O documentário Milton Santos ou: O Mundo Global Visto do
Lado de Cá (2006, 89 min) toma como base uma entrevista
com o geógrafo, feita em janeiro de 2001, pouco antes de
sua morte, para discutir de maneira crítica o processo da
globalização, do ponto de vista da periferia. Dirigido
por Silvio Tendler, também responsável por Os Anos
JK, uma Trajetória Política (1980) e Jango (1984),
o filme faz um panorama do mundo atual, em que a antiga batalha
entre capitalistas e comunistas foi substituída pelos conflitos
entre ricos e pobres e entre grandes empresas e três quartos
da população mundial. Premiado como Melhor Filme
pelo júri popular no Festival de Brasília, no ano
passado, também traz entrevistas com colegas, discípulos,
amigos e intelectuais de outros países que falam sobre o
pensamento desse expoente do século 20.
Milton Santos, professor de Geografia da USP até sua morte,
em 2001, é considerado um dos maiores geógrafos do
Brasil. Nascido em Brotas de Macaúbas em 1926, neto de escravos
e filho de professores, foi alfabetizado em casa, pelos pais. Formou-se
em Direito em 1948 e tornou-se doutor em Geografia na França,
dez anos depois. Com o golpe militar, em 1964, ele foi preso e
exilado, passando mais de dez anos em países como França,
Estados Unidos, Canadá, Peru, Venezuela e Tanzânia,
onde lecionou em diversas universidades. Com sua volta ao Brasil,
em 1978, tornou-se uma das principais referências nacionais
na luta contra o projeto neoliberal.
O diretor Silvio Tendler com Fernanda Montenegro, uma das narradoras
do filme
O diretor, que projetava fazer um filme a partir das idéias
do professor desde 1995, só conseguiu entrevistá-lo
seis anos depois. A conversa é o ponto central da produção,
estabelecendo as fundações do panorama apresentado
ao longo da obra. As distorções impostas aos países
pobres, que pagam injustamente pelo crescimento da economia dos
países ricos, e as conseqüências provenientes
da lógica capitalista, que amplia as diferenças em
vez de distribuir as riquezas, são contrabalançadas
com o novo mundo sinalizado por Milton Santos, onde a união
entre as “novas tecnologias” e a classes baixas podem
trazer um futuro distinto para a humanidade. “De fato, se
desejarmos escapar à crença de que esse mundo assim
apresentado é verdadeiro, e não queremos admitir
a permanência de sua percepção enganosa, devemos
considerar a existência de pelo menos três mundos num
só. O primeiro seria o mundo tal como nos fazem vê-lo:
a globalização como fábula; o segundo seria
o mundo tal como ele é: a globalização como
perversidade; e o terceiro, o mundo como ele pode ser: uma outra
globalização”, afirma o professor em um dos
trechos da entrevista presentes no filme.
Os conflitos existentes no mundo atual, evidenciados pela nova
divisão internacional do trabalho, com a exploração
de mão-de-obra barata por empresas milionárias, os
muros que separam os países pobres dos países ricos
e a privatização de setores estratégicos,
como a água, em diversos países, são desnudados
pelo geógrafo em seus depoimentos, que apontam a informação
como núcleo do mundo global. “Eu creio que a chamada
mídia tem um papel de intermediação que a
gente talvez não possa dizer que é inocente, mas
não parte dela realmente, ou não é dela o
poder. O poder é de um pequeno número de agentes
internacionais da informação (...), que controla
de maneira extremamente eficaz a interpretação do
que está se passando no mundo”, diz Milton Santos.
Os próprios meios de comunicação, entretanto,
são apontados no filme como uma ferramenta para o alcance
de um mundo mais humano. As novas tecnologias de informática,
apropriadas por pequenos grupos de maneira progressivamente maior,
podem revelar fatos desconhecidos para grande parte das pessoas,
apresentando um novo olhar. “Creio que as condições
da história atual permitem ver que outra realidade é possível.
Essa outra realidade é boa para a maior parte da sociedade.
Nesse sentido, a gente é otimista. A gente é pessimista
quanto ao que está aí. Mas é otimista quanto
ao que pode chegar.”
