São imagens que pontuam a trajetória da fotografia moderna e contemporânea. A Moça com Leica, do russo Aleksandr Rodtchenko (1891-1956), pioneiro em ângulos inusitados, o francês Henri Cartier Bresson (1908-2004), conhecido como o “pai do fotojornalismo”, a composição delicada da também pintora e gravadora Alice Brill, que nasceu na Alemanha em

Crédito foto: reprodução

1920 e reside em São Paulo desde 1934, a poética de Geraldo de Barros (1923-1998), artista concreto cujas fotos têm a mesma percepção da anotação gráfica e tramas de seus desenhos. Esses e outros grandes fotógrafos, como Brassaï, Man Ray, Ademar Manarini, Jean Manzon, Hildegard Rosenthal, Robert Doisneau, Jorge de Lima, Thomas Farkas e Geraldo de Barros, vêm propiciando uma aventura visual inusitada.

A exposição “Fotógrafos da Vida Moderna”, lançada no dia 12 de julho no Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP, no Ibirapuera, surpreende por reunir todos os grandes mestres das décadas de 1920 a 1950. E, o mais importante, por trazer essas imagens aliadas à pesquisa da curadora Helouise Costa, que mostra a consolidação da fotografia como o único meio capaz de representar a dinâmica da vida moderna. “Esta exposição apresenta fotos que, direta ou indiretamente, remetem às transformações culturais advindas da

modernização, que transformou a experiência visual do cidadão”, explica Helouise. “Não se tratava de produzir imagens destinadas apenas à contemplação. A fotografia passou a ser entendida prioritariamente como imagem pública de consumo, produzida para circular na forma impressa. É o momento da consolidação de um mercado para a fotografia e da profissionalização da atividade de fotógrafo.”

Helouise observa que as imagens registram o momento em que a fotografia deixa de ser apenas uma tentativa de capturar o real para tornar-se uma atividade de interpretação. “Rompe-se, assim, a antiga incompatibilidade entre documentação e experimentação. Do mesmo modo, caem por terra as fronteiras entre a fotografia como expressão artística e a fotografia aplicada.”

A mostra reúne 150 fotos, sendo 19 do acervo do MAC, 11 do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP e 120 da coleção do Banco Santos, que, desde 2005, está sob a guarda do MAC por determinação judicial da 6a Vara Federal. “A justaposição dessas coleções mostrou-se reveladora, na medida em que nos permitiu identificar a permanência de certos temas como a cidade, o retrato do artista, o nu e o movimento, assim como a reiteração de um certo tipo de olhar nos mais diversos contextos socioculturais.”

Um fenômeno que, segundo Helouise, que também atua como vice-diretora e professora do MAC, aponta para a internacionalização de uma nova visão de mundo. “Essa tendência pode ser observada em imagens de fotógrafos brasileiros, mexicanos, franceses, alemães, norte-americanos e japoneses, entre outros, resultando do intenso trânsito de pessoas, informações, idéias e técnicas.”

Crédito foto: Cecília Bastos
A curadora Helouise Costa: fotografias remetem às transformações culturais da modernização

Homenagem a Baudelaire – O conceito da exposição remete à reflexão do poeta francês Charles Baudelaire, no conhecido ensaio O pintor da vida moderna, onde o pintor Constantin Guys passa a buscar o eterno no cotidiano do homem comum. “Baudelaire afirma que o seu personagem busca o circunstancial e tudo o que este sugere de eterno. As fotos desta mostra colocam em evidência as marcas do momento em que foram produzidas e, talvez, justamente por isso, pareçam materializar, a um só tempo, o transitório e o imutável que, segundo o poeta, habitam a modernidade.”

Esse é um conceito que o visitante pode perceber ao observar o olhar de Thomas Farkas, precursor da fotografia moderna no Brasil e um dos fundadores do Departamento de Jornalismo da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, registrado na foto Telhas, de 1947. Uma imagem que registra um momento único, quando a sombra incide sobre as telhas, propiciando a diluição da realidade. As telhas deixam de ser telhas e a foto se transforma em gravura. “A cidade moderna passou a oferecer ao cidadão urbano experiências perceptivas inusitadas, marcadas pela velocidade, pela simultaneidade, fragmentação e contraste”, lembra Helouise. “Tornou-se comum vivenciar no cotidiano a justaposição de elementos díspares, a visão de objetos fora de contexto, em escalas não habituais. Estas são características marcantes da cena urbana incorporadas pela estética moderna, de uma maneira geral, e pela fotografia em particular.”

Interessante também é a relação dos fotógrafos com os artistas. De um lado, estão Picasso, Chagal, Frida Kahlo e Diego Rivera, entre outros, em seus ateliês, permitindo-se acompanhar em seu dia-a-dia. Por sua vez, os fotógrafos Brassaï, Bresson, André Kertész, Lucien Bloch e Carl Van Vechten compõem retratos com a mesma composição de uma pintura.

“Fotógrafos da Vida Moderna” é a primeira grande mostra de fotografia que resulta da guarda provisória de parte da coleção do banqueiro Edemar Cid  Ferreira. Um acervo que está sendo cadastrado e tem sido muito importante para as pesquisas que a USP desenvolve. Entre as metas da exposição está o objetivo de conscientizar a população e autoridades sobre a importância da permanência dessa coleção em uma instituição pública, dada a inexistência de um patrimônio fotográfico como esse em território nacional.

A exposição “Fotógrafos da Vida Moderna” está em cartaz até 28 de setembro no Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP, no Parque do Ibirapuera (avenida Pedro Álvares Cabral s/nº, portão 3, São Paulo), de terça a domingo das 10h às 18h. Entrada franca. Mais informações podem ser obtidas pelo telefone (11) 5573-9932.

 
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