ISSN 2359-5191

16/05/2016 - Ano: 49 - Edição Nº: 58 - Saúde - Departamento de Fonoaudiologia, Fisioterapia e Terapia Ocupacional
Estudo aborda motivos que levam crianças a ter dificuldades fonoaudiológicas
Se diagnosticado e tratado corretamente, criança pode melhorar desempenho na aquisição da leitura e escrita.
Ilustração por Natalie Majolo

A variação dos sons da fala é muito presente em crianças em faixas etárias precoces. O transtorno fonológico (TF) afeta mais de 6% das crianças, e é considerado uma alteração funcional no desenvolvimento. Geralmente é identificado entre quatro e oito anos de idade, e o fonoaudiólogo o percebe dos três anos até a idade adulta. A professora Haydée Wertzner coordena um grupo de pesquisa que estuda crianças que possuem o TF em conjunto com crianças com desenvolvimento típico (DT) para sons fonológicos. Ainda em desenvolvimento, o objetivo do projeto é estudar o que levam as crianças falantes do português brasileiro (PB) a terem dificuldade em determinados sons, e implementar novo método no diagnóstico do TF.

Até o momento, as pesquisas indicam que são diversos os fatores que causam o transtorno. Entre eles, estão relacionados a ocorrência de otite média secretora (doença comum na infância, é caracterizada pela presença de líquido na orelha média), alterações das vias aéreas superiores e aspecto familiar, como a falta de conhecimento dos pais a respeito dos processos de transição. “Não se conseguiu ainda isolar um fator único que possa ser responsável por sua causa”, admite a pesquisadora.

O desenvolvimento da fala e da linguagem acontece nas crianças de forma gradativa. Os primeiros sons são os balbucios. Entre 12 e 18 meses, a criança produz suas primeiras palavras à medida que as ouve. “Ela observa os outros falando e ‘sente’ os movimentos que se faz com a língua e lábios. Assim, vai  aprimorando a produção dos sons e compreendendo a importância de cada som e como eles diferenciam as palavras”, diz Haydée. Portanto, o papel de adultos conversando no mesmo ambiente que a criança é fundamental para aprender a língua-mãe.

Até os quatro anos, grande parte das crianças já consegue produzir a maioria dos sons do PB. Aos cinco, produz sons de sílabas simples, como /pa, /ba, /ra /la e /lha. Dos seis aos sete anos, completa a aquisição dos sons e sílabas complexas como /pra, /pla, /fla, /pas e /par. Os sons da fala são necessários para que as crianças possam relacioná-los às letras correspondentes no aprendizado do letramento. “Quanto antes identificarmos e tratarmos uma criança com TF, melhor será o seu desempenho também na aquisição da leitura e escrita”.


Identificação e características do transtorno

A partir da imitação de palavras, nomeação de figuras e da própria fala espontânea da criança, é possível identificar quais são os sons que ela tem como presentes ou ausentes. Também é feita uma análise para verificar as regras fonológicas empregadas. “Para confirmar o TF precisamos ter certeza que a criança não tem alteração em outros aspectos da linguagem como o sintático, semântico e pragmático. Isso confirmado, e as análise prontas, sabemos se a criança tem o TF”.

Entretanto, o transtorno possui manifestações muito diferentes entre si. O que se manifesta em uma criança não necessariamente se aplica em outra. Para identificar melhor a dificuldade do paciente, são feitas várias provas complementares. Com equipamentos, é feita análise acústica, ultrassonografia, eletroglotografia e medidas aerodinâmicas para completar a análise de produção da fala. Dentre as provas para as quais não há necessidade de equipamento específico estão taxa articulatória, estimulabilidade de fala, inconsistência, consciência fonológica, e nomeação rápida. A audição também é avaliada.

As crianças com TF apresentam características como simplificação de liquidas [bloqueio parcial da corrente de ar com a língua], de encontros consonantais, frontalização de palatal [transferência da língua para a parte frontal da boca] e ensurdercimento de fricativas e plosivas (ver no infográfico abaixo). Nestes processos de ensurdercimento, especificamente, acontece o desvozeamento dos sons vozeados [vibração das cordas vocais]. Ou seja, onde deveria ocorrer vibração, não ocorre. “Vários fatores estão relacionados à produção adequada dos sons vozeados, desde a compreensão da regra fonológica que implica na distinção de palavras como vaca e faca, até a possibilidade de produção e manutenção do vozeamento pelo trato oral e a percepção auditiva desses sons”, diz Haydée.

 Características Fonológicas

A pesquisadora afirma que em alguns processos de ensudercimento ocorre o desvozeamento de sons vozeados - o que não é observado com frequência em outras línguas, como o inglês. Assim, o estudo selecionou os sons fricativos porque já existem alguns estudos que colocam à par o português europeu com adultos, o que serve de parâmetro de comparação. “É importante destacar que a produção motora dos sons da fala continua se aprimorando até cerca dos 16 anos de idade, quando o jovem passa a apresentar parâmetros semelhantes ao do adulto”, ressalta.


Perspectivas e futuro

Serão analisadas 25 crianças com transtorno fonológico (TF) e 25 crianças com o desenvolvimento típico (DT) para a idade. Todas falantes do português brasileiro, e com idades de 0 a 5 e de 7 a 11 anos. Até o momento, foram coletados dados de 20 crianças  com DR e 15 com TF. A obtenção dos parâmetros biomédicos dessas crianças serão evidências específicas a respeito da dificuldade que uma criança tem para a produção de um determinado som. Ou seja, fonoaudiólogos poderão aplicar estratégias de intervenção mais precisas afim de obter resultados mais eficazes. “Por exemplo, podemos observar se a criança até produz o vozeamento [vibração das cordas vocais] mas durante a produção de uma fricativa vozeada, ela não consegue controlar a pressão do fluxo aéreo de forma a manter esse vozeamento durante o tempo necessário para que o ouvinte perceba auditivamente a produção adequada do som alvo”. Identificado com maior precisão o problema, o tratamento é mais efetivo.

Haydée ressalta que é muito importante que a criança tenha adquirido as regras fonológicas, aquelas que norteiam o uso de cada som na língua. Desta maneira, elas podem aprender a leitura e escrita de uma forma mais tranquila. “Sempre que houver dúvida a respeito do desenvolvimento da fala da criança, o fonoaudiólogo pode avaliar e verificar se realmente a criança precisa de algum tipo de intervenção”.

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