A Conferência Nacional de Bioenergia (Bioconfe) – realizada nos dias 26, 27 e 28 de setembro no Hotel Maksoud Plaza, em São Paulo – trouxe contribuições concretas para o debate sobre os biocombustíveis no Brasil. Promovido pela USP e pela Coordenadoria de Comunicação Social (CCS) da Universidade, o encontro descartou a idéia de que as

plantações de cana-de-açúcar para produção de álcool invadirão as áreas agricultáveis, fazendo diminuir a quantidade de alimentos. “Existe área para o setor de bioenergia crescer. Isso já foi mostrado em estudos sobre aptidão agrícola”, afirmou o físico José Goldemberg – ex-reitor da USP e ex-secretário estadual do Meio Ambiente –, que fez a palestra de abertura da conferência.

A Bioconfe mostrou também que há outras alternativas, além da cana, para a produção

de biocombustíveis, como a lenha, o lixo doméstico e os resíduos industriais. “São matérias-primas muito baratas, já que não há mercado para esses produtos”, sugeriu o professor Luiz Augusto Horta Nogueira, da Universidade Federal de Itajubá.

Na área da economia, o encontro insistiu numa medida necessária para o desenvolvimento dos biocombustíveis no Brasil – a redução de impostos. O vice-presidente da General Motors do Brasil, José Carlos da Silveira Pinheiro Neto, lembrou que o sucesso do carro com motor flex no Brasil – que hoje são 4 milhões e até 2012 deverão representar 50% da frota nacional – se deveu à queda do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Medidas como essa, que dependem do governo federal, podem fazer o setor crescer de forma sem precedentes, gerando riquezas e bem-estar para a sociedade, concordaram os especialistas.

Dar incentivos ao setor vale a pena, conforme mostrou no evento o gerente executivo de Desenvolvimento Energético da Petrobras, Mozart Schmitt de Queiroz. Hoje, quando o setor de biocombustíveis dá apenas seus primeiros passos, a cana-de-açúcar movimenta 3,6% do PIB brasileiro e é responsável por nada menos que 4 milhões de empregos diretos e indiretos. “O objetivo da Petrobras é desenvolver projetos que possibilitem a produção de biodiesel ao mesmo custo do diesel mineral. Entre 2008 e 2012, a Petrobras pretende investir cerca de R$ 1,5 bilhão em biocombustíveis”, revelou Schmitt.

Foto crédito: Cecília Bastos
Messias da Costa: fortalecer a bioenergia é o desafio dos pesquisadores

Obstáculos – Mas o setor não é feito só de boas perspectivas. A Bioconfe apontou também os obstáculos que o Brasil enfrenta para se tornar uma potência mundial em bioenergia no século 21. O presidente da Companhia Brasileira de Energia Renovável, Henri Philippe Reichstul, destacou que a produção de biocombustíveis ainda está “muito pulverizada” e que seu custo é maior que o da gasolina. “Além disso, persiste a dúvida se haverá uma oferta sustentada de etanol ao longo dos anos para suprir a demanda, já que o álcool concorre diretamente com o mercado de açúcar.” Para Reichstul, é preciso uma “união de esforços” entre governo, pesquisadores e empresas para vencer as dificuldades de abertura do mercado para o etanol. “Quando isso acontecer, o Brasil poderá despontar como grande fornecedor.”

O professor Weber Amaral, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, disse que os problemas de infra-estrutura – incluindo transporte, armazenagem e distribuição – são um dos entraves à competitividade do País na área da bioenergia. “É preciso desenvolver metodologias para identificar e combater esses gargalos.”

Ações contra esses “gargalos” foram propostas na Bioconfe pelo presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Biodiesel (Abiodiesel), Nivaldo Trama. Ele defendeu a maior organização do governo para promover incentivos ao setor. Sugeriu a utilização de verbas do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) para o financiamento da produção e assistência técnica. Também pediu a desoneração fiscal das usinas esmagadoras de produção do biocombustível. É necessário também, afirmou Trama, a instituição de uma secretaria especial de biocombustíveis para a gestão mais eficiente do setor.

Trama propôs ainda o incentivo do governo e de empresários do setor à pesquisa de oleaginosas não-alimentícias, como o pinhão-manso, uma planta com alto teor de óleo. “O pinhão-manso produz 42% de óleo, enquanto a soja tem só 18%. Tem uma produtividade de 4.200 quilos de grãos por hectare, enquanto a soja produz 3.000”, comparou.

Os problemas do setor podem ser resolvidos com a ajuda da Universidade, através da pesquisa e da formação de recursos humanos, destacou a reitora da USP, Suely Vilela, na abertura da Bioconfe. “O desafio é encontrar caminhos para ampliar a eficiência e manter as atuais vantagens competitivas nas fontes renováveis”, disse Suely, ressaltando a necessidade de preservação do ambiente.

“O desafio histórico dos pesquisadores é, mais uma vez, superar os obstáculos científicos e tecnológicos para consolidar a bioenergia e compartilhá-la com o setor produtivo”, disse o presidente da Bioconfe e coordenador da CCS, professor Wanderley Messias da Costa, também na abertura do encontro.

O Jornal da USP, em reportagem especial, apresenta as principais discussões ocorridas na Bioconfe. Com isso, dá a sua contribuição para o debate, a reflexão e o fortalecimento de um setor – a bioenergia – que pode trazer mais riquezas e mais desenvolvimento para toda a sociedade.

 
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