Com o intuito de divulgar o Projeto Pedagógico
de Formação de Professores Indígenas, que
acontece na Faculdade de Educação da USP desde 2005,
será realizado nesta quarta e quinta-feira, dias 15 e 16,
o Colóquio Formação Intercultural Superior
de Professores Indígenas do Estado de São Paulo.
O encontro ocorre no auditório da Escola de Aplicação
da Faculdade de Educação.
O evento, segundo a coordenadora, professora Maria
do Carmo Santos Domite, quer mostrar aos alunos e professores da
USP como se constitui, se estrutura e se desenvolve o curso de
formação
superior dos indígenas. “Queremos promover uma reflexão
conjunta entre academia, órgão públicos e
indígenas”, ressalta a professora. A primeira mesa-redonda, no dia 15, tratará de “Políticas
de formação de professores indígenas no Brasil”,
com a abordagem de pessoas ligadas ao governo federal e do Estado.
Kleber Gesteira Mattos, coordenador do Núcleo de Educação
Indígena do Ministério da Educação,
Francisca Pareci, indígena e membro da Comissão Nacional
de Política Indigenista, Ruth Montserrat, da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, e Deusdith Velloso, da Secretaria de
Estado da Educação de São Paulo, responsável
pela formação do professor indígena do Estado,
falarão sobre as dificuldades, possibilidades e leis que
gerenciam atualmente a área de educação indígena
no País.
Professores indígenas sendo aperfeiçoados na USP:
curso atende atualmente 82 docentes de 30 aldeias
do Estado
de São Paulo Minorias – “Formação de professores
e minorias no Brasil”, a segunda mesa-redonda, terá um
professor indígena falando de jovens e adultos das aldeias
e a professora Lisete Regina Gomes Arelaro, da Faculdade de Educação,
mostrará a situação educacional dos camponeses.
Neusa Gusmão, da Faculdade de Educação da
Unicamp, conversará sobre os negros e a qualidade do ensino,
Luis Donizete Benzi Grupioni, da USP, explicará a educação
dos indígenas. “É uma mesa diferenciada, porque
são pessoas que trabalham direto com a formação
dos indígenas. Esses grupos estão fazendo a educação
diferenciada, levando em consideração a interculturalidade,
a cultura do grupo e a cultura de um modo geral. É bilíngüe
e bicultural, fala da história, dos rituais, das atitudes,
da tradição, da cultura e do artesanato”, diz
Maria do Carmo.
Na terceira mesa-redonda “Formação Intercultural
Superior dos Professores Indígenas do Estado de São
Paulo: em foco as alunas e os alunos-professores indígenas”,
contará com a participação dos próprios
professores indígenas, de cinco etnias, guarani, kaingang,
krenak, terena e tupi-guarani, contando suas experiências
como professores na aldeia.
A última mesa-redonda, “Formação Intercultural
Superior dos Professores Indígenas no Estado de SP: a formação
em si”, traz para discussão os coordenadores do curso. “Todos
trabalham na coordenação e também ministram
aula. Será uma mesa para tratar de assuntos específicos
do curso. A professora Idméia Semeghini Siqueira conversará sobre
a relação entre a língua portuguesa e a indígena
e a professora Circe Bittencourt fará uma contextualização
da história e da educação indígena.” Um
ponto de destaque do curso de formação é uma
das disciplinas ministradas pelo idoso da aldeia. “Temos
alguns idosos que dão aulas sobre a etnia deles, em geral
acompanhados de um antropólogo que conhece a história
de vida dessa etnia”, explica Maria do Carmo.
Curso tem duração de três
anos
O Curso de Formação Superior para
Professores Indígenas oferecido pela Faculdade de Educação
da USP tem duração de três anos, com início
em maio de 2005 e término em abril de 2008. Está atendendo
atualmente 82 alunos-professores, homens e mulheres de 30 aldeias
indígenas do Estado de São Paulo, que passaram pelo
magistério indígena, curso oferecido pelo Estado
entre 2001 e 2003. É estruturado em oito módulos
de seis disciplinas cada, num total de 48 matérias.
A seleção do aluno-professor é feita pela
própria comunidade, que é quem decide qual indígena
deve ser formado para atuar na aldeia posteriormente. Para isso
eles partem de alguns critérios, como melhor falador da
língua nativa, ter feito ensino médio ou magistério
indígena e ter jeito para lidar no atendimento com crianças.
O curso é promovido pelo governo estadual, que banca todos
os custos de transporte, hospedagem, alimentação,
algum tratamento mais urgente de saúde e bolsa de estudo.
Durante sete dias por mês os indígenas vêm para
a USP, com vans que vão buscá-los nas aldeias, ficam
hospedados em hotel e participam das aulas. “O curso está aprimorando
o conhecimento deles. Muitos já atuam na escola da aldeia
e aproveitam para ter mais experiência para aplicar posteriormente”,
explica a professora Maria do Carmo Santos Domite, da Faculdade
de Educação da USP, coordenadora do curso.
A questão da formação superior para professores
de magistério é uma exigência da Lei de Diretrizes
e Bases da educação, que solicita uma formação
pautada no respeito à diversidade para a construção
de uma sociedade mais tolerante, compreensiva, sem discriminação
e preconceito.
Outra face do curso é a ida dos professores da Faculdade
de Educação até as aldeias, onde fazem um
trabalho de cunho de orientação e apoio pedagógico.
Participam das atividades da escola, conhecem de perto os hábitos
e costumes da população e interagem com a comunidade.
Para Maria do Carmo, o curso é muito rico porque, além
das aulas presenciais e da visita à aldeia, os alunos-professores,
quando estão em São Paulo, vão a museus, bibliotecas,
exposições, shows e fazem pesquisas sobre tradições
e costumes.
Os 80 alunos são divididos em três turmas de 28. Além
do professor da disciplina, para cada turma há uma professora
orientadora que os acompanha desde o início do curso. A
professora-orientadora ajuda o grupo em vários momentos,
desde ouvir os problemas que trazem da aldeia até a construção
do trabalho de conclusão de curso. “Elas fazem o ‘meio
de campo’, dão suporte para qualquer problema, o que
faz com que o aluno se sinta mais seguro diante das adversidades”,
explica Claudia Geórgia Sabba, coordenadora pedagógica
administrativa.
O currículo das disciplinas é parecido com o de Pedagogia
em alguns aspectos. O diferencial da formação é que
não é um curso de pedagogia normal, mas tem a preocupação
de permitir que o professor indígena construa a escola da
aldeia a partir da sua própria cultura. “Eles têm
autonomia”, conta Maria do Carmo.
Outro diferencial é a disciplina de tradição
oral, que busca na experiência do idoso resgatar a língua
materna e a cultura. Para isso, um indígena idoso recebe
uma bolsa de estudos para ajudar o professor a manter a tradição
da língua da aldeia e passar costumes, hábitos, cantigas,
lendas e artesanato para os alunos.
A coordenadora explica também que no início do curso
foi muito difícil para os jovens professores indígenas,
com uma média de 22 anos, ficarem fora da aldeia por muito
tempo. “Muitos tiveram que enfrentar os deslocamentos de
poder na comunidade, tanto pelo fato de serem remunerados como
por estarem fazendo um curso, além de sentirem dificuldade
para adaptar o conteúdo para a sala de aula da aldeia. Depois
de um ano e meio já estão mais confiantes.”
|