ISSN 2359-5191

13/01/2006 - Ano: 39 - Edição Nº: 24 - Sociedade - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas
Transposição deve ser feita em conjunto com outras ações

São Paulo (AUN - USP) - Por que é ruim levar água para o semi-árido? A transposição não é uma solução completa para a região, mas levará água para um local onde há um estresse hídrico e uma verdadeira angústia por causa da seca. Essa é a opinião de José Bueno Conti, professor do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciência Humanas da USP – FFLCH - em relação ao projeto do governo federal de Integração do Rio São Francisco às Bacias Hidrográficas do Nordeste Sententrional, comumente chamado de Transposição do Rio São Francisco. Com a obra, pretende-se levar água para 12 milhões de pessoas do sertão nordestino, através de dois canais que tornarão perenes os rios Apodi, Mossoró, Piranhas, Jaguaribe, Paraíba, entre outros.

Conti defende que a transposição é absolutamente necessária devido à dinâmica climática da região. Ele explica que no semi-árido nordestino a incidência da radiação solar é muito elevada, o que retira muita água do ambiente. Ao mesmo tempo, as precipitações são muito escassas. Para ele, o principal problema do local é a falta de água. Ele concorda que há muitas outras questões a serem solucionadas, como, por exemplo, a distribuição de renda e o acesso à posse de terras, mas a questão da água é prioritária. “Não adianta nada distribuir a terra de maneira eqüitativa entre os que não tem. Eles vão tornar a terra produtiva de que forma se não houver água?”, indaga.

O geógrafo afirma que a perenização dos rios contribuirá para o desenvolvimento da região, pois tornará a área produtiva e possibilitará os projetos de irrigação. Como exemplo, ele cita a agricultura irrigada de frutas voltadas para exportação que já ocorre nas margens do São Francisco, numa área de cerca de 20 mil hectares. “A transposição vai permitir que isso se multiplique”, afirma. Ele não vê como beneficiários do programa apenas os latifundiários, porque os mesmos precisarão de mão-de-obra para a agricultura irrigada, para o cultivo e a colheita. “É uma coisa meio utópica dizer que todas as famílias terão empregos, mas os projetos de irrigação podem gerar trabalho para milhares de pessoas”, diz.

O professor esteve na região nos últimos meses e pôde constatar que a melhor solução para o sertão é, realmente, retirar água do Velho Chico para perenizar os rios temporários. Ele explica que a açudagem não resolve os problemas da seca, pois os açudes se salinizam devido à dinâmica climática, à falta de chuva e à presença de sais dissolvidos na água e no subsolo. Já as cisternas, segundo Conti, são soluções boas, mas de pequena escala. Esse processo ocorre nas áreas rurais, onde cada sertanejo constrói uma cisterna de capacidade para 5 mil litros ao lado de sua casa para captar diretamente águas das chuvas. Porém, como em algumas regiões demoram mais de oito meses para chover, os sertanejos racionam o consumo e utilizam a água somente para beber e cozinhar. Assim, esse processo é insuficiente, pois não se pode construir nem uma roça para a produção de alimentos.

Questionado sobre os impactos ambientais que podem ocorrer, ele afirma que todos devem pensar em termos de escala espacial: “O que é um canal de 700 Km de comprimento por 25 metros de largura em uma área de quase 1 milhão de metros quadrados? O semi árido é do tamanho de quatro estados de São Paulo. Essa intervenção que vai ocorrer é muito pequena”, opina. Para o professor, hoje em dia, existem medidas mitigadoras para não prejudicar o ambiente. Além disso, ressalta que a produção de energia elétrica em Xingo sofrerá uma queda de 3%, mas isso não é problemas, já que barragem de Sobradinho foi construída exatamente para regularizar a vazão do rio São Francisco: quando for retirada muito água, abrem-se as comportas e a vazão será controlada.

Para Conti, o que ocorre é um “pessimismo exagerado” por parte de quem é contra a transposição. “Não existe nada que possua somente aspectos positivos. Seqüelas ocorrerão, mas se não levarmos água para o sertão, o pauperismo vai se eternizar”, finaliza.

Jurandyr Ross, também professor do Departamento de Geografia, acha que a intenção do projeto é boa. Para ele, o desenvolvimento do Nordeste depende não só da água, mas também de outras ações, mas é melhor fazer a transposição do que deixar como está. Ele, porém ressalta que as pessoas não devem se iludir nem deixarem se enganar pensando que haverá empregos para todos. Ross afirma que a água beneficiará os proprietários de terra que possuem agricultura irrigada. “Esse tipo de produção é complexo, precisa de tecnologia, de mão-de-obra especializada e de educação. Não é qualquer trabalhador braçal que estará apto a fazer esse serviço”, conclui.

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