"O tratamento é importante
se tiver um objetivo definido. O cão deve ser usado como um
recurso na busca de formas de comunicação com o paciente,
e não como a terapia em si" |
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Atividades
com animais podem ajudar jovens com síndrome de Down na expressão
de seus sentimentos, despertando diferentes aspectos da personalidade,
como agressividade, afeto e espontaneidade. "Os animais, no entanto,
são um recurso, e não a fonte terapêutica em si",
ressalta a psicóloga Sabine Althausen.
Em seu estudo de mestrado apresentado ao Instituto de Psicologia (IP)
da USP, Sabine analisou encontros realizados entre quatro adolescentes
com síndrome de Down, com idades entre 13 e 17 anos, e cães
treinados, em que eram realizadas atividades que incluíam conduzir
os animais por um trajeto com obstáculos. "Foi interessante
ver um jovem, por vezes considerado incapaz, conduzir um cão
rotweiller de 50 quilos", diz a pesquisadora. Para ela, esses
animais permitem que sejam estabelecidos relacionamentos mais livres
e sem preconceitos, pois "os cachorros tratam da mesma forma
os adolescentes com Down ou os demais adultos", explica.
De acordo com Sabine, a relação desses jovens com os
animais é diferente da estabelecida com outras pessoas, pois
depende muito mais dos fatos reais do que das intenções
por trás de uma ação. "Isso os deixa mais
livres para expressar seus sentimentos e sua espontaneidade",
conta a psicóloga. A partir desse contato, os adolescentes
conseguiram se colocar de forma afetiva ou mesmo agressiva, que também
é importante e faz parte da diversidade dos sentimentos humanos.
Ela conta, como exemplo, o caso de uma adolescente que tinha medo
de cachorros. A garota conseguiu demonstrar que não gostava
deles, ao expressar de alguma forma sua agressividade e, num segundo
momento, chegou a superar esse medo e criar um vínculo com
o animal.
Outro fator importante trazido pela relação com cães
é a quebra de expectativas, possível a qualquer instante.
"Os animais, mesmo treinados, nem sempre fazem o que queremos.
Isso pode mostrar aos jovens que eles também não precisam
corresponder sempre ao que é esperado deles", compara
a psicóloga. A atividade analisada também ajudou a desenvolver
nos adolescentes o sentimento de independência.
Recurso terapêutico
Sabine ressalta que o tratamento é importante se tiver um objetivo
definido. "O cão deve ser usado como um recurso na busca
de formas de comunicação com o paciente, e não
como a terapia em si", lembra. Ela compara o animal com o papel
do brinquedo na ludoterapia. Embora a brincadeira seja sempre importante
no desenvolvimento infantil, no tratamento terapêutico, ela
assume funções, como tratar medos e facilitar a expressão
de emoções. Por isso, os possíveis benefícios
de ter um animal em casa podem ser diferentes dos alcançados
num tratamento com cães, como o estudado. Além de variarem
de acordo com a família, "depende de vários fatores,
se o cachorro vai gerar conflitos sobre quem cuidará dele,
por exemplo", diz.
Para a pesquisadora, o contato com o animal pode favorecer o estímulo
de diversas áreas, dependendo do resultado que se queira alcançar.
Podem ser trabalhadas as formações de conceitos - como
os de esquerda e direita, motricidade, espaço, até mesmo
o cálculo da força (na escovação do cão,
por exemplo)-, além de ser ponto de partida para a discussão
de vários temas. A fisioterapia e a fonoaudiologia, por exemplo,
também podem usar os animais como estímulo para os jovens
realizarem as tarefas necessárias.
Os encontros realizados entre os jovens e os animais foram fruto de
uma parceria entre uma escola especial e um canil de uma cidade do
interior de São Paulo. A pesquisadora filmou os 12 encontros
semanais, com uma hora de duração. Os animais eram treinados
para não ter reações agressivas ou hostis e os
adestradores e o terapeuta, além de um veterinário estavam
presentes em todos os encontros. A psicóloga destaca a importância
da interdisciplinaridade nesse tipo de atividade.
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