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Emoções sob controle no trabalho

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Segundo especialistas, bom gerenciamento de pessoas e comunicação interna também são fatores decisivos nesse processo

Por Alessandra Goes Alves

Você acorda cedo, enfrenta trânsito e, ao chegar ao trabalho, nem sequer escuta um “bom dia”. Algumas horas depois, ao conversar com colegas, descobre que não foi chamado para uma reunião, convocada pelo chefe, para discutir questões referentes ao seu trabalho. Episódios assim contribuem para estressar funcionários de empresas e fazer do trabalho um ambiente emocionalmente carregado. Conforme pesquisa publicada este ano pela Universidade de Brasília (UnB), 1,3 milhão de brasileiros se afastaram do trabalho em 2008 devido a problemas de saúde relacionados ao estresse.

Em cada fase da vida, os indivíduos possuem papéis sociais específicos que formam seus valores, crenças, princípios, habilidades intelectuais e emocionais. Assim, antes de iniciar a carreira, eles já passaram por um processo de socialização primária, decorrente da convivência familiar e escolar.

Segundo Vera Martins, professora da Fundação Vanzolini (criada pela Escola Politécnica), esses valores guiam o comportamento das pessoas no cotidiano, inclusive no trabalho. “Se, desde criança, uma pessoa aprendeu que é errado admitir o erro, dificilmente ela dirá ao chefe que não entendeu alguma instrução. Essa atitude pode levá-la a cometer erros.”

Ana Cristina Limongi França, criadora e diretora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho (G – QVT) () da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA), diz que, além da socialização, existem fatores específicos do ambiente de trabalho que o tornam mais vulneráveis a conflitos.  Competitividade, hierarquia, produtividade, pressão por resultados e exigência de alta qualificação são alguns exemplos.

A consultora Vera Martins diz que assertividade é essencial na construção de um bom ambiente de trabalho

Além do estresse decorrente das atividades do trabalho, a visão do funcionário sobre como lidar com o chefe também é outro aspecto importante no que se refere a conflitos. “Se acreditar no ditado ‘manda quem pode, obedece quem tem juízo’, o profissional não vai pedir ajuda por medo de o chefe achá-lo incompetente”, afirma Vera Martins.

Segundo ela, a falta de controle das emoções pelo indivíduo forma um sistema emocional carregado que não consegue identificar os pensamentos que originaram sentimentos como raiva e frustração. “Os mamíferos possuem o sistema límbico, parte do cérebro responsável por nossas emoções, e o córtex cerebral, que controla a nossa parte racional. Dizemos que o indivíduo ‘perde a cabeça’ quando há uma ativação do sistema límbico. A partir do momento em que o cérebro não consegue transferir as emoções do sistema límbico para o córtex cerebral, ocorre um descontrole e o indivíduo é dominado pelas emoções.”

As reações aos conflitos gerados no ambiente de trabalho podem variar de um indivíduo para outro. A consultora elabora uma situação hipotética para demonstrar isso: “Imaginemos que um funcionário não é chamado para uma reunião em que se discutiram questões importantes sobre o seu trabalho”.

De acordo com a pedagoga, a raiva é a primeira reação que geralmente se manifesta, pois o profissional pode achar que o chefe está boicotando o seu trabalho. Há os que sentem medo, não conversam para buscar esclarecer o ocorrido e internalizam o conflito. Existe ainda o funcionário assertivo, que até pode sentir raiva ou frustração, mas controla esses sentimentos e procura entender as suas origens.

Para Vera Martins, essa busca é fundamental para reverter sentimentos negativos como raiva, medo ou frustração, pois só depois de identificar as causas é que se pode refletir sobre elas e buscar outra visão sobre o ocorrido. É preciso mudar a leitura sobre os acontecimentos.“Ter equilíbrio emocional não é esvaziar-se de emoções, mas conseguir controlá-las. O primeiro passo é identificar o que está sentindo: raiva, medo, insegurança, frustração? Depois, quais pensamentos que originaram isso? Como trabalhar sobre eles e evitar um conflito no ambiente de trabalho?” A consultora diz que o intuito é tornar esse processo de releitura habitual e, assim, impedir a ativação do sistema límbico. “Após certo tempo a pessoa não precisará mais recorrer a essas perguntas para se acalmar, pois ela será emocionalmente equilibrada.”

A consultora especialista em treinamento de pessoas no ambiente organizacional, diz que esse processo implica reavaliar crenças construídas ao longo da vida. “As pessoas percebem que há outro modo de pensar. Elas vêem que podem questionar suas crenças e é bom que façam isso. É um processo de amadurecimento muito grande.”

Segundo ela, há casos em que o funcionário se surpreende ao fazer isso. “Muitos alunos me contam que, na maioria das vezes, o chefe acha bom quando o funcionário esclarece dúvidas, pois isso evita que erros aconteçam.”

