Descubra mais sobre Julio Berlim, atleta profissional e professor de squash, pioneiro em disponibilizar o esporte na cidade de Jundiaí.
Como tudo começou: um peixe fora d’água
Nascido em São Paulo capital, dia 18 de julho de 1969, Julio Pagliuca Berlim iniciou sua trajetória esportiva por incentivo de seus pais e de seus dois irmãos mais velhos (Sandra e Marcos). Julio comenta que o esporte “da família” era a natação: “Meu pai fez natação na juventude, assim como o pai dele. Com a gente, não tinha como ser diferente”. Apesar de ter se aventurado com comprometimento na natação, acumulando mais de cem medalhas pelo time de Jundiaí (cidade do interior de São Paulo que a família havia se mudado), Julio conta que essa nunca foi sua verdadeira paixão. Na realidade, seu coração de esportista palpitava por práticas mais “terrestres” e menos “aquáticas”: ele conta que uma das suas brincadeiras favoritas era jogar uma bola de basquete na parede da quadra do sítio da família e tentar pegá-la de volta o mais rápido possível; diga-se de passagem, uma versão “embrionada” do que, posteriormente, ele descobriria ser o squash.
Julio aos 8 anos, após conquistar troféu pelo time de natação de Jundiaí (1977)
Aos 16 anos, quando a família se mudou para Águas de Lindoia (SP), Julio abriu mão de vez da natação: “Eu já não tinha mais a equipe de Jundiaí e ficar indo e voltando para os treinos era impensável. Pra falar a verdade, dei graças a Deus que consegui me livrar disso!”, comentou rindo. Entretanto, ficar “parado” não era uma opção para Julio: descobriu o Centro de Treinamento Kirmayr, em Serra Negra (cidade vizinha de Águas de Lindoia), onde começou a frequentar clínicas de tênis, onde aprendeu a empunhar uma raquete e escorregar brilhantemente pelas quadras em busca da famosa bolinha amarela fluorescente. Seria essa a sua verdadeira vocação?
Como tudo se desenrolou: obstáculos e surpresas
De volta a Jundiaí e decidido a cursar Educação Física, Julio optou por realizar sua graduação na Escola Superior de Educação Física de Jundiaí (ESEF), localizada no Complexo Educacional, Cultural e Esportivo Doutor Nicolino de Lucca (para os jundiaienses, o querido “Bolão”). Aos 18 anos, em 1988, Julio estava pronto para ingressar na faculdade escolhida. Porém, como todo jovem de 18 anos, havia algo que poderia interromper por completo os planos traçados para aquele momento de sua vida: o recrutamento para o Serviço Militar Obrigatório. Assim, viu-se migrando do Bolão diretamente para o 28° Batalhão de Infantaria Blindada, na cidade de Campinas. Julio conta que foi uma fase complicada (afinal nunca teve interesse pessoal em seguir carreira no Exército), mas com certeza serviu para comprovar sua aptidão e alto desempenho em atividades físicas.
Julio aos 18 anos, prestando serviço militar (1988)
Por mais que o serviço militar se encerrasse em 1989, não foi dispensado a tempo para que conseguisse prestar novamente o vestibular da ESEF naquele ano. Diante dessa situação, decidiu fazer cursinho para refrescar a memória em relação aos conteúdos cobrados e, finalmente, se tudo corresse bem, em 1990, ingressar na graduação. Nesse meio tempo, desfrutando das habilidades que havia conquistado como tenista no Centro de Treinamento Kirmayr, Julio começou a trabalhar como professor de tênis em um centro de esportes da cidade.
1990 chegou e, com ele, a almejada vaga na ESEF. Rindo, Julio conta uma curiosidade: “O bendito vestibular para ingressar em 1990 na ESEF foi fraudado, acredita? Parece que alguém conseguiu as respostas e, por conta disso, acabou sendo anulado – por mais que eu tivesse passado, foi tudo cancelado mesmo. Depois de uma semana lançaram a nova data e fizemos um novo vestibular. Passei de novo e aí finalmente fui fazer a faculdade. Acho que sou uma das únicas pessoas que pode dizer que passou 3 vezes no mesmo vestibular!.”
