Documento final

Declaração de São Paulo sobre a Igualdade Racial como desafio para a mídia

Preâmbulo
A presente declaração foi aprovada pela assembléia dos 530 participantes do Encontro Internacional África-Brasil, realizada no dia 14 de outubro de 2005, no auditório do SESC-Vila Mariana, em São Paulo, Brasil, num trabalho que contou com a coordenação de uma equipe integrada pelos seguintes profissionais: jornalista Joyce L. Kazembe, jornalista Cláudia Lago, socióloga e jornalista Vera Lúcia Benedito, socióloga Dilma de Melo e Silva, jurista Eunice Prudente, bem como pelos representantes das instituições organizadoras, jornalista Joseph Chittilappilly e professor Ismar de Oliveira Soares.

Declaração
Nós, Africanos e Brasileiros, reunidos em São Paulo, entre os dias 12 e 14 de outubro de 2005, no Encontro Internacional África-Brasil, promovido pelo Instituto Internacional de Jornalismo e Comunicação (Genebra, Suíça) - IIJC, Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo – NCE/USP e Serviço Social do Comércio de São Paulo– SESC-SP,

Considerando:

1o. Os debates e as reflexões voltados para a análise das deficiências estruturais da mídia na promoção de políticas de igualdade étnica e racial  bem como da ausência desses temas em suas pautas  apesar da ampliação  da cobertura das  questões sociais;

2o. As propostas que ao longo dos últimos anos vêm sendo expressas em encontros nacionais e internacionais sobre o tema do racismo, nomeadamente o Relatório da Conferência Mundial Contra Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada em Durban, em 2001, que apontou para a necessidade de se implantar programas e projetos que reparem a minimização da contribuição da África para a história do mundo e da civilização;

3o. O desenvolvimento e a consolidação de movimentos em torno da promoção da “igualdade na diversidade”, os  quais  resultaram,  no  continente  africano,  na luta contra todas as formas de discriminação e exclusão e, no Brasil, levaram à implementação de políticas reparatórias, como por exemplo, as ações  afirmativas  e a  legislação que tornou obrigatória  a inclusão da história da África e da cultura afro-brasileira no sistema de  ensino nacional;  

4o. A decisão dos promotores e participantes do Encontro Internacional África-Brasil de comprometerem-se com políticas e ações voltadas para a promoção de práticas midiáticas mais respeitadoras da diversidade cultural e étnica das populações às quais servem,

Recomendamos que sejam promovidos (as):

1. A expansão e consolidação, por parte dos governos, das empresas de comunicação e  da iniciativa solidária de instituições do terceiros setor, de programas de cooperação na área de comunicação, no Brasil e nos países Africanos, visando um maior conhecimento mútuo e a ampliação da troca de informações sobre as realidades dos respectivos povos;

2. O incentivo à realização e divulgação de pesquisas multidisciplinares e intercontinentais por parte das Faculdades de Comunicação sobre o papel e a responsabilidade da mídia na promoção da igualdade dentro da diversidade racial, étnica e cultural;

3. O estímulo aos veículos de informação alternativos no Brasil para que sensibilizem os afro-brasileiros a buscarem suas raízes genealógicas no continente africano, promovendo seu sentido de pertencimento às suas origens;

4. A elaboração e execução, mediante parcerias entre instituições públicas, iniciativa privada e terceiro setor, de programas de capacitação para profissionais da mídia, habilitando-os para a promoção da igualdade para além das fronteiras raciais, étnicas, culturais e de gênero;

5. O desenvolvimento, por parte dos governos e da iniciativa privada, de programas de cooperação que estimulem o intercâmbio entre profissionais da comunicação dos países Africanos e do Brasil, dando especial atenção a intercâmbios específicos entre os jovens estudantes;

6. O desenvolvimento, por parte tanto da mídia quanto de instituições da área da educação, de programas edu-comunicativos que mobilizem as novas gerações para o combate a toda e qualquer forma de discriminação por raça, cor, etnia , gênero,classe e crenças religiosas;

7. O apoio às lutas pela democratização das leis que favoreçam o acesso às novas tecnologias de comunicação e de informação, bem como à abertura de novos canais de difusão, tanto no Brasil como nos países Africanos, dada a importância dos veículos massivos e alternativos na promoção da igualdade racial;

8. A implementação de programas de capacitação, no âmbito dos sistemas de ensino do Brasil e dos países da África, para a aquisição de know-how sobre novas tecnologias de comunicação, visando a ampliação do potencial da mídia alternativa na promoção da pluralidade cultural, fazendo frente às práticas discriminatórias e ao silêncio dos grandes conglomerados midiáticos.

9. A ampliação da cobertura, por parte da mídia, de temas de interesse específico das populações dos países Africanos e dos afro-descendentes brasileiros, como é o caso do Programa de Anemia Falciforme, desenvolvido no Brasil, bem como a divulgação e transferência de tecnologias relativas a essas questões;

10. O desenvolvimento, em instituições africanas de ensino, de programas de estudo sobre a História da África, em todos os níveis de ensino, destinados a pesquisadores, educadores e comunicadores afro-brasileiros.

11. A disseminação, junto aos diversos segmentos da sociedade, das informações resultantes deste Encontro em todas as línguas acessíveis nos países Africanos e no Brasil;

12. A ampliação da participação, na organização e realização dos futuros eventos sobre a relação entre a mídia e o tema da igualdade racial, de universidades, entidades de profissionais que atuam na grande imprensa, associações e profissionais que atuam nos meios de comunicação alternativos, bem como de jovens, incluindo aí os pertencentes aos países Africanos de língua portuguesa;

13. A criação de um núcleo disseminador, congregando os participantes africanos e brasileiros, visando sensibilizar os povos nos países da África e no Brasil para as questões cruciais com que os mesmos se deparam em seus respectivos países e as contribuições que possam fomentar para o desenvolvimento conjunto, com capacidade de implementar as recomendações aprovadas nesta Declaração;
14. A transformação do Encontro Internacional África-Brasil em atividade regular, sendo que os futuros encontros deverão ser alternados entre o Brasil e países do continente africano.