texto: Daniel Fassa
fotos: Jorge Maruta e Francisco Emolo

 

 

 

 

© Jorge Maruta
Marcolin testa o procedimento na médica e doutoranda do IPq Bianca Bellini.

 

 

 

 

arquivo pessoal
“Para mim, é primordial poder deixar os medicamentos. Não quero ficar dependente a vida toda”. Deila Maria Gomes Barbosa


Técnica estudada no IPq diminui efeitos colaterais e agiliza o tratamento

Estimativas da Organização Mundial da Saúde indicam que 121 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem de depressão. Uma das principais causas dessa doença são alterações químicas no cérebro que provocam um desequilíbrio entre os chamados neurotransmissores, como a serotonina e a noradrenalina. Geralmente, a fim de tratar o problema, são utilizados medicamentos que, muitas vezes, causam efeitos colaterais. No entanto, uma pesquisa desenvolvida pelo Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP (IPq/FM/USP) mostra que a Estimulação Magnética Transcraniana (EMT) pode ser uma alternativa aos fármacos ou, se associada a eles, tornar o tratamento mais rápido e eficaz.

A EMT consiste na aplicação de um campo magnético de intensidade entre 1,5 e 2 teslas (unidade que mede a indução magnética) em pontos determinados do cérebro, de forma a estimular ou inibir circuitos neuronais específicos, nesse caso os relacionados à depressão. O chefe do Grupo de Estimulação Cerebral da FM/USP, Marco Antônio Marcolin, explica como isso acontece: “Quando você estimula, há, inicialmente, um aumento do consumo de glicose e circulação sangüínea na região que estava pouco funcionante. Depois, acontece a liberação de neurotransmissores, como os antidepressivos, além de uma cascata de eventos dentro dos neurônios, que se alteram. Por último, há uma acomodação genética dentro dos neurônios, um rebalanceamento”.

Deila Maria Gomes Barbosa, funcionária do setor de Serviço Social do Centrinho, em Bauru, toma medicamentos para depressão há dois anos. Ela conta que, em função disso, sofre alguns efeitos colaterais. “Tenho muita secura na boca e um sono incontrolável”, revela. Para quem, como ela, apresenta esses ou outros efeitos, tais como ganho de peso e disfunção sexual, a EMT pode ser uma alternativa. “Esse tratamento age em circuitos mais específicos e os efeitos colaterais são mínimos”, afirma Marcolin. Segundo o psiquiatra, a associação da técnica com fármacos também pode trazer resultados muito positivos: “Nosso grupo foi o primeiro que demonstrou que, quando você associa, num paciente com depressão grave, antidepressivo com a estimulação, um medicamento que leva de três a oito semanas para começar a fazer efeito passa a funcionar na primeira semana, diminuindo o sofrimento dos pacientes, o risco de suicídio e os custos”.

A farmacêutica e bioquímica Ana Carolina Simões considera a diminuição dos efeitos colaterais uma grande vantagem da técnica, mas acredita que a necessidade de o paciente se deslocar até o hospital para receber as estimulações pode dificultar o tratamento. “Se, para ser tratado com EMT, o paciente tiver que mobilizar muitas energias, é muito provável que, quando se sentir melhor, ele vá abandonar o tratamento. Isso pode ser muito perigoso”, afirma. Entretanto, Marcolin explica que, desde que o número de sessões perdidas seja pequeno, não há prejuízo ao paciente, já que é feita uma reposição no final do processo de aplicações.

 

© Jorge Maruta
“Nosso grupo demonstrou que, quando você associa antidepressivo com a estimulação, um medicamento que leva de três a oito semanas para começar a fazer efeito, passa a funcionar na primeira semana”. Marco Antônio Marcolin.

 

 

Francisco Emolo
A psicóloga e professora da USP Walkiria Grant acredita que a utilização da EMT ou de medicamentos pode ser muito útil, principalmente nos casos de depressão profunda, mas considera fundamental que, com a ajuda da terapia, após certo tempo, o indivíduo possa abandonar a medicação.


O psiquiatra ressalta que fatores ambientais, emocionais e, até mesmo, outras enfermidades também podem ser determinantes para que uma pessoa tenha depressão: “A principal causa é biológica, genética. Mas os demais fatores são desencadeantes. Você pode ficar deprimido porque teve um infarto, porque está com um problema de rim ou porque teve um trauma cerebral, por exemplo”. Ana, que atualmente é doutoranda em Bioinformática pela USP e representante discente, conhece muita gente que enfrenta a doença. “Muitos alunos da USP entram em depressão. Aparentemente, por ser uma etapa de grandes desafios econômicos e profissionais, a pós-graduação favorece a sua manifestação”, observa.

A psicóloga e professora da USP Walkiria Grant acredita que a utilização da técnica de estimulação ou de medicamentos pode ser muito útil, principalmente nos casos de depressão profunda, que podem chegar ao mutismo. Porém, ela considera fundamental que, com a ajuda da terapia, após certo tempo, o indivíduo possa abandonar a medicação. “Muitas vezes, recebo para tratamento sujeitos muito depressivos e sem energia para fazer algo de suas vidas. É muito interessante trabalhar com profissionais que possam medicá-los, acreditando em retirar o remédio à medida que houver melhoras”. Deila, que além do tratamento com fármacos faz terapia, também considera isso muito importante. “Para mim, é primordial poder deixar os medicamentos. Não quero ficar dependente a vida toda.”

O grupo do dr. Marcolin fez a primeira publicação sobre a utilização psiquiátrica da Estimulação Magnética Transcraniana em 1999. No entanto, até o ano passado, quando seu uso clínico foi autorizado, o método só podia ser aplicado em pesquisa. A fim de que toda a população possa ter acesso gratuito ao tratamento, que tem custos elevados, o IPq pretende pedir que o Sistema Único de Saúde incorpore o procedimento em suas normatizações. Antes disso, o Conselho Federal de Medicina deverá dar seu parecer.

No último mês de junho, uma pesquisa sobre a utilização da EMT para mapeamento de focos de dor na região do córtex sensitivo foi considerada o melhor trabalho apresentado no 2º Congresso Internacional de Dor Neuropática, realizado na Alemanha. O estudo foi coordenado por Marcolin em parceria com o neurocirurgião e profressor titular do Departamento de Neurologia do IPq Manoel Jacobsen Teixeira. Saiba mais sobre a pesquisa na matéria “Pesquisa da Psiquiatria é premiada em congresso internacional”, publicada na edição de julho da revista Espaço Aberto.

 

Serviço:

O Grupo de Estimulação Cerebral da Faculdade de Medicina da USP fica no Instituto de Psiquiatria.
Avenida Dr. Arnaldo, 455, Cerqueira César – São Paulo
Tel.: 3069-6525

 

 
 
 
 
 
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