Ana Cristina Limongi França, professora da FEA, trabalha qualidade de vida no trabalho como questão econômica, social e psicológica

Isso mostra que as ações de diretores e chefes também são fundamentais nesse processo. Ana Cristina Limongi França diz que a empresa deve estar atenta à comunicação e ao relacionamento com os funcionários. “É uma área estratégica. Falhas nesse setor podem gerar problemas que afetarão o funcionamento da empresa, como a falta de clareza sobre os valores e a estrutura organizacional da empresa e um não esclarecimento sobre as tarefas que o funcionário deve cumprir.”

Cada vez mais, a questão da qualidade de vida no trabalho vem sendo discutida por consultores, empresas e entidades como a Associação Brasileira de Qualidade de Vida (ABQV) .  Ana Cristina Limongi, professora da FEA, diz que a Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) é um conceito multidisciplinar que envolve fatores biológicos, psicológicos, sociais e organizacionais. “Não adianta cumprir o trabalho e esquecer a saúde. É importante relacionar esses fatores visando um equilíbrio harmônico.”

Segundo ela, funcionários e os dirigentes podem adotar alguns hábitos para reduzir sua vulnerabilidade às tensões geradas no ambiente de trabalho, como a prática de atividades físicas fora do trabalho e ginástica laboral . A professora da FEA diz que as empresas devem estar atentas ao gerenciamento de pessoas e à comunicação interna, fatores essenciais para o ambiente de trabalho. Além disso, a empresa deve organizar espaços externos de interação, com atividades culturais envolvendo funcionários de todas as áreas, além de rituais de homenagem e revelação de talentos. Isso facilita a integração e a criação de vínculos afetivos entre os profissionais. “Gente gosta de gente e no ambiente de trabalho não é diferente”, diz Ana Cristina Limongi.

É possível conciliar uso de redes sociais e tarefas do trabalho?

Além da comunicação e do relacionamento, outro fator que pode gerar conflitos no trabalho é o gerenciamento de tempo. Atualmente, essa tarefa tornou-se mais complexa com a presença das redes sociais.

Segundo Vera Martins, as redes sociais hoje são utilizadas como ferramenta de trabalho, seja para divulgar a empresa ou selecionar profissionais. Estudo do Instituto Brasileiro de Inteligência de Mercado (Ibramerc)  mostrou que 65% das 251 empresas consultadas utilizam as redes sociais como ferramenta de comunicação com clientes e 45% monitoram o mercado por meio de ferramentas como Twitter e Facebook.

Para ela, o segredo para lidar com essa situação está em educar e não proibir o funcionário: “Ele não quer ser visto como criança, mas como adulto capaz de refletir e dialogar”. Segundo a consultora, um líder assertivo parte do pressuposto de que, com o diálogo, o funcionário será capaz de rever suas atitudes e desenvolver um comportamento mais maduro. “Mas não é só o chefe que tem o seu papel: o funcionário deve ter disciplina e não deixar o uso dessas redes atrapalhar o seu trabalho”.

Um comentário sobre “Emoções sob controle no trabalho”

  1. O maior problema dos departamentos de recursos humanos em qualquer esfera administrativa é o comportamento do funcionário. Eu considero esse departamento um navegante entre cruzes e espadas. Lado do empregador e do empregado. Lidar com emoções no trabalho não é fácil. O superior imediato tem a responsabilidade do resultado do trabalho mais o relacionamento entre subordinados. – Emoções negativas podem levar ao óbito como já ocorreu esse ano no CENESP. Uma colega não se adaptou ao novo local; mudanças radicais em toda a rotina; dias mais curtos e cansativos e sobrava o sábado como único dia útil; ônibus fretado para quem estava acostumado a usar o automóvel; distância entre outras coisas que consumia a saúde mental. Depois de alguns meses, insatisfeita, uma descompensação na diabetes levou-a a um infarto fatal. Isso mostra e prova , que não é o funcionário o único causador dos desgastes nas relações no ambiente de trabalho. Todos os superiores devem ser trabalhados como funcionários. O superior imediato detém o poder e se não tiver consciencia do seu trabalho ele poderá levar toda a equipe ao caos. Parece que hoje, independente de organizações sindicais, os funcionários estão entendendo que ele sim é o executivo e se quizer quebrar um negócio é muito fácil. Bill Gates ao criar o software mais vendido no mundo sugeriu que se colocasse jogos para que o usuário não sofresse um colapso estressante, pois já se sabia que a informática acarretaria sérios problemas. Redes sociais são necessárias, devem ser controladas e não o usuário. A boa política de recursos humanos é a responsável por tudo o que acontece de bom no ambiente de trabalho. Uma má gestão de recursos humanos afeta até o jurídico da entidade ao se defrontar com assédio moral; bullyng entre outras ações que levam a instituição a se abismar em situações perigosas. Sobre emoções no trabalho tem muito a se comentar ainda, com destaque à USP.

    - Muitíssimo obrigado.

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