Durante a graduação, Julio não só continuou dando aulas de tênis e, assim, cada vez mais melhorando seu manuseio com a raquete, como também decidiu explorar um novo território esportivo: o Triathlon. Participou de várias etapas na cidade de Santos, obtendo ótimos resultados. Com o salário das aulas de tênis e com premiações dessas etapas, passou a morar “independentemente” no porão da casa dos pais e tentar, cada vez mais, tornar-se autossuficiente estudando e vivendo do que amava.
Por falar em amor… em meio aos estudos, Julio foi surpreendido por uma flechada, ou melhor, por uma raquetada de amor de algum cupido que se instalava nos corredores da ESEF: foi durante esse período que ele conheceu Rita de Cássia Giaretta, itatibense que também cursava Educação Física. Sim, é lógico que tem final feliz: eles estão juntos há 33 anos, contabilizando 9 anos de namoro e 24 anos de casamento. “Por sermos do mesmo ramo, pudemos sonhar juntos e concretizar muitas coisas juntos. No final das contas, foi até bom que eu tenha demorado um pouco mais pra entrar na faculdade… caso contrário, não sei se teria conhecido a Rita, que é muito além da minha esposa: também é mãe da nossa filha Júlia Berlim, parceira de profissão e de vida.”
Rita, Júlia e Julio (2008)
Foram 4 anos de faculdade, finalizando o curso em 1993. Ao longo de todo esse período, Julio se manteve focado na carreira de tenista. Aperfeiçoando seus métodos didáticos e participando de torneios e campeonatos correspondentes a sua categoria, sua vida se voltava cada vez mais para esse universo. Já com a graduação finalizada, acompanhado de sua então namorada – sim, a mesma “Rita dos corredores” – Julio foi a uma feira de esportes em São Paulo e, pode-se dizer que foi exatamente ali que sua vida mudou. Ele conta nostálgico: “Eu já tinha ouvido falar de squash, mas nunca tinha visto o jogo em si. Eis que nessa feira, bem escondido e bem pequeno, encontrei um stand que, por um aparelho de vídeo cassete, transmitia um jogo de squash na TV. Comecei a assistir o jogo ali mesmo e fiquei completamente admirado. Perguntei ao responsável pelo stand se ele poderia me explicar como o jogo funcionava e se existia algum lugar no Brasil que ele fosse praticado. Ele me passou o endereço de uma academia na cidade de São Paulo que ficava na Alameda Ministro Rocha Azevedo, perto da Oscar Freire. Não deu nem 3 dias e eu já fui conhecer pessoalmente. Foi simples assim: me encantei completamente por aquilo”.Julio acrescenta que, visando dar espaço para aquela paixão que nascia e, já pensando em ser o pioneiro em trazer o esporte para Jundiaí, ele começou a fazer aulas intensivas de squash: “Sem sombra de dúvidas, por já ser experiente com o tênis, aprender o squash foi muito mais fácil. Apesar das grandes diferenças em termos de espaço, peso da raquete, tipo de bolinha, força e ‘jeito’ que se aplica no movimento, já ter a noção apurada sobre a batida da raquete ajuda muito no processo.”
Como tudo se consolidou: “Academia de Squash Jundiaí”
Com a paixão pelo squash já consolidada, Julio Berlim já sabia o que iria fazer: seria o pioneiro em abrir uma academia de squash na cidade de Jundiaí, onde morava e gostaria de se estabelecer profissionalmente. Prosseguiu dando aulas de tênis até 1995, quando decidiu sair do emprego que tinha desde 1989 para se dedicar total e completamente ao próprio negócio, sempre com apoio de Rita e da família. “Meu pai tinha um terreno na Rua São Lázaro em Jundiaí que seria perfeito para abrigar uma boa academia de squash. Fizemos o planejamento de como seria a construção e constatamos que poderíamos fazer duas quadras do tamanho ideal, com um pé direito de respeito. Foi tudo pensado: vestiários no andar de cima, secretaria e lanchonete no andar de baixo junto às quadras… a estrutura era maravilhosa”. Entretanto, Julio pontua alguns desafios: “Obviamente tudo sairia muito caro, mas meus pais, como sempre, incentivaram meu sonho e me ajudaram com o financiamento, que foi inteiramente repassado depois. Além do mais, tratava-se de um investimento arriscado: ser o pioneiro em trazer o esporte para a cidade tinha seu lado bom, mas também poderia ser algo arriscado, afinal não tínhamos como prever como as pessoas receberiam o squash.”
