Entrevista com um dos idealizadores do curso de Engenharia de Biossistemas no Instituto Federal de São Paulo- campus Avaré

Entrevista realizada por Danilo Caixeta, aluno da primeira turma do curso de Engenharia de Biossistemas do IFSP-campus Avaré.

Fonte da imagem: https://www.researchgate.net/profile/Newton_Pegolo

Na entrevista apresentada aqui, conversamos com o Prof. Dr. Newton Tamassia Pegolo que é um dos idealizadores do curso de Engenharia de Biossistemas do IFSP – campus Avaré.

Newton possui graduação em Engenharia Agronômica – ESALQ pela Universidade de São Paulo (1992), mestrado em Zootecnia (Genética e Melhoramento de Animais) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2005) e doutorado em Ciências Biológicas (Genética) pela Universidade de São Paulo (2009). Atualmente é professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, no Campus de Avaré. Tem experiência na área de Melhoramento Genético Animal, com ênfase em Adaptação Animal, atuando principalmente nos seguintes temas: normas de reação, regressão aleatória, interação genótipo-ambiente e sensibilidade ambiental. Também é o atual Coordenador de Pesquisa e Inovação do IFSP – Campus Avaré.

 

1-Primeiramente a pergunta inicial: de onde surgiu essa ideia?

A ideia inicial surgiu de um instituto norte-americano, o Santa Fe Institute, cujos trabalhos se baseiam em estudos de complexidade, criando uma fusão de conceitos de engenharia, matemática e biologia. Ao procurar a profissão que mais se assemelhava com estes estudos, encontramos a Engenharia de Biossistemas.

2-O que você ouviu das pessoas ao seu redor?

Inicialmente, poucos conheciam a profissão. A proposta não foi aceita facilmente, justamente pelo desconhecimento. Mas, conforme os docentes foram conhecendo o currículo, foi se tornando um consenso.

3-Quem te ajudou nesse processo?

Posso citar os nomes de 2 professores que foram fundamentais no desenvolvimento do Projeto Pedagógico do Curso: o professor Salatir Rodrigues Junior e a professora Marcela Pavan Bagagli. Consideraram a ideia e desenvolveram, de fato, o curso. Mas esses foram os pioneiros, pois, no final, o curso foi abraçado por mais de 50 profissionais.

4-Quais foram os principais empecilhos encontrados no caminho?

A possibilidade de abertura de outras engenharias mais tradicionais sempre foi questionada. Cada profissional defende a sua própria formação. Isso tende a dificultar o desenvolvimento de novos cursos.

5-Como essa engenharia vai se encaixar na infraestrutura disponível no campus?

Essa é uma das grandes vantagens do IFSP. A multidisciplinaridade já existente permite grande interação, da qual surge a nossa Engenharia de Biossistemas. Já temos outros cursos nas áreas de Exatas (Mecatrônica, Mecânica), Biológicas (Licenciatura em Ciências Biológicas), Agrárias (Agronegócio e Agroindústria) e Humanas (Licenciatura em Letras, Lazer) e a Engenharia de Biossistemas emerge dessa complexidade.

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Campus em Avaré

6-Como é para um campus tão novo, ter um curso tão inovador? 

Somos facilmente adaptáveis às novas ideias e com potencial para aceitar novos desafios.

7-Quais suas perspectivas sobre o curso?

Tenho duas grandes expectativas e uma certeza: espero que haja um crescente interesse dos alunos por cursos que trabalhem com tecnologias inovadoras. Ao mesmo tempo, espero que o mercado seja capaz de identificar e absorver as qualidades que o curso imprime aos discentes. E tenho certeza que, isto acontecendo, manteremos a liderança tecnológica brasileira na geração de riquezas no agronegócio.

8-Como foi à escolha do corpo docente em um curso tão abrangente como esse?

Por incrível que pareça, foi bastante fácil. O curso é resultado de nosso próprio DNA: simplesmente demos o ambiente necessário para que ele se expresse. Cada disciplina da grade atraiu seu respectivo professor.

9-De que forma os professores de áreas distintas podem contribuir com a capacitação profissional dos discentes?

O estudo de sistemas complexos exige formação heterogênea. Ideias diferentes geram modelos inovadores e cultivamos nossas diferenças para que elas interajam, pensando em aproveitar positivamente tal heterogeneidade.

10-Como foi a montagem da grade curricular?

A grade curricular procurou dar ênfase a conhecimentos básicos profundos. Nossa ideia não foi gerar replicadores de técnicas, mas especialmente, criadores delas. Preocupamo-nos em tentar posicionar as disciplinas com um ordenamento coerente, saindo das ciências exatas e biológicas e passando gradualmente às ciências tecnológicas aplicadas à sistemas biológicos, fazendo da informática um instrumento básico de atuação.  Observamos as grades dos cursos já existentes no Brasil e no mundo, verificando as peculiaridades de cada um e tentando adaptar para a situação local.

11- O mercado de trabalho demanda quais conhecimentos desse profissional?

O mercado de trabalho demanda profissionais competentes. Generalizar essa demanda é pouco eficaz. A produção agropecuária e de energia sustentável tem se mostrado extremamente inovadora e os profissionais que queiram se inserir nesse nicho de mercado não podem se limitar a saber uma técnica, mas especialmente devem aprender a aprender novas técnicas.

