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texto:
Marcela Delphino
Fotos: Cecília Bastos e OCAM
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O menino
que começou a tocar acordeão
aos oito anos por gosto do pai, amante da
música sertaneja, é hoje diretor
artístico e regente titular da Orquestra
de Câmara da USP (Ocam). Gil Jardim
saiu de Ourinhos, onde nasceu, aos 16 anos,
já formado no Conservatório
Musical de Santa Cecília. Hoje, chefe
do Departamento de Música da Escola
de Comunicações e Artes (CMU/ECA),
dedica-se à música clássica
e se orgulha das parcerias com seus ídolos
na música popular brasileira. |
“Viemos para
São
Paulo como os Novos Baianos, para ganhar
a vida e descobrir como seria nosso futuro.” |
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“Comigo vieram alguns
amigos, com os quais já formava um
grupo de música em Ourinhos. Viemos
como os Novos Baianos, para ganhar a vida
e descobrir como seria nosso futuro”, conta
Jardim. Em São Paulo , tendo feito
o colegial técnico, o músico
trabalhou na Cetesb por cerca de um ano e
meio como técnico em edificações, única
experiência profissional sem as partituras.
Ameaçou a seguir outros rumos, prestando
seu primeiro vestibular para a Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo, mas não
resistiu aos acordes.
“Meus amigos e professores do cursinho me
estimulavam a fazer música. Na época,
formamos um grupo chamado Mesa de Bar. Eu
já tocava flauta transversal, instrumento
com o qual me profissionalizei, e fazia arranjos
para o grupo.” Em 1977, Jardim entrou para
o CMU como aluno do curso de graduação
em regência, que durou até 1982.
No final do curso, tocava na Orquestra Juvenil
do Estado de São Paulo e, junto com
amigos do CMU, formou o grupo Papavento. “O
grupo, a princípio, tocava arranjos
que fazia para se apresentar na noite para
sobreviver, com o tempo foi compondo nossas
músicas”. Até que Egberto Gismonti
conheceu o Papavento e o convidou para gravar
um disco. “Esse foi o momento de profissionalização,
o grupo gravava bastante e eu comecei a escrever
muitos arranjos.”
Apesar do curso de Regência, Jardim
ganhava a vida a maior parte do tempo como
instrumentista. “Embora estivesse sempre
estudando música clássica,
sobrevivia muito com música popular,
que são influências da minha
família.” Com o passar dos anos, a
MPB se tornou muito importante em sua vida – “tive
o privilégio de trabalhar com meus ídolos:
Egberto Gismonti, Naná Vasconcelos,
Milton Nascimento, Gilberto Gil, Ivan Lins,
Leila Pinheiros e tanta gente boa”.
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“Tive o privilégio
de trabalhar com a boa música popular
brasileira, nunca gostei de fazer trabalhos
que não fossem bons.” |
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Com apenas 24 anos,
o músico se tornou docente no CMU. “Foi
terrível. Eu era um músico
extremamente ativo em performances, tocava
em todos os lugares e tinha uma agenda enlouquecida.
Quando fui contratado, passei a dar aulas,
ou seja, falar de música e não
mais fazer música”, recorda. Demorou
pelo menos cinco anos para que Jardim retomasse
a atividade, já em outros moldes,
menos como flautista e mais como regente,
especialmente com a Orquestra Jazz Sinfônica.
De aluno a chefe do departamento, de 1977
a 2006, o CMU cresceu e exige mudanças. “Todo
crescimento demanda uma reconceituação,
estamos vivendo exatamente este momento.
O objetivo principal da minha gestão é ter
uma equipe um pouco mais ampliada de trabalho
em termos de docentes.” Jardim quer, ainda,
estreitar os laços com os departamentos
de música de outras universidades.
Mais do que isso, a intenção é a
internacionalização cada vez
maior do departamento, com convênios
fora do País. “No próximo ano,
teremos muitos profissionais famosos de outros
países passando por aqui, possibilitando
a aproximação com escolas do
exterior para que possam ser locais em que
nossos alunos façam especializações,
mestrados e doutorados.”
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“Assim como a palavra
precisa do branco do papel, o som precisa do
silêncio.” |
Giil
Jardim com o CD Villa-Lobos em Paris e
o livro O
Estilo Antropofágico de Heitor Villa-Lobos,
fruto de sua tese de doutorado e livre-docência. |
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A revisão de
toda a grade curricular e reformas arquitetônicas
estão incluídas nos planos
do professor. O prédio ocupado pelo
CMU não foi construído para
abrigar um departamento de música,
nenhuma das salas, a não ser um pequeno
estúdio, possui tratamento acústico. “Muitas
vezes percebemos que as condições
do Estado são tão morosas que
fazem com que parte do nosso plano de meta
assuma uma figura utópica”, lamenta.
Ainda assim, para o chefe do departamento é inaceitável
cruzar os braços. “Mais do que tudo
na Universidade, precisamos de uma mudança
de atitude, de um querer, sermos movidos
por uma expectativa de futuro, sonhar, buscar
o que está no futuro, senão
não dá, um dia atrás
do outro sem querer o dia que vem amanhã.”
Jardim está à frente da Ocam
desde 2002. Quando assumiu, a grande mudança
foi que a orquestra de 18 músicos
passou a contar com 35 e a ter o apoio do
programa Santander-Banespa Universidade.
Além disso, passou a ter uma programação
preestabelecida e a fazer mais concertos.
São oito programas distintos por ano,
cada um com três ou quatro récitas,
ou seja, reapresentações.
Nos últimos oito anos, Jardim tem
trabalhado com música clássica,
especialmente Villa-Lobos. O CD Villa-Lobos em
Paris, projeto em que foi diretor e
regente, ganhou o selo de ouro de uma das
mais importantes revistas de música,
a francesa Diapason D'Or, quando
esta lançou sua primeira edição
no Brasil em 2005. O mesmo disco acaba de
ganhar, em novembro, o Prime de Cultura da
revista Bravo!
Os projetos particulares de Jardim incluem
a realização de dois CDs e
um encontro nacional por uma política
de internacionalização da música
clássica brasileira. O entusiasmo
do regente não é menor ao falar
de sua família. Há 17 anos
casado com a publicitária Annelise
Godoy, depois de seis anos ao lado da bailarina
e coreógrafa Sonia de Alexandria,
Jardim sorri largamente ao falar dos filhos,
Alex e João Gabriel.
A música permeia a vida de Jardim,
no trabalho e em casa. Os ídolos da
juventude se tornaram parceiros de profissão
e de vida. “O mais legal é que a gente
convive muito com música, com artistas
dentro de casa, e isso de alguma forma talha
um pouco o perfil dos meus filhos”, observa
o regente, que tem como padrinho de casamento
e de seu filho mais velho, Milton Nascimento.
“O Alex estuda Jornalismo, mais para a área
da mãe. E eu tenho outro filho que é uma
graça também, de 10 anos, o
João Gabriel. Ele tem duas opções:
ser jogador de futebol ou pianista, está jogando
cada vez melhor e tocando também, é muito
sensível, tem um jeito para isso”,
derrete-se. “O pequeninho está indo
em um caminho mais parecido com o meu, o
futebol e a música. Sempre adorei
futebol, desde pequeno. Sou corintiano.” Aliás,
Gil Jardim vem de Gilmar Roberto Jardim – Gilmar
por causa de Gilmar dos Santos Neves, que
foi jogador do Corinthians e da seleção. |
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