Para a alegria geral, a academia foi um sucesso. Com a famosa divulgação “boca a boca”, a fama do novo (e, até então, único) espaço para jogar squash em Jundiaí cresceu, possibilitando 27 anos de atividade com muito vigor (de 1996 a março de 2023). Julio conta com muito orgulho sobre os torneios que ele e Rita organizavam: “A gente inventava cada coisa! Era torneio atrás de torneio, abertos e internos. Os abertos tinham fins lucrativos e eram grandes atrativos pra jogadores profissionais de várias regiões, principalmente por conta dos grandes prêmios que a gente oferecia, geralmente provenientes de altos patrocínios que conseguíamos desenrolar. Já os internos, só entre os alunos da Academia, eram anuais ou semestrais e sempre beneficentes, sem qualquer fim lucrativo pessoal. Normalmente fazíamos um belo churrasco, no qual cada um trazia um item diferente, sendo que todas as taxas de inscrições pagas pelos alunos eram integralmente revertidas para entidades assistenciais da cidade. Tínhamos muito prazer em organizar esses eventos, guardamos ótimas recordações.”
Rita, Marcos Berlim (pai de Julio) e Julio em um torneio da Academia de Squash Jundiaí (sem data)
Pós pandemia, grandemente afetado pelas consequências econômicas dessa fase, Julio decide reformar o imóvel que abrigava a Academia de Squash Jundiaí e dividi-lo em 3 espaços, que hoje são alugados para diferentes atividades: “A Academia em si não existe mais, mas as lembranças definitivamente permanecem no coração de cada um que teve a oportunidade de conviver, aprender ou simplesmente conhecer o lugar.”
Fachada da Academia de Squash Jundiaí (2017)Julio e Rita com todas as medalhas e troféus que conquistaram jogando squash (2021)
Uma vez lecionando, sempre lecionando
Dar “adeus” à Academia de Squash Jundiaí não significava necessariamente ter que se desvincular da sua maior vocação: ser professor de squash. Hoje, Julio continua oferecendo aulas de squash em outra academia da cidade, chamada “Via Brasil”, sempre muito satisfeito em poder dar continuidade ao que ele considera sua maior vocação: “Apesar de ter participado de inúmeros torneios e de ter ganhado diversos prêmios jogando na 1ª Classe como atleta profissional, acredito que minha maior conquista no squash é poder ensinar a tanta gente como jogar esse esporte maravilhoso. Ao todo durante minha carreira como squashista, com certeza já devo ter lecionado para mais de 2000 pessoas. E desses 2000 alunos, destaco dois atletas em especial: Vinicius Berbel, que aprendeu a jogar squash comigo e entrou para a Seleção Brasileira Junior de Squash logo aos 10 anos, tendo sido uma vez campeão sul-americano junior de squash e três vezes campeão brasileiro junior de squash; e minha esposa, Rita Berlim, que também aprendeu a jogar squash comigo e conquistou o top 5 do campeonato brasileiro de squash, pela 1ª Classe profissional.”
Julio e alunos na Academia de Squash Jundiaí no XXVIII Torneio Interno Beneficente (2022)
Por que praticar squash?
Para finalizar, perguntei por que alguém optaria por praticar squash:
Olha, eu sou suspeito para falar, mas vejo o squash como um dos esportes mais emocionantes existentes. Por ser em ambiente coberto, dá pra jogar em qualquer época do ano e tirar o mesmo proveito. Além disso, considero que é um esporte “pro mundo moderno”, onde todo mundo tem pressa pra resolver as coisas; isso porque é uma prática extremamente eficiente em termos de gasto calórico: em pouquíssimo tempo, você garante um exercício físico pra lá de intenso e muito satisfatório. É recorrente que alunos que fizeram aula comigo há tempos atrás me procurem novamente para retomar o squash, sempre comentando que sentem falta e que nunca encontraram nenhum esporte ou aula parecida. Esse é o superpoder do squash pra mim: marcar a vida das pessoas. Seja professor, amador, profissional ou espectador: todos que têm a oportunidade de ter contato com essa modalidade encantadora, nunca se esquecem da experiência.
* Júlia Giaretta Berlim é aluna da disciplina Jornalismo Esportivo: a pauta além do futebol da ECA-USP.