Filmes pernambucanos
Dando continuidade à mostra “Retrospectiva do Cinema
Pernambucano – 1993-2007” – que reúne
longas e curtas-metragens que mostram o vigor dessa produção – serão
exibidos nesta semana Cinema, Aspirinas e Urubus (2005), de Marcelo
Gomes, que se passa em 1942, no meio do sertão nordestino,
onde dois homens vindos de mundos diferentes se encontram (segunda
e quinta, às 16h, terça e sexta, às 19h);
e Rap do Pequeno Príncipe Contra as Almas Sebosas (2000),
de Paulo Caldas e Marcelo Luna, sobre dois jovens, um justiceiro
e um músico, que vivem em um universo de violência
(segunda e quinta, às 19h, e terça e quarta, às
16h). E ainda a segunda sessão de curtas, entre eles, Clandestina
Felicidade (1998), de Beto Normal e Marcelo Gomes, a partir de
fragmentos da infância da escritora Clarice Lispector, em
Recife, em 1929; e O Mundo é uma Cabeça (2005), de
Bidu Queiróz e Cláudio Barroso, mostrando o movimento
do manguebeat, que eclodiu no início dos anos 90, tendo
como protagonista Chico Science. (quarta, às 19h, e sexta, às
16h). No Cinusp (r. do Anfiteatro, 181, favo 4 das Colméias,
Cidade Universitária, tel. 3091-3540). Grátis.
Jogos do Olhar
A oficina Jogos do Olhar, projeto de pesquisa de mestrado de Verônica
Veloso na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da
USP, com apoio da Fapesp e da Cinemateca Brasileira, tem como objetivo
o fazer teatral através do cinema. Nessa primeira fase,
são exibidos filmes seguidos de debates: Toda Nudez Será Castigada
(Brasil, 1973), de Arnaldo Jabor, com a participação
de Rubens Rewald e Pedro Granato (ambos da ECA), nesta quarta;
O Bandido da Luz Vermelha (Brasil, 1968), de Rogério Sganzerla,
com debate do professor Francisco Alambert (FFLCH/USP) e Fábio
Uchôa (mestrando da ECA), no dia 22 de agosto; e São
Paulo S/A (Brasil, 1965), de Luiz Sérgio Person, com o professor
Rubens Machado (ECA) e o coletivo Jogos do Olhar, no dia 29 de
agosto. O grupo formado por 12 jogadores dirigidos por Verônica
Veloso parte dos filmes para a realização de uma
peça, que está na fase de ensaios, com previsão
de estréia em dezembro deste ano. Sempre às 19h30,
no Auditório Paulo Emílio da ECA (av. Prof. Lúcio
Martins Rodrigues, 443, prédio central, 2o andar, Cidade
Universitária). Entrada gratuita.
Mizoguchi & Ozu
O ciclo, que acontece a partir de terça, traz uma amostra
do trabalho de dois diretores que são referência do
cinema japonês: Yasujiro Ozu e Kenji Mizoguchi. Abrindo a
programação, A Rotina tem seu Encanto (1962), de
Ozu, sobre um viúvo que leva uma vida tranqüila, e
durante uma festa descobre a filha de seu professor, amarga e triste
por não ter se casado, fazendo-o pensar em sua própria
filha (às 16h); O Intendente Sansho (1954), de Mizoguchi,
que se passa no final do século 11, quando uma mulher da
aristocracia viaja para uma praia, acompanhada por seus filhos
e uma serva, e é enganada por mercadores escravos, que vendem
as duas crianças a um cruel intendente (às 18h);
e Filho Único (1936), primeiro filme falado de Ozu, sobre
uma mãe solteira, operária, que sofre para criar
seu filho, que já adulto se muda para Tóquio para
cursar medicina, mas quando ela vai visitá-lo descobre um
homem desempregado, casado e morando em um subúrbio (às
20h15). No Centro Cultural São Paulo (r. Vergueiro, 1.000,
Paraíso, tel. 3383-3402). Grátis. Programação
completa em www.centrocultural.sp.gov.br.
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