12- Qual impacto do curso na região?

O impacto que considero importante é o de longo prazo. Espero que o Campus Avaré e, em especial, o curso de Engenharia de Biossistemas, seja capaz de acelerar o desenvolvimento econômico regional, através do incremento na produtividade e na eficiência dos processos biológicos associados aos biossistemas produtivos, aproveitando a aptidão de nossa região para transformá-la numa referência em tecnologia inovadora.

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Campus Avaré

13-Quanto tempo gastou para ideia se tornar realidade?

Iniciei meus trabalhos no IFSP Campus Avaré, no final de 2011. A ideia surgiu de imediato, logo nas primeiras reuniões do Comitê para definição do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), do qual fazia parte.

14-O que Engenharia de Biossistemas significa para você?

Como a pergunta é bastante ampla, vou responder de forma bastante ampla. A Engenharia de Biossistemas, para mim, nunca foi uma finalidade. Considero um meio, uma forma de ver o mundo, pelo qual poderemos, professores, alunos e sociedade, atingir nossa plenitude racional. Não considero que temos um objetivo específico a atingir, mas acredito que sistemas complexos nos permitem obter resultados emergentes inesperados, criando ordem no caos da nossa realidade.

15- Como é sua visão sobre a primeira turma?

É a primeira turma! Imagino que sejam corajosos e inovadores. Só precisam agregar o conhecimento que o curso estará oferecendo. A grande dificuldade que, imagino, todos irão enfrentar, será reunir afinidades em áreas tão distintas exigidas pelo curso: gostar de cálculo e de evolução!

16- O que o senhor gostaria de ouvir futuramente dos egressos do curso?

Queria que nossos egressos me falassem: “Caro professor, estou contente, pois meu filho acabou de entrar na Engenharia de Biossistemas do IFSP – Campus Avaré!!!”

17-Quais as chances de êxito dessa Engenharia?

A competência do Engenheiro de Biossistemas já é demandada pelo mercado. A identificação e a associação com a profissão devem vir com o tempo. Mas precisamos formar pessoas realmente competentes e não podemos nos arriscar em ter profissionais que não atendam às expectativas das empresas e do mercado.

18-Qual recado deixaria para os alunos ingressantes de 2018?

Existe uma lenda da religião nórdica sobre como Odin se tornou o mais importante dos deuses: ele ficou pendurado por nove dias e nove noites em uma árvore, de ponta cabeça, ferido pela própria espada, para ter a sabedoria. Não satisfeito, pediu permissão para beber água na “Fonte do Conhecimento” do gigante Mimir, e entregou, em pagamento, um de seus olhos. O recado que gostaria de deixar é que “não há almoço de graça”. Conhecimento exige sacrifício.

19-Pretende contribuir ainda mais para engenharia de biossistemas? De que forma?

Meu maior interesse é relacionado ao desenvolvimento de novos conhecimentos e tecnologias, especialmente na área de sistemas complexos emergentes ligados à interação genótipo-ambiente. Espero que meu trabalho possa influenciar outros estudantes a pensar matematicamente na biologia.

20-Nessa fase concreta do projeto, o senhor tem algum receio?

Não acho que sejam receios. Precisamos de paciência, para que os resultados nos indiquem como melhorar continuamente. Desta forma, qualquer problema será considerado um obstáculo a ser transposto.

21-O senhor considera a missão cumprida?

Não. Primeiramente, não acho que tenho uma missão, um objetivo a ser atingido. Estamos simplesmente aproveitando a viagem. E, poder auxiliar na construção de algo que considero capaz de mudar a sociedade onde habito, é pura satisfação. Se já chegamos a algum lugar? Prefiro pensar que continuaremos como viajantes, nunca chegando.

22- O senhor teve o devido reconhecimento?

Mais do que esperava. Nunca imaginei ser entrevistado como idealizador do curso. Fui somente um dos colaboradores mais entusiasmados.

23-Qual a possibilidade de parcerias que você enxerga para o curso?

O curso abriu inúmeras possibilidades de parceria com outras instituições e empresas, no Brasil e no exterior. Esperamos iniciar projetos de pesquisa, de extensão e de ensino, potencializando nossas ações ao realizarmos parcerias, tanto com outras instituições públicas, como com empresas privadas.  O Brasil tem destaque na área agropecuária e, também, na geração de energia sustentável, tendo o programa de álcool combustível como diferencial histórico e isto sempre é considerado.

24-O que senhor pensa sobre as áreas de atuação da Engenharia de Biossistemas?Quais são as áreas de pesquisa promissoras?

Entendo a Engenharia de Biossistemas como um ramo da ciência da complexidade, inserida de forma aplicada na produção biológica. Portanto, a atuação do profissional é extremamente ampla, tendo como base econômica a produção de alimentos, fibras e energia sustentável. Na pesquisa, meu principal interesse está na modelagem matemática dos sistemas biológicos e a aplicação em programas de aumento da eficiência produtiva, considerando as interações entre os fatores genéticos e os fatores ambientais. E esta é somente minha área de pesquisa, onde já enxergo infinitas possibilidades de desenvolvimento tecnológico. A multiplicidade de estudos da Engenharia de Biossistemas é tão grande quanto a amplitude dos tópicos que aborda.

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Aula no campus em Avaré