma de incitar um comportamento mais sustentável. “A exposição vai trazer também telas e painéis levantando os problemas ambientais que levarão o visitante a interagir diretamente com seu meio e seu entorno. É uma forma de arte cidadã, indispensável nesta época de aquecimento global, em que é cada vez mais visível a necessidade de mudança de comportamento entre os homens e o ambiente”, conta Márcia. Com verba da Lei Rouanet de apoio à cultura, a exposição deverá ser montada em 2008.

Também no ano que vem, a convite da FAU, os arquitetos participarão de um fórum com o tema Lixo Zero = Arquitetura Sustentável, que trará produtos, projetos e pesquisas na área, além de palestras de especialistas em tecnologias sustentáveis. “Nós queremos difundir o tema da sustentabilidade a todos os graduandos da Universidade, trazendo bons exemplos de tecnologia construtivas não-convencionais”, explica Prado.

Apoiados pelo Departamento de Patrimônio Histórico da Prefeitura de São Paulo, Márcia Macul e Sérgio Prado construirão outras 32 Colunas Civilizatórias, uma em cada Subprefeitura da capital paulista. “A idéia é que a população veja como o lixo pode ser aproveitado de maneira muito útil à sociedade. Que entenda que esses resíduos não são meramente lixo e sim matérias-primas para muitas coisas”, afirma Sérgio Prado.

As obras serão também uma forma de divulgar para a população essa técnica inovadora de construção, que será ensinada gratuitamente nas Escolas de Sustentabilidade, a serem construídas nos bairros da cidade. “Será um espaço também de lazer e cultura porque nosso objetivo é unir sempre o social ao sustentável”, acrescenta Prado.

A dupla de arquitetos já está desenvolvendo o projeto da primeira escola, que será construída com o método criado por eles em um terreno de 2.400 m² na Casa Verde, cedido pelo subprefeito da região, Marcos Gadelho. “Aos poucos estamos ampliando o nosso projeto. Essa primeira escola servirá de modelo para as outras Subprefeituras e até mesmo para outras cidades interessadas no conceito de arquitetura sustentável”, afirma Márcia.

Bioeconomia – Para os dois arquitetos, o grande diferencial desse conceito está na união do social com o ambiental, idéias ainda antagônicas na maioria dos projetos mundiais. “O que vemos hoje são projetos que protegem o ambiente impedindo que qualquer atividade econômica seja desenvolvida na região ou aumentam a oferta de empregos consumindo ainda mais os escassos recursos naturais. Já o nosso projeto tem um caráter ecológico sem abandonar a inclusão social”, explica Prado.

Mais do que uma técnica de construção civil, eles querem criar um novo mercado em torno dos resíduos plásticos e minerais, uma bioeconomia que oferece um destino a toneladas de lixo não- biodegradável, além de casas de baixo custo e emprego para a comunidade local. A idéia dos arquitetos é que as pessoas que coletam o plástico o levem aos ecopontos da Prefeitura (que recolhem lixo reciclável) e troquem pelos materiais de construção produzidos com a técnica. Esse material pode ser utilizado pela própria pessoa ou vendido, gerando assim uma cadeia produtiva. “O objetivo último é criar e estabelecer uma nova forma de cidadania social e ambientalmente correta, gerando empregos nas comunidades e adequando e reconstruindo bairros e cidades de acordo com os princípios do desenvolvimento sustentável”, conclui Márcia.


Técnica foi testada em Camburi

© Francisco EmoloA técnica de construção adotada na Coluna Civilizatória foi utilizada pelos arquitetos Sérgio Prado e Márcia Macul em uma comunidade de baixa renda na cidade de Camburi, no litoral norte paulista. Aproveitando os recursos do local, eles construíram um centro comunitário para a população. “Tudo foi feito com o que tinha lá. A terra era a do local e o lixo foi o recolhido dos diversos campings da região. Nem ao menos havia energia elétrica e nós não precisamos, porque o nosso método é todo feito manualmente”, explica Márcia.

As paredes foram construídas com taipa de pilão, na qual se utiliza uma espécie de caixa de madeira que é preenchida com terra crua extraída do próprio local. Esse tipo de construção, segundo Márcia, não exige revestimento ou qualquer outro produto químico e tem uma durabilidade muito maior que a do cimento, além de não reter calor ou umidade. “A taipa é extremamente resistente e pode suportar uma construção de até oito andares. Ela substitui o concreto perfeitamente e com ainda mais vantagens, já que não se gastou energia ou dinheiro na fabricação da terra e nem mesmo no transporte, pois ela é retirada do próprio local”, explica.

Já as janelas foram construídas com o empilhamento de garrafas de plástico. O plástico veda a passagem de água da chuva ou vento, mas permite a passagem da luz solar. “As garrafas também podem ser usadas como sistema de cultivo de horta por hidroponia (cultivo de plantas em água) ou também como um sistema de recolhimento de água da chuva para uso dos moradores. Além de ser visualmente muito bonito”, afirma Márcia.
As garrafas são coladas com poliuretano vegetal, feito a partir de plantas oleaginosas como a mamona. A extração desse tipo de óleo gasta menos energia e produz menos poluição que o poliuretano normalmente utilizado.

A técnica foi muito bem-sucedida na comunidade e pode, de acordo com os arquitetos, ser facilmente aplicada nos grandes conjuntos habitacionais construídos pela Prefeitura. Para tal, eles aguardam a aprovação dessas técnicas e materiais pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). “O IPT está fazendo todos os testes para normatizar e liberar o uso desses materiais para grandes construções. Será um grande passo no caminho de uma cidade social e ambientalmente sustentável”, espera Márcia.
Para Prado, a idéia de uma arquitetura sustentável é muito simples e lógica. “Já que o plástico não é biodegradável, por que não usá-lo em algo duradouro como uma construção?”, questiona.

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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