Como as andorinhas que aos bandos fazem o verão (e em setembro elas estão chegando), a Escola Politécnica da USP, unindo conhecimentos gerados em cada um dos seus 15 departamentos, faz projetos interdisciplinares como o do ambiente virtual destinado ao treinamento de condutores de trens. Coordenado pelo professor Roberto Spinola Barbosa, engenheiro mecânico e professor do Departamento de Engenharia Mecânica especializado em dinâmica veicular, o projeto associa conhecimentos das áreas de energia elétrica, mecânica, modelos matemáticos, programação de computadores, motores elétricos, rodas, truques, etc., com o objetivo de simular o mesmo ambiente que o condutor vai encontrar na realidade, quanto estiver no comando do trem do Metrô ou de qualquer outro, de carga, de turismo, de longa ou curta distância.

Foto crédito: Cecília Bastos

De acordo com Barbosa, trata-se de uma capacitação disponível na USP em função dos desenvolvimentos e das especialidades dos pesquisadores da Poli. O treinamento de condutores de trens demanda um tipo de ferramenta similar às usadas nos simuladores de vôo de avião, que consistem numa réplica dos comandos instalados nas cabines, mas associados com programas de computador. São esses programas que conseguem simular aquilo que o avião estaria fazendo quando em vôo real e o que o piloto deve fazer para que o aparelho levante vôo, voe e pouse com segurança.


Nacionalizar – A tecnologia dos simuladores de vôos aéreos ou mesmo de operação de trens e outros tipos de máquinas não é nova. Foi desenvolvida por outros países e é usada no Brasil. Algumas empresas, principalmente do ramo ferroviário, treinam seus funcionários em simuladores próprios. Quanto à Politécnica, o objetivo das pesquisas é sistematizar, atualizar e melhorar esse conhecimento e colocá-lo à disposição das operadoras nacionais que ainda recorrem à importação do sistema. Entre as vantagens da nacionalização da tecnologia o professor cita a visualização tridimensional na tela do computador, que aumenta sobremaneira a capacidade didática do sistema.

Quando completo, o ambiente virtual para treinamento de condutores de trens consistirá numa cabine real com comandos reais e com a opção de transformar isso em ambiente virtual. Assim, o relógio indicador de velocidade pode ser analógico com mostrador real, ou ser desenhado na tela do computador, executando a função do relógio real. Barbosa explica que, como o objetivo do projeto é simular o mesmo ambiente que o condutor irá encontrar na realidade, tudo deve ser concebido para dar a noção exata de uma situação real: a forma dos comandos, o peso das alavancas, a dificuldade que o condutor terá para movimentá-las, a imagem do cenário onde o condutor se encontra. A imagem precisa ser processada em tempo real; se o trem está em movimento a imagem de tudo que há do lado de fora passará rapidamente. O movimento merece especial atenção: numa composição do Metrô há seis carros que têm pesos, freios, motores elétricos, e tudo tem que ser modelado matematicamente, para que os cálculos correspondam ao movimento real esperado. Ainda no caso de trem de Metrô, haverá simulação de túneis, plataformas, pessoas esperando pelo embarque ou saindo dos vagões. Em situação de treinamento pode-se simular através do computador uma pessoa jogando uma sacola na linha, ou uma pessoa ameaçando se jogar nos trilhos. O candidato a condutor precisa provar que está preparado para frear o trem a tempo de evitar o acidente. Quando se trata, por exemplo, de trem de carga, a composição pode constar de até 300 vagões, existindo interação entre todos os elementos do comboio. Para ser conduzido corretamente, o comboio e seu ambiente devem ser percebidos pelo maquinista no simulador como um todo e em tudo a simulação será uma réplica perfeita da realidade. Claro que a gestão do sistema e a garantia de que funcione com total segurança competem ao Centro de Controle Operacional (CCO), que utiliza softwares para monitorar o movimento dos trens na via, zelando para que um não queira ocupar o lugar do outro ao mesmo tempo. De acordo com o professor, esses programas são concebidos de forma a trabalhar com redundância nas informações coletadas e alto grau de segurança.

Quando a Poli anuncia que tem condições de treinar condutores de trens, não se deve imaginar que haja filas de candidatos esperando para entrar nas cabines de simulação. Não há cabines, pelo menos por enquanto, nem cursos anunciados para ninguém. O projeto de ambiente virtual é uma tentativa de transformar o conhecimento tecnológico em produto que a sociedade possa usar, afirma Barbosa, que trabalha nisso desde o mestrado concluído em 1993 (o doutorado foi numa área mais complexa, de segurança). Às empresas interessadas é que competirá multiplicar os simuladores e com isso conseguir vantagens econômicas. Os condutores de trens, ou de outras formas de transporte, devem zelar por um patrimônio nada desprezível: uma locomotiva custa em torno de US$ 2 milhões e um vagão não fica por menos de R$ 200 mil. Evitar acidentes é lucro.

No mar – No mesmo prédio da Engenharia Mecânica onde se desenvolve o projeto de responsabilidade do professor Roberto Spinola Barbosa, uma pesquisa similar, mas com outros objetivos, do Departamento de Engenharia Naval, está a cargo do professor Kazuo Nishimoto. É o Tanque de Provas Numérico, que faz a simulação de plataformas de extração de petróleo. O TPN é uma parceria entre a Poli/USP, IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), UFRJ, PUC-RJ e Centro de Pesquisas da Petrobras. Desde 2002 pesquisa extração de óleo em águas profundas (mais de 2 mil metros) e prospecta novas jazidas. Uma das inovações mais celebradas introduzida pelo projeto é o desenho de uma plataforma formada por uma só coluna (até então eram mais de uma), o que ameniza os problemas decorrentes das ondas altas e constantes, como é o caso da bacia de Campos. Segundo os pesquisadores, todas as simulações feitas no inédito sistema de monocoluna mostraram que o ganho com a estabilidade e a segurança são grandes